Não...eu não me queixo do meu país.....
Eu não me queixo do país em que nasci
Eu não quero saber...que ele não queira saber de mim...
Eu não me queixo do pais em que nasci...hei-de bebê-lo até ao fim....
Hei-de desiludi-lo como um farsante que lê magníficos versos
Hei-de abusar da alegria e enrolar-me em poesia
Não quero saber que este país não me conheça...porque haveria de querer?
Eu próprio não me conheço...
Quero lá saber que este país me deixe flutuar de cabeça ao vento
Ouvindo os sábios que nada sabem...como se soubessem tudo...
Quero lá saber que entre eu e o meu país haja um universo ininteligível
Se também eu não procuro conhecer a inteligibilidade desse país...que é o meu..
Quero lá saber que não haja esperança nem doçura
Nos agrestes dias que se derramam sobre os abusos
E que por detrás das personagens apenas existam queixas e faltas
Eu não me queixo do país em que nasci
Não me queixo do vinho...dos que não trabalham... das mulheres...
E muito menos dos que passeiam a noite nos corpos
Não me queixo dos medíocres e dos que querem ser reconhecidos
Não me queixo dos invejosos nem das obras-primas
Não me queixo da Bíblia... nem das desilusões... nem da piedade
Enrolo a minha existência numa solene condição encantada...
Em quadros pintados nas noites em que flutuo sem memória
E não espero que o meu país me compreenda...
Nem espero compreender qual o tempo que levo a subir as minhas escadas...
Sou um feliz desencantado...um inocente membro da classe alheada...
Porque deveria levar o meu piano para a rua?
Porque deveria derramar doçuras sobre a distância que me separa do meu país?
Este país tem horizontes infinitos...tem mar...é banhado pela tristeza...
É um quarto em que as miragens se confundem com a volúpia...
Porque me queixaria eu... do meu país desencantado?
Se eu estou encantado por ele...
Como se fosse uma miragem derramada sobre personagens agrestes...
Eu não amaldiçoo o meu país...não lhe atiro dardos...
Apesar de já ter pisado merda de cão nos passeios...sem asseios...
Eu não me queixo das guinadas que o meu país me dá no coração
Não invejo as rotundas...nem as rectas...nem a verdade...nem as vagas sensações
Nem os famosos...nem os não famosos
Sou assim como que uma distância....um lugar afastado...estou errado?
Gosto dos gemidos do mar...maravilham-me as gaivotas...
Encantam-me os simples...e as carnes tristes...e as desarmonias...
Não...eu não me queixo do meu país.....
Afinal ele está cheio de uma verdade sem nada de extraordinário
É um país...o meu país...este país...
É o único que poderia amar...