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folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

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A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

AsTrês Marias

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No terraço o alecrim que vivia nos vasos regados pela cacimba alumiava a noite com o seu aroma de doçura. Em frente, no escuro as Três Marias subiam num céu opaco. Era o tempo da floração dos hibiscos e nas sombras desarrumadas das pereiras apareciam vestígios de gatos noturnos.Os insectos embriagados pela luz mortiça da casa cresciam como incertezas. Havia ainda o silêncio dos livros nas estantes.Havia o pólen sufocante dos limoeiros em flor. Eram momentos em que o pensamento acendia o seu lume e o tempo corria pelos corredores silenciosos da casa.Era um tempo desarrumado que repousava nos rostos agónicos que pendiam das paredes.Havia a incerteza das sombras que espairecia pelos recantos da noite.Os grilos evocavam o perfume da insónia.Dormir era perder tempo.Dormir era o desencontro com a aves nocturnas. Havia um toutinegra que fazia casa na garagem, era um nicho acolhedor onde eu gostava de brincar aos encontros com personagens que só eu conhecia.Dentro e fora de mim havia estrelas, céus feitos de casas coloridas, soalhos de açúcar e chocolate. Um dia soube que tinha crescido. Que as minhas mãos eram agora feitas de sombras e perdas.Que as minhas calças já não tinham vestígios de terra nos joelhos.então deixei cair os olhos sobre o jardim. Esperei que os amores-perfeitos se embriagassem e deles irrompessem pessoas com estames nos cabelos.Soube que a marcha da noite se parecia com um lençol sujo de estrelas.Subi os degraus que davam para o primeiro andar da casa.Aspirei todos os aromas da noite e estendi-me no chão do terraço como se fosse a vida a secar as águas salgadas dos olhos.

 

Ouves todas as palavras

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Ouves todas as palavras que te atravessam como uma vertigem.Sentes a lembrança de um tempo que não se repete. É tão raro escutares os sons da vida quando a tua alma desemboca num cais desconhecido.Mas estás vivo. Estás vivo para além de toda a serenidade da foto onde vês a tua juventude sem rosto.Ficaste isolado num tempo de cipreste apontando o céu.Devoras agora a tempestade que te assola.Cantas sobre a saliva que sai da boca estranha do tempo e esperas serenamente pelo regresso das violetas.Enquanto viajas para além da concha que se fecha como uma máscara feita de jade.