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folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

XXXIX


O vento dissimula a linha intocada das palavras..mãos profundas...voos de anos


o vendaval gravou os teus olhos no espaço...nada resta das estrelas que a noite derrubou


apenas nos fica a sabedoria das nossas mãos..calejadas por obstáculos..


estigmas de tempos feitos de fel e mar...estranha escuridão caindo a pique nos dias


em que desconhecidos lábios despontam nas folhas presas na aragem.


 

XLI


Aperto o teu adormecer entre as sílabas desatadas da vigília


mão fiel...que sentes o receio de um coração onde se entregam os beijos floridos


e sentes as folhas que se apagam na viagem das cores impossíveis...


 

XL


Solta corre agora o fim da culpa...a última prece angustiada...a mão dada ao infinito


e perante o desabamento de uma boca plantada no silêncio...


ouvimos o voo profundo da água na dura cavalgada pelas pedras ansiosas...


graníticas fontes ancestrais..olhos d`água onde o mistério se encerra...


e ambos nos findamos.


 

XXXVIII


E tu que implodes como folhas que rebentam...


diz-me se conheces o pássaro que se dissimula na aragem e que vagueia por cima dos delírios da neve?


diz-me se já não pisas o tapete florido...manchado de estrelas sombrias...


diz-me se não é precioso o dia?


então... se as palavras insatisfeitas nos ouvem...porque nos roçam as sílabas como se fossem gritos?


 

XXXIII


Tu que escutas a cotovia que resplandece na hora do desconsolo


e tens nos olhos os cacos do mundo para colar...e na pedra os escombros da eternidade


antes que chegue a manhã..procura o sentido do tempo marinho


procura as coisas que fazem os corações desabrochar...o alvo vermelho da inocência


procura o ar que te respira... a troca de olhares sob as folhas doiradas das tílias


depois podes avançar...nada te prende...porque a folhagem respira o teu nome...


 

XXXVII


Anuncio o tempo invisível do grito preso numa incerteza que desaba


o escuro é agora uma paixão que o infinito contorna...uma pulsação desequilibrada


um lugar onde os anos se pesam com tempos insatisfeitos...


espessos ...como olhos de ninguém.


 

XXXVI


Com as minhas mãos espalho o frémito que se solta da urze


o vendaval levanta o tapete das palavras...aprofunda-as...grava-as num tempo que desaba


o linho é branco..o espaço é um olho sem tempo...os anos são risos de Deus


e desabamos em voos que se findam em cavalgadas...a pique...sempre a pique..


em direcção ao relincho silencioso dos lábios trémulos!


 

LXXXVII


No teu abraço canto a sombra angulosa do fogo inapagado


em ti me embalo extinguido...desenfreado...


naquele embaraço inesperado de uma pintura engolida pelo desfiladeiro eterno


sou o forasteiro entrelaçado no canto dos teus olhos...


a caverna invernosa onde engoles os dias...desmedidos..gotejantes...


amarrados ao sémen que escorre pela vereda-sombra do luar...


onde está o luar? vês o luar agitado?


vês a lápide onde inscreveste a escorrente lágrima?


tudo se apaga no esvoaçar desmedido da palavra


enquanto o vermelho se espasma como uma coroa de fogo glorioso...


e a cinza se prolonga nos teus olhos..


como harpas arremessadas por mãos de embalar.


 

LXXI


Folheio a verdade das coisas como se fossem resíduos de sóis inflorescentes


descubro essas verdades nos lábios polidos das ruas que saem de mim


flutuo na crista de um vale onde esvoaçam cabeças salpicadas por incêndios


e escuto a inaudível sonata de um sonho despojado de aves submissas...


 

LXIX


Talvez estejas no meio dos rumores que se ouvem nas ruas cobertas de saibro


talvez os teus passos sejam a cidade por detrás de mim


ou talvez sejas o desfiladeiro que me leva ao encontro de uma rua sem fim...


 

LXVII


Coágulo de claridade...atrás de ti os céus e o mundo


nas bocas ardem curvas..brechas de deuses falantes


as falsas argilas geram falsas eternidades...dormem os fogos que o vento ateia


as estrelas são âmbar onde navega o teu leito...e a resposta é uma rota voltada ao vento


contudo...nenhuma meia-noite cantará...


 

LXIII


Apagas a face nos olhos da eternidade...percorres a ferida que intacta te espera


e é já hoje o voo mordido da dança feita de flores...dentes-de-leão...destinos


mas no fundo verde da maresia... vês a seda e o gesto que te percorrem...


 

LXII


A noite voava sobre um branco intacto...prata de sorrisos abertos à água receosa


a lua era um cristal  incendiado


a vida...era a verdade na boca da criança....


 

LXI


E do branco-nocturno saiu a ternura...as acácias floriram em flamejantes laranjas-claros


palavras irreais entoavam vidas vulcânicas...


imitando a solidão de um tempo nu...


 

XXXI


Tacteio o teu cintilar como se fosses a minha mão


nado na tua vagarosa sílaba inacabada...é meia-noite


e eu desço pelo fio de seda que me prende a ti...


sempre preso a ti...


 

XXX


Constelações...tectos onde as estrelas dizem noite


verdades...sombras de diálogos ondulantes


palavras...cristais que despertam no esquecimento


 

XXVIII


És a flecha que derruba o tempo nu...o olhar que avança por entre a orla da noite


és a despedida onde o corpo oscila...


e qualquer gesto teu é agora uma chave que sobe os degraus dessa noite...


até que o verão morra nos nossos lábios inocentes...


 

XXVI


Tardam os mundos...despedem-se as almas..as flecham ardem no pensamento


zumbidos de nuvens que avançam na auréola do cosmos


é esta a noite...são estes os olhos...


sempre a apontarem o caminho dos dedos...


 

XXIII


Em maio tudo é possível...podemos ouvir na folhagem florida todos os tempos


nocturnos anseios de mãos que deslizam em redor de uma palavra...


segredos de corações recolhidos nas corolas das papoilas


como crisálidas que esperam a noite ...eloquentes como a frescura de uma boca


adormecidas como nomes de árvores sem frutos...


à noite....não se vêem as aves que esvoaçam em redor do esquecimento


dispensamos tudo o que desliza no despertar dos sentimentos


porque o azul é a côr que arde nos céus que nos buscam...


 


 

XXII


És um jogo de sombras inventadas numa mudez de sonho


resina de fontes que escorrem pela terra surda


verão debruado por aves vermelhas...esquecidas ...


como gelos dispersos pela água tardia


onde a tua boca bebe a encantada luz escarlate..


que paira sobre todas as maresias ...encantadas...