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folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

O relógio de sangue é cúmplice de Ares

Sangram as raízes das estátuas..


Mandrágoras velam os dias por dentro dos sussurros


A seiva do passado é a origem da música esquecida


As flores enfeitam o cemitério dos feitiços


O tempo sobra-nos..o relógio de sangue é cúmplice de Ares


Afrodita desliza pela chama da noite erótica.


E rochas lunares espreguiçam-se na fénix das cidades.


 

Breviário XIII

Distraídos pensamos que o futuro ficará connosco


E na sombra da luz que alumia os nossos medos ...acreditamos nas cartas dos oráculos


Mas o tempo está morto..afogou-se na respiração das horas


É uma formiga-de-asa em delírio...voando para o extâse do céu.


 

A morte é a poesia desprovida de respiração

 


Calcárias areias falam-me dos afogados


Nas grutas a água escorre em lágrimas estalactizantes


Contemplo os pingos que caem das vozes de quartzo


O coração é uma eternidade reclamando pela fosforescência da luz


Um manto feito de rosas explode numa memória de cristal


O infinito é um pássaro alheado das suas belas penas


A morte é a poesia desprovida de respiração


Porque quem se afoga reveste-se de sal-gema


E fica para sempre deitado na indefinição de um mistério.


 


 

Um novo tempo de nos olharmos

 


Despe-me desta morte que me veste o corpo


Aquece a frieza que por mim passa..rastejando como a serpente negra


Altivos rios pedem o regresso dos meus passos às margens do teu olhar


Ainda que a sede de fontes me procure


E que a milenar voz da infância deserte


Sei que é nos bosques que os rios se prolongam


Conheço o delgado enlouquecer da Hydra


E a perfeição transparente do barro frio


Hoje a ninfa de jade ecoou no lodo feito de pele arrepiada


Disse que a ausência das aves é um desvario das pedras


Que os sonhos nos tocam com mãos de ouro


E o fogo arrefece no silêncio de cada jardim.


Mas um dia..em cada árvore nascerá uma utopia


Em cada caminho haverá um desejo


E quem sabe..com sorte...os fragmentos da morte enlouquecerão


E dirão que nos rostos vivem paisagens


Nos olhos o horizonte não terá fim


E seremos todos mágicos..inventando uma nova escrita


Um novo tempo de nos olharmos


Porque do único sol que existe embutido em nós


Desprendem-se os caminhos da ternura e da água.


 

O tempo que adormeceu na sombra de uma sebe


Jardim de alamedas fugitivas onde alcanço a poeira da minha idade


Aqui o tempo renasce em cada orquídea...aqui se perde a minha face


Uma pérgola fala de olhos..de tacto..de cumplicidades


Aqui o dia é uma árvore frondosa...é o amansar da tarde


Pergunto onde vai o tempo que perdi nos desencontros


O tempo que adormeceu na sombra de uma sebe


Persigo esse tempo colado a mim...essa imagem cheia de olhares impacientes


Estou vivo na harmonia de um canteiro de begónias


E sonho com murmúrios de regatos onde as árvores deitam os ramos


Mas já não sou eu...sou apenas a parte de mim que a natureza me deixa espreitar..


 


 

Um caminho sem memória

 


Do tremeluzente escuro emanam os olhares fixos no fundo dos corpos...


O teu corpo é um mundo nu...um fio de seda abandonado sobre a areia...não te quero falar


Mas digo-te agora que nada aconteceu...que a luz se deitou e eu desapareci...


Que tempo demora um corpo a desaparecer? Um corpo do tamanho da eternidade...


Uma respiração caminha ao nosso lado...mas não produz vapor...é escura...febril


E tu ficas aí como um caminho sem memória...uma insónia sem silêncio...perto de mim...


Reluz o teu rosto...um navio deita-se na praia..e nós...extinguimo-nos!