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folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

Os cantos inacabados das palavras...


Corro como um homem que acalma os dedos percorrendo a melancolia branca dos dias


Tudo pode ser...tudo amanhece...


Até a tempestade que espera imóvel nas asas dos insectos


Sou como um sismo embriagado...uma ilha planando sobre o sangue coalhado dos mistérios


Ato-me à proa de um barco que divaga...incansavelmente..dolentemente


Aqui a solidão é uma memória que corta a beira-mar..um riso que recolho da maresia


E tudo isto é sangue incansável...sangue escorrendo pela dilaceração das águas...


Como vultos derrubados sobre mesas sujas de vinho...


Só eu sei que unhas me rasgam os cantos inacabados das palavras...


Enquanto certeiramente construo um abrigo onde a espuma me visita...


 

CXI


Nos teus pulsos tens o mar...a hora maravilhada..o sangue


sugas os astros brancos com a tua garganta esfolada


fazes a tua prece às estrelas mais distantes...


esperando sempre pela resposta que adivinhas


e curvas-te perante as algemas que se prendem aos campos floridos...


enquanto o cisne come os grãos feitos com a pedra que se desprendeu de ti...


 


 

CX


Agarramos o sangue vertido por uma prece suspensa no mar


pegamos-lhe como se fosse um astro perdido no tempo


e vamos por esses campos... sempre junto às pálpebras frescas


sempre pegados aos lábios carcomidos... como os seixos na praia


e perguntamos á cova..ao vento...a todas as estátuas de bronze


aonde nos conduz esta jangada feita de Invernos?


para onde nos leva a curva inexplícita onde aterram os ventos glaciais?


que cânticos se escutam nas fendas das pedras coloridas?


mas no negro voo do corvo vêem-se os olhos derreados do silêncio...


 

CIX


Dentro das nossa sombra vive o segredo das nossas almas


é assim a linguagem dos dias...


são assim as mãos que despertam no botão florido das lendas


é assim o seixo que se desprende da encosta..rumo à sombria foz dos rios


conheces o nome do meu rio?


aquele que nasce na nostálgica serra de onde partem todas as águas?


aquele onde os porquês se dilaceram de encontro às margens amputadas?


pois não sabes..não procuras...mas ele aí está....


como um segredo guardado na proa de um barco-chama...


que arde no Inverno que descasca a bétula..ano após ano...


 

CVI


Era o teu nome...o degrau solarengo e etéreo onde eu me sentava


ameno o teu pensamento ciciava por dentro do rochedo


de onde pingavam restos de algas entrelaçadas com os nossos corpos


 

CVIII


Coloridas danças de neve clara atravessam os ares


o deserto é um pensamento intrincado onde as vozes sepultam a areia


e onde os corações são sóis eclipsados pela distância...


mas... as palavras são as dunas onde os poemas se despem.


 

CVII


No canto desenfreado da bruma vejo a margem tardia


onde os barcos embalam a poesia


e as palavras são a voz da areia levantada pelo sudeste


aqui somos nós..aqui remexemos na lamacenta ternura do céu


e vemos cometas vespertinos..capturamos a centelha de nós que penetra no infinito


e o real é apenas o lábio...a sobrancelha silenciosa do profundo coração


que na outra margem aguarda pela quilha do barco que nos transporta....


 

CV


No silêncio baloiçam os rumos


eis sobre ti a estaca que te aperta o vazio da voz


a neve é uma sonolenta esperança que se agacha perante o desmaiar da fronte


tropeças..e por detrás de ti o sorriso da escuridão que oscula a alma....


 


 


 

CIV


De pé recordo na mudez das cores de ontem


as feridas invisíveis da dor chamejando nos archotes cadentes


e deixo-te o meu rasto soprando pelas colinas


para que os teus olhos feridos me sigam...


como uma ave extraviada


que procura a dádiva de uma recordação que escorrega pelo degelo glacial...


 

CIII


Caem os pensamentos que latejam na areia movediça do silêncio


dormimos como se fôssemos a colina que atravanca a paisagem


apertando a dor de encontro ao indecifrável hoje


seguimos erguendo a nossa bandeira ao mundo


espalhando infinito por todos os poros...


 

CII


Nada vem da intemporal sombra que caminha pela água


o espaço é agora uma torre sineira que nos sustem os olhos confundidos


somos a cruzada celeste...


a trituração das coisas que ouvimos na profundidade do espaço


porque a nossa seara é agora feita de bocas e vozes encerradas na arca do tempo.


 

CI


Intemporais são os barcos que naufragam


nas lágrimas suspensas da mão alquimistica do orvalho


nascemos e já as coisas tinham nome..as cinzas...as margens...o tempo


mas ninguém conhece o tempo...ninguém sabe onde pendurar o tempo


e também nós voamos como o falcão..revirando as asas...ceifando os segundos


correndo como a areia pelo estreito fundo da clepsidra harmoniosa


descendo sempre em direcção ao desprendimento ferido da noite.


 

XCIX


Jaz a noite fatigada...ciciam os sonhos nas cordas das violas


as faias gravam os nomes das vozes extasiadas...


o tempo nada nas praças desertas


e o infinito suspira lágrimas ...suspensas nas almas que caminham até nós


enquanto o guarda-rios prescuta a margem onde a tua mão se refugia...


 

XCVIII


Vinhas como quem lê o tempo escrito nas praças que nos atravessavam as mãos


sustinham-te as margens aquáticas onde as aves se espelham


sem vozes e sem noite...eras o mergulho dos segundos ceifados ao verde matinal


e corrias para o teu próprio renascimento....


 

XCII


Atrás de ti..o tempo que sobe pelas paredes sensoriais


em frente a ti...a noite invisível que as mãos tecem


os cegos ardem num dissipado olho que se libertou da visão


agora a paisagem é feita de arbustos-algas enrolados em melancolias


e a poesia transformou-se numa caveira soterrada numa barca azul...