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folhasdeluar

Poesia e outras palavras.

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Poesia e outras palavras.

E a minha voz?


Ancestral infinitude de um mistério que voa no bico de uma ave nocturna


E a minha voz? De onde vem a minha voz? Que ecos explodem na minha garganta?


Inverno...semáforo desligado...lâmpada onde corre a luz negra...


Profundos jogos que se desfazem numa colossal centelha que vibra num peito alvo


Reveses de vida que desaguam numa planície de esmalte...aquática sacerdotisa do impossível


É possível que nas tardes se prolongue a vida..que a noite se feche numa morte sólida


E que a dor se encha de buracos onde se apagam os fragmentos de um céu cósmico


Que as águas se turvem sob uma humidade suspensa numa luz errática...


E nós sopremos as cinzas cintilantes de uma ave suspensa num raio de luz...


Para longe...para bem longe...


De todos os mistérios ecoantes nas colinas azuis...


 


 

Vou para onde o mar começa

 


 


Hoje..no fim dos olhos assustados do Verão


Encerro-me no teu nome..


Contemplo-te como quem vê a obra inacabada


Recordo -me das cidades escondidas por detrás da chama rubra da tarde


E vou para onde o mar começa


E onde nós vogávamos clandestinamente nas vagas


Como se fôssemos notas musicais de uma nudez em delírio.


Mas... se eu hoje destapar os olhos..


Apenas vejo as aves vogando em contraluz.


 


 


 

A.Zambujo e M. Araújo - a grandeza da simplicidade

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No sábado fui com a minha mulher assistir ao concerto de A.Zambujo e M.Araújo, isto não tem nada de extraordinário porque para além de nós foram mais alguns milhares que esgotaram o Coliseu.


O espectáculo foi irrepreensível, boa música, humor e ambiente castiço, mas o que merece ser contado é o que se passou nos encores, sim, foram nada menos que três.


Acabado o espectáculo o pessoal não arrede pé, palmas de fazer estremecer a sala e eis que eles voltam para o primeiro, acabado este, a malta continua a pedir mais e eis que eles voltam, e voltaram também ainda mais uma vez, neste terceiro encore alguém pediu uma música e eles cantaram-na, finda esta, diz Zambujo:" partir de agora vocês pedem as músicas mas com uma condição têm que vir ao palco cantá-las connosco, e assim foi, que pedia ia cantar com eles, particularmente emotivo foi o pedido de uma menina de seis ou sete anos, que quis que cantassem a" A casa fechada", e não é que a menina era afinada e sabia a letra...no fim eles chamaram ao palco todos os que tinham cantado com eles para os agradecimentos finais. São artistas como estes que nos fazem sair de coração cheio e alma grande dos seus espectáculos.


 

Ressoando nos corpos gastos!


Pardas tardes alongam-se sobre a liquidez dos dias..nos bosques dançam vestais...nuas


As sombras vibram com as águas que escorrem em espasmos de cansaço


É o Outono...a cosmicidade de um desejo deslumbrado..magia misturada com vento


Nada é real..eis aqui a originalidade do mundo...tudo é inexplicável..


Os desejos e até aquelas colinas bravias...são a nossa criação...


O decote para onde espreitamos a realidade...alongam-se os céus numa prece imaculada


As árvores adquirem as nossas almas...outros como nós dançam dentro delas..turvas


Dentro dos quartos os tectos desabam...as fotos perpetuam a tristeza...os corpos florescem


O nevoeiro é uma humidade que sopra sobre a poeira cinzenta...


Brancos lençóis suspensos na corda... enfeitam os caminhos dos que trabalham


Picam-lhes a alma como facas gigantescas...palavras vibram num inexplicável silêncio


Eis o lugar de onde vimos...eis o lugar onde o êxtase é uma luz inerte...


Ressoando nos corpos gastos!


 

No ventre líquido da ternura...canto-te!


As minhas palavras ficarão perdidas neste montado de sobreiros feridos...


Tal como nos rostos adormecidos...há distâncias imperturbáveis...corações secos


Apagados pela chuva que lentamente se esgota nas tardes sofridas das marés


E nas plantas residem os lamentos das almas...veias doces...águas feridas...chagas


Sim...sentirei a tua pele a insinuar-se dentro de um tempo que tritura as tardes


Sim ...continuarei a ser a saliva impossível das cidades...a límpida solidão coralina


Escuto todos os lamentos..sei que os dias são tão iguais como sempre foram..e sou teu


No sono enfeitado com luas prateadas..habito....


No ventre líquido da ternura...canto-te!


 

CÂNTICO 3


Entro lentamente no céu da tua boca..nasço aí como se fosse transparente


Enquanto escuto a melodia que desaparece sob os teus olhos cristalinos


A obscuridade é a força que nos impele para o luminoso encanto do amor


E voamos pela claridade suspensa no perfume das coisas


Renascendo sempre nos olhos semicerrados da poesia.


 

Emergimos nos sonhos


Vastas são as prisões que se erguem no escuro do pensamento


Peles suaves acariciam-nos os dedos...no ar os risos jorram como grandes aves ternurentas


Apreciamos a nostalgia de uma flor na janela de um prédio arruinado


Desaparecemos no vasto túnel onde a luz é uma explosão de negritude


Subimos depois como balões de ar quente...sempre em procura de uma lua injusta...


Sem destino ...


Pincelamos os pássaros com esguichos de recordações esvaecidas


E enchemos as mãos com dolorosas bermas de caminhos poeirentos...


Desabrochamos como pessoas suspensas num corpo alado...


Repetidamente...repetidamente...


Até emergirmos em centelhas de sonhos que voam em direcção a uma vidraça...


Por onde espreitamos as límpidas águas que se recortam nos céus sarapintados...


Por tonalidades de fulgurantes laranjas.... lapidares....


 


 

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