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folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

Sei que sou capaz de me diluir num olhar..


Alheio a um tempo que me percorre...olho o lago onde a luz se aperfeiçoa


Nas margens lodosas irrompem as palavras


Ao centro os nenúfares fazem escorrer a água que lhes atiro com as mãos da memória


Delicadas aves desprendem-se da paisagem


Regresso ao tempo das pedras..enquanto caminho ao longo do meu corpo


Sei que sou capaz de me diluir num olhar..de me esquecer da minha pele


E quem sabe se não posso esquecer a fome de ti...


Que os meus olhos te sintam ...pouco importa


O fresco da tarde..vem a pouco e pouco acordar-me do voo


Desço até ao ínfimo fragmento de mim


Como se descesse de um tempo mágico


Um tempo que corre ao meu lado...esquecido do fogo que ateei aos desejos


E que me faz desprender da perfeição de um tempo que teci em mim.


 

Pensamento XV


O Homem é tal e qual uma árvore enxertada com diversas espécies de plantas


O tronco é um só...


Mas dos ramos nascem ideias como se o Homem fosse constituído


Por manhãs e noites onde as palavras adquirem o veludo do barro


Ou a aspereza de um desejo embutido num alvéolo de utopia.


 

Abro a janela


Abro a janela para ouvir a chuva a cair no pátio


Abro a janela e saio de mim


Vou com os pingos transparentes


Sigo através da tarde como se fosse um fio de voz


Respiro a humidade do rio


Deitado na navegação das palavras que não se afogaram


E que se erguem na líquida neblina


Como a água cantando sobre pedras suspensas na tarde.


 


 


 


 

Pensamento XIV - o que não faz sentido


 


Nos dias de hoje queremos tudo certinho e catalogado, abominamos o que não faz sentido, mas porque é que as coisas têm que fazer sentido? Não será o que não tem sentido uma realidade? Não vivemos nós num mundo onde nada tem sentido?Talvez a beleza da vida resida nas coisas que não têm sentido aparente , porque são essas coisas que nos fazem procurar algo que faça sentido e essa busca é incessante, porque nada está acabado nem definitivamente perdido.


 

A vida é uma iluminação permanente


Vi a campa rasa..sem nome...coberta por azulejos brancos


Ali se espelhava o céu dos que se perderam


Ali estão as vitórias e as derrotas..junto das memórias gravadas na terra...


Como uma lápide de tempos circulares


Em cima não há fotos nem adolescências...nem passos... nem vibrações


Há um momento perdido no fundo de uma memória


Já não se reconhecem os olhos das árvores...nem a lucidez dos pássaros


Tudo passou a fazer sentido...já não perguntamos pelo nosso rosto...


Perante a campa esquecida ...não queremos saber de rostos ...sabemos que estamos ali


Sabemos que um dia também trocaremos a vida pelo esquecimento


Abandonaremos o corpo...seguros de que não voltaremos


Levanto-me e cravo as unhas na minha cegueira


Ergo-me como uma imagem enfastiada


Tudo me seduz...toco no tempo..persigo os vestígios das pálpebras cerradas


Descubro que a vida é uma iluminação permanente


Um cristalizar de esquecimentos...


Uma atracção por todos as coisas que ardem nos poros dos dias


Sou a pirâmide que se ergue do fundo de mim


Cintilo...sou nítido..sigo pela humidade de um céu cúmplice


Renasço num tempo incógnito...abandono o meu sudário


E entro na noite como uma folha de papel levada pelo vento.


 

Existimos como brechas no silêncio

 


Seguimos na noite austera...como medusas fluindo junto ao mar


Zumbidos brotam na paisagem cinzenta...escorregamos pelas dunas..suavemente


Manchas sonoras perdem-se nos nossos labirintos...


Existimos como brechas


No silêncio ardem cores...o inverno vem instalar-se entre nós...o luar emudeceu..


Perdeu-se no escuro serpenteante das águas...


No fundo das manhãs nadam peixes encarnados


Procuram coisas que a terra atira suavemente ao mar ...


E em nós residem explosões de azul


Como se mergulhássemos numa água metálica...


Condensada... como se fosse um monólito de amor!