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folhasdeluar

Poesia e outras palavras.

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Poesia e outras palavras.

Tudo é sombra...

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(foto Brassai)

Relembro no teu olhar o infinito..eras o rumor de tanta coisa que existia

Eu era o sol desperto onde teu o mar entrava...eu abria as asas e era feliz

Tu rias de todas as maneiras que não sabias...eras a iluminação profunda

A vida reunia-se em ti...e vestia-se de todas as cores que aconteciam no crepúsculo

Havia qualquer coisa de eterno..como se uma divindade nos acolhesse nos braços

Hoje abro a janela e vejo deslizar o horizonte...mas já não sinto o teu bater de asas

Hoje vejo as sombras do que fomos..

Como se acertasse contas com um passado sem sentido

Vejo a geada a evaporar-se na manhã fria...como um adeus a todas as coisas

Há ramos despidos na romãzeira onde nos sentávamos

Há ausência depois da existência

Mas há também um aceno imóvel no silêncio...um chamamento claro...

Mas no perfume árido dos caminhos onde te persigo...tudo é sombra...

 

 

Não deveriam os sem-abrigo ter um estatuto como os refugiados?

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O ano está a acabar e não o posso finalizar sem recordar os sem-abrigo. Portugal vai receber centenas ou milhares de refugiados,(situação com a qual concordo), mas...não serão também os sem-abrigo portugueses de alguma forma refugiados? É por causa disso que eu acho que se há pessoas a dormir na rua é porque do ponto de vista político não há vontade de resolver esse grande drama que são as pessoas sem casa. Se vamos arranjar locais onde os refugiados possam viver porque é que não se aplica a mesma filosofia aos sem-abrigo? Na verdade custava muito pouco ou quase nada arranjar soluções para estas pessoas, porque é de pessoas que se trata, não é de coisas...são pessoas. Sem fazer comparações, (não me interpretem mal), quando um animal é encontrado na rua, há locais onde o recolher, curiosamente quando as pessoas são obrigadas a viver na rua, resta-lhes as arcadas ou as ombreiras das portas.Seria muito simples acolher todos e digo TODOS os sem-abrigo, bastava por exemplo que cada quartel de bombeiros acolhesse um, ou que as Juntas de Freguesia se disponibilizassem a recolher também uma pessoa,poder-se-ia acrescentar a igreja, através das paróquias e das casas paroquiais, com um pouco de solidariedade tirar-se-iam de rua todos os sem abrigo.Bom 2017 para todos.

 

 

 

Barco-pássaro

Barco-pássaro que recolhes o Inverno nas mãos

Deslizas por entre os beijos da folhagem sentida

Fresco limiar de crisálida embalada num azul-cansado

És como as asas de um peixe que esvoaça à luz do pensamento

Navio intocável..

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Como um breve silêncio cintilas no gume acerado da água

Sentes a mão que afaga a cidade despida....o navio que parte...o porto

Olhas a ausência como se fosses uma febre solitária..tens delírios de sedes felizes

Pela tua fronte deslizam seixos...imagens de febres cintilantes

No vazio das águas procuras sentir as imagens que te destroem

Saudades de chamas furibundas..ainda as sentes

Mas já nada te retém...a espuma etérea apagou-se...

Levantou-se sonâmbula e triste..partiu debaixo de um sol apagado pela névoa

Já por ti passaram mil vozes depois da partida..fôlegos de espelhos feitos de lodo

Adormecem nas tuas mãos cruzadas sobre um turbilhão de sóis

Aproximam-de de ti lábios impiedosos...corpos desenhados no areal... desordenados

Na rua passeia-se o teu destino...levantam-se sombras...estremeces

Na rua há um vapor a sair de cada janela...

Uma imagem levanta-se no escuro...procura-te

E tu cristalina e pura...estás lá como um navio intocável..

Balançando nas águas escuras...

 

 

Janelas fechadas

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Cai sobre nós a escuridão...como um estilhaço de língua muda a delirar no escuro

Derrama-se a sombra pelos olhos...já não somos dois

Há sempre no final da noite...um travo a chumbo nos corpos separados...uma morte delirante

E mesmo perante os relâmpagos que incendeiam as paredes solitárias dos quartos

A vida corre nua..num ápice a razão desaparece...a vida fica estranha...rasgada

Há um absurdo fluir de mágoas...e a candeia húmida...exala uma tétrica luz desfocada

Já não há seios nem coxas a elevarem-se na loucura de uma paixão ansiada

Há agora uma ignorância...um espaço indefinido..estranhos devaneios

Olho o céu provocador...sinto o odor dos escombros de nós...fecho os olhos

Aspiro esse estranho jogo do coração...

Estendo a mão pela delicadeza sinuosa das memórias...sufoco

Que dimensão têm os sonhos? Que fome satisfaz a voracidade das mágoas?

Sei que há um lugar onde seremos duas janelas...insatisfeitas...fechadas...

 

Coisas que dão que pensar

 

No Alentejo foram presas catorze pessoas por andarem a roubar azeitona.Tinham em seu poder cerca de tonelada e meia de azeitonas e já era a segunda vez que o proprietário tinha apanhado aquelas pessoas a roubar.Mas azeitona que andavam a roubar era a que tinha ficado caída no chão depois da apanha feita pelo responsável da propriedade. Dizia o homem que o que o incomodava era a invasão da terra, e que até já tinha mandado espalhar herbicida por cima das azeitonas para que ninguém as apanhasse. Ora o que me indigna é que se mande espalhar herbicida sobre algo que pode ser aproveitado, e que em vez de envenenar as azeitonas não as dê a quem as queira.Neste tempo em que existe um combate ao desperdício alimentar são estas as mentalidades que temos, ainda por cima as azeitonas pertenciam a uma conhecida fundação, o que por  si explica que se deveria promover a caridade em vez de se mandar prender as pessoas, que de certeza se lá andavam era porque precisavam.

 

O verdadeiro analfabeto

O verdadeiro analfabeto é aquele que não compreende a vida, quanto ao resto somos todos analfabetos em alguma coisa, uma vez que não podemos saber tudo. Só há uma coisa coisa comum a todos nós e chama-se Viver e é no saber viver que todos nos deveríamos tornar sábios.

 

Espirais de memórias

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 (Foto Robert Capa)

Reacendes o tempo na candura sufocante da solidão

Conheces o grito que cresce em ti..arde-te sob a pele...bem fundo

De vez em quando reacende-se a paixão..como o canto da andorinha..negro

Há espelhos a dizer-nos quem somos..dormências... ardores de pele

Com o tempo virá o caminho...o lume..o turbilhão

Será ainda possível que dos nossos corpos matinais espreite a alegria?

Crescemos dentro de um grito abafado...

Já não nos basta a pena do esquecimento...

Não deixes que as sílabas se apaguem na viagem

Sepultaremos as nossas vozes em cinzas de cidades..inesperadamente acordaremos

Reacendidos...como uma noite cansada de sorrisos..

Espirais de memórias erguer-se-ão em nós...felizes e obscuros...esquecidos

Deixaremos que o mel deslize nas pústulas abertas pelo saciar dos dedos

Deixaremos que os nossos vestígios regressem...não vale a pena caminhar

Tudo é absorvido pela ausência... mas dentro de ti e de mim...

Ainda pode haver nós...

 

 

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