Quantas vezes passei sobre o ventre líquido de Abril...
Quantas vezes passei sobre o ventre líquido de Abril...
Quantas memórias me faltam desse tempo cuspido num subterrâneo da alma
Quantas vezes tremi de frio após ter esburacado os pulsos enrouquecidos...
E os pássaros.... sábias flores crescendo nos alicerces da aurora...
Talham cantos que assinalam censuras de mares interrompidos...
Não sei quantos sonos dormi...nem quantos caminhos a argila cobriu de silêncios
Mas sei que o inverno florescerá numa ausência luminosa..mergulho num mar afagos...
Quentes como náufragos atravessados por oceanos desenhados por sombras
E a terra...é a boca que inventa corações incandescentes....esperas de raras avenidas...
Projectos em brancos néons...aquáticas viagens em asfaltos onde a chuva se acolhe...
Quem aprendeu as palavras imaginárias que descrevem os gritos dos esgotos...
Sabe que não há bocas nas constelações...nem beijos nos alicerces podres da alma...
E que os corações são meses doces de sol puro...inacessíveis metamorfoses de gritos...
Sobre as pupilas dilatadas dos dias cinzentos...virá um pássaro e outro...
Precipita-se no sopro que emana dos sargaços...laço de manhã indizível...
Espaço frenético que jorra numa recordação de campos encharcados de cardos...
Pupila asfaltada que se movimenta numa roda...braços que agarram a lama...destinos....
Não sei que mergulho darei num lago incandescente...nem que sombra me penetrará...
Sou todos os tempos e o filho de todas as mães...largo e inteiro peito a desbravar esperas
Dedos que desaprendem corpos nas folhas da árvores...medos talhados a pique...
Alicerces em carne viva que seguem encostados ao espaço metálico...
Emblemas de ausências...seiva nua..cruel planta crescendo na palma da mão...
Virão os estremecimentos e a queda no espaço feito de leves penas...não terá nome...
Voaremos diante de um tempo líquido...baba jorrando pelas ruas da cidade...
Gemido de sangue que se cola às pálpebras estilhaçadas....
Bocas líquidas...inesquecíveis raios de sol talhados na argila sólida....
Vinho escorrendo por lábios murmurantes...silhuetas de constelações arenosas...jogos...
Outros meses imaginários virão...outras incandescências descerão pelas frestas do medo
E os corpos rirão da sua nudez sábia...da sua catástrofe mole...do seu roçar luminoso...