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folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

Deslizo para dentro de mim...

 


Pintam-se as fachadas....uma nuvem abraça o mundo..distorcidos braços incendeiam-se


Das árvores sopram vagas de folhas..como homens caídos..sintéticos..desavindos


As cores absorvem a neblina..é outono..páro...o vento restolha..vagueio


São outras as minhas cores...é outro o meu sol...escuto o ruído ressequido das oliveiras


O mundo desconhece a minha melodia... a minha dança acrobática...a minha escala


Algures..na floresta vivem homens nus...outros vestem folhas...verdes


As aves agitam-se como melodias inacabadas...o céu espera...o verão adia as nuvens


Nos passeios soam violas...Bob Dylan renascido...a fala da vida a desfazer-se em vento


Nas margens do rio dançam pedaços de madeira...lixo de outros lugares


Mulheres passeiam...amarelecidas pelos dias procuram a grinalda...a máscara..a névoa


O vento esqueceu a poesia...o ruído rasteja pelo medo..acre..alma...fascínio


Sigo para dentro da chuva..acalmo a morte..arquejo perante os relâmpagos...não os temo


E sento-me sobre a minha brisa...como se fosse um punhal que corta o mundo


Deslizo para dentro de mim...descanso...enfim...tornei-me uma partícula de nada!


 


 

XXXV


Passou o vento pelo silêncio da vida...sempre em frente...segue


tu que escreves no vento nítidas órbitas...segue..sempre em frente


pela tua tua boca perpassam palavras..maravilhosas...sombrias...presas no começo de ontem


dorme...acreditas que no céu se planta a escuridão...nítida escuridão


luz e neve presa num galho de árvore decrépita...salta sobre todas as folhas..rebentos


rebentos que voltarão a ser folhas..bocas que voltarão a ser beijos...dias desfocados


do trigo rebenta a vida..dispersos grãos nas searas..sal dorido..sol cansado...amor


as tuas mãos tocam as minhas pálpebras...ansiosas pálpebras...voltear de andorinhas


continua...espalha a tua mão sobre mim..segura-me...sou o teu rebento...


sou a planta que vive na escuridão..sou o Outono e os dias..os lábios intocados


sou o orvalho que vive na luz...cacimba matinal...chuva deslizante


que apanho com as mãos voltadas para o vento...


 

XXXIV

 


Tu que escutas cotovia que resplandece na hora do desconsolo


e tens nos olhos os cacos do mundo para colar...e na pedra os escombros da eternidade


antes que chegue a manhã..procura o sentido do tempo marinho


procura as coisas que fazem os corações desabrochar...o alvo vermelho da inocência


procura o ar que te respira... a troca de olhares sob as folhas doiradas das tílias


depois podes avançar...nada te prende...porque a folhagem respira o teu nome...


 

Um homem escuta o seu interior..


Um homem escuta o seu interior...ventrículo...aurícula...os braços crescem dentro dele


Corre...a neblina vinga-se do dia...distorce as faces...


E o homem desliza como um bailarino..bardo ressequido...poeta da floresta...


Foge...o vazio persegue-o..o vento é a poesia do ar em movimento...


Talvez uma melodia o recorde....que nas praias rastejam partículas de sóis doirados


Sempre luminosas...sempre iluminadas....


 

Literalmente palavras...


Suspenso num enorme espelho azul...toco a luz branca dos sonhos


Imerso...ancorado num céu onde as árvores se pintam de flores doloridas


Sigo o caminho do não-regresso...lá fora... o gelo despede-se do seu próprio frio


Todas as coisas estão suspensas num tempo que se desenrola de dentro para fora


Brincam ás infâncias que correm pelas ruas desertas...


Onde há brechas nos ossos opacos dos sonhos...


Só as árvores pintalgadas de flores violetas penduram em si os dias felizes...solares


Há no ar uma sensação de olhos colados ás vidraças..há aquele céu sempre presente


O gelo que se derrete acorda os animais...límpido gelo que toca o funda das vidas


E se o céu fosse um espelho onde as águas se mirassem?


Quantos campos vazios nos ouviriam assobiar? E o inverno? Seria uma cama inacabada?


Podíamos nadar em corpos espessos...feitos de cores solitárias...


Ossos salientes...magreza...pinhais que se desmoronam em bocados de papel...palavras


Literalmente palavras...gestos suspensos....cores...apaixonadamente frágeis...despidas


E nas águas profundas desenvolvem-se vidas secretas....brancas..cegas...luzes


E pelas janelas escorre a maresia da noite...explodem sóis matinais....há uma sensação de fuga


Presságios vagueiam como cometas..luminosos espelhos onde se escreve dor..


Com o dedo indicador!


 

XXXII

 


Tacteio o teu cintilar como se fosses a minha mão


nado na tua vagarosa sílaba inacabada...é meia-noite


e eu desço pelo fio de seda que me prende a ti...


sempre preso a ti...


 

XXXI


Constelações...tectos onde as estrelas dizem noite


verdades...sombras de diálogos ondulantes


palavras...cristais que despertam no esquecimento


 

XXX


À meia-noite sobem as sombras insensíveis...dizem roda..tecto...falam de lugares


sabes que tudo o que sobe...desce..mas... e a alma? sobe? desce?


há também uma constelação que fica entre a sombra e a ondulação


um mar de palavras sem lugar...estrelas finas..


que cintilam vagarosas no cristal da verdade


e tu...que dizes? Sabes que a noite nada no dia...afoga-se na vida...


como mãos errantes que tocam na cegueira das sombras...


 

Solitários como gritos no vazio...


Explodem grinaldas como bandos de pássaros que esperam a sua própria cor


O céu é uma recordação de águas profundas...um gosto...uma vida...


Na curva do verão iremos dormir junto de todos os tempos..


Suspensos na asa branca da lua..tomaremos todas as formas...desapareceremos


E nas nossas almas veremos os dias despidos...os corpos enfunados...repetidos


E o vento? A quem fustigará? Que aves dormirão na sua profundidade?Que sonos recordarão?


Há curvas e curvas perdidas na suspensão das horas...


Regressos adiados presos em árvores solitárias...


Enquanto nos campos se deleitam universos paralelos


Adejam sensações de límpidas águas..e tudo desaparece no nosso sono...


Depois...na berma do tempo encontramos a prisão do corpo..ossos de cor violeta fingida...


Despidos procuramos a nossa pele...a luz branca perde a forma...e nós cantamos...


Como pessoas que dormem em sonhos de animais...ali estamos...invernais..


Solitários como gritos no vazio...ou como pedras atiradas por um louco....


 

Sem destino ...


Vastas são as prisões que se erguem no escuro do pensamento


Peles suaves acariciam-nos os dedos...no ar os risos jorram como grandes aves ternurentas


Apreciamos a nostalgia de uma flor na janela de um prédio arruinado


Desaparecemos no vasto túnel onde a luz é uma explosão de negritude


Subimos depois como balões de ar quente...sempre em procura de uma lua injusta...


Sem destino ...


Pincelamos os pássaros com esguichos de recordações esvaecidas


E enchemos as mãos com dolorosas bermas de caminhos poeirentos...


Desabrochamos como pessoas suspensas num corpo alado...


Repetidamente...repetidamente...


Até emergirmos em centelhas de sonhos que voam em direcção a uma vidraça...


Por onde espreitamos as límpidas águas que se recortam nos céus sarapintados...


Por tonalidades de fulgurantes laranjas.... lapidares....


 

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