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folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

Por alguma razão o tempo alisa o peso da memória...


Por alguma razão o tempo alisa o peso da memória....e o escuro peso da vergonha...


É largo o céu que se fecha ao fim do dia...ausência de tempo atacado pelo esquecimento


São longas as pálpebras que murcham nos corpos...e tão bonitos os suicidas das manhãs


Invento uma crença...quero ser uma suspensão de ar...uma mirrada carne esbaforida...


Mortal dia de onde brotam lagoas encurvadas...onde poisam graciosos abutres enfastiados


Copa de árvore ausente da manhã...culpa de ser mensageiro da imortalidade...


Inventor de infinitos campos estrelados...imortal...ser imortal é ser folha seca...


Secura que paira numa ave encharcada de chuva límpida...


Não há moscas...ninguém se estrangula...todos pairam num tempo escuro...


Quem nos ataca de madrugada não se esquece de nós...risos de morcego alado...lunar


Culpa que desaba de uma nuvem sem substância...saltitar de encostas celestes...


Afinal mesmo mirrados estamos vivos...enterramos o silêncio numa orgia milenar...lupanar


Caímos...e o baque do nosso corpo é um fragor fenomenal...uma coisa triste...um charco


Algo que receamos..como aos insectos que nos estrangulam...completamente...


Talvez a terra nos encerre num fogo latente...lamparina vulcânica...profundo contemplar de nós


Mas onde iremos enterrar os ruídos? Onde desabará a chuva cristalina?


Crosta decepada...costa marítima aflita...sombra vertical...meio-dia estrangulado...


Tombei numa letargia de assassino... de troncos decepados...


Como sentenças embriagadas...ou como cordas soluçantes....balanços de mensagens gigantes....


E nós dobrados sobre o medo...escutamos apenas a fria mensagem pregada na parede...


Foto em sépia de ancestrais rostos...frias pálpebras cerradas pela sepultura...ali estamos!


 


 

Como amores que nunca se revelam...


Bebi-te até ao delírio...saqueei o teu jardim...debrucei-me sobre as tuas flores...


A terra misturou-se nos corpos...as pétalas eram doçuras primaveris...


E tu eras um pequeno ramo que eu colhi...um perfume que aspirei...uma flor rodopiante


Como foi possível navegar naquele lago..naquelas graciosas águas coloridas pelas aves


Naquele inebriante acenar de folhas friorentas...ternuras de cais distante...


Disparates de jardins que brilham perante os olhos esfomeados... por mais corpo


Terão as folhas secas perdido a felicidade da verdura? O viço assombrado do prazer?


Tudo se mistura numa doçura de arvoredo friorento...de casca tumultuosa...de coração profundo


Das raízes brotam ribeiros refrescantes...insondáveis...vivos...


Águas que se oferecem como amores imperdoáveis...amores de um azul opaco..irreflectido


Pelas veredas desertas assustam-nos repuxos gélidos...lágrimas de folhas mortas...


Como amores que nunca se revelam...que nunca dizem quem são...


Que se limitam a ser melodias intransponíveis...céus pálidos mas intensos...


Instantes baços...ardentes...carinhosas sombras que se refugiam nos ventres das nuvens


E fogem cantando cristalinas e róseas árias aos dias encobertos...


Podem morrer de melancolia...podem escutar as águas...mergulhar nos ribeiros....


Mas nunca serão mais que um mero e cinzento instante de perdição!


 

Repentinamente percebi que me fazias mal

 


Repentinamente percebi que me fazias mal


Que tudo em ti me fazia mal


A tua língua misteriosa...a tua cativante vivacidade


A tua maré... que na vazante deixava em mim os vestígios da tua sombra


Os sulcos nos meus olhos que as noites não apagavam


O teu sorriso que eu colhia como um encanto desfigurado


O desejo imenso...o fabuloso espanto de te encontrar...


A necessidade de ser uma lembrança perene em ti


Até os meus sonhos ridículos de ouvir a tua voz...eram reais...


E mesmo no desencontro...o teu corpo emanava perfume de jasmim...


Os odores tinham cores... azuis, rosas, liláses....


O frio sepultava o meu coração na tua ausência


Até ao dia em que percebi...que me fazias mal...e parti!


 

Posso ser a liana que se enrosca em ti ou um jogo de corpo inacessível...


Sei que posso ser a corola da flor suicida... repleta de geada colorida...


Ou o travo que rasga a foto descabida...ríspida rua crivadas de corpos corroídos...


Sal dissimulado em grandes planaltos...líquido condecorado com medalhas de mel


Posso ser uma estatística....uma projecção triangular...um corpo que pernoita numa giesta


Um abismo que dorme ao relento...um jardim aflito...com veias feitas de águas geladas...


Posso ser uma boca repleta de espíritos desdentados...um sono ou uma dificuldade...


Posso ser a liana que se enrosca em ti ou um jogo de corpo inacessível...


Um poema ou uma espada...algo como uma respiração sonhada...em papel de seda


Uma folha morta no recanto do jardim...esvaindo-se em espinhos de sangue..póstumo lixo


Posso ser a larva que estanca a veia fresca..a fresta que se ergue da embriaguez..


A tâmara sanguinolenta que desfalece numa maravilhosa osmose de tempo imaginado


Posso ser o teu sabor a sussurros húmidos...a precipitações da alma...a naufrágio...


Posso ser a palavra que te corrói a alucinação...lentamente...lentamente...lentamente...


Até que o teu corpo embrulhado num algodão tecido carmim..acorde para mim!