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folhasdeluar

Poesia e outras palavras.

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Poesia e outras palavras.

Um risco de lápis envergonhado

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Sento-me na pedra rugosa que assenta na relva que desliza junto ao rio.Granito solitário.Leio. Um insecto pousa numa das páginas.Minúsculo. Afasto-o com um gesto desastrado.Esmago-o sem querer. Deixa uma marca na página. Cinza claro.Como um risco feito por um lápis envergonhado.Leio. Passado algum tempo volto à página onde esmaguei o insecto. A marca perpetuou-se na página. É a vida do insecto que ali está. Tal como este livro perpetua o autor, também a página perpetua o insecto. Risco de lápis envergonhado.Quantos de nós nem um risco de lápis envergonhado cá deixam quando a vida nos esmaga? Leio. Sei que o futuro é amanhã.Sei que o amanhã é passado.

 

P.S. - o livro é - A Guitarra Azul de John Banville -

 

Deveria ser criado um subsídio ao ócio

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Vivemos num absurdo civilizacional onde as novas tecnologias que nos vieram libertar do trabalho pesado, agora nos escravizem com o aumento do tempo de trabalho. É um absurdo que os jovens definhem sem oportunidades enquanto os mais velhos desejam apenas ter tempo para viver. A dicotomia entre o tempo de trabalho e o tempo de viver tem que ser repensada e utilizando a feliz expressão do Prof. Agostinho da Silva: “deveria ser criado um subsídio ao ócio”, sim, quem ao chegar a uma certa idade puder deixar o seu posto de trabalho a outra pessoa deveria poder fazê-lo recebendo esse subsídio. Quantos de nós não abdicaríamos de parte do nosso salário em troca da liberdade? Quando se perceberá que o tempo de trabalho é um bem escasso que tem que ser distribuído por todos? Parece que não será nos nossos dias, uma vez que esse bem que rareia está cada vez mais concentrado naqueles que têm emprego e que mesmo que queiram, não o podem distribuir por quem anseia trabalhar. Estamos a voltar aos tempos da revolução industrial e parece incrível que com todo o saber que existe e com toda a tecnologia ao nosso dispôr sejamos cada vez mais sacrificados e infelizes e tenhamos menos tempo para viver.

É tempo de parar e pensar, é tempo do homem usufruir de si e não de ser usufruído pelo tempo de trabalho, é chegado o tempo da realização do espírito...

 

Há tesouros dentro de nós.

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 (foto Leonard Nimoy - the full boby project - Matisse Circle)

Os teus dedos fazem a minha noite...

Ignoram que nas delirantes carícias ...residem ondulações de corpos felinos

Dentro das tuas mãos há um jogo...uma tempestade que me arrasta

Desconhecemos o húmido palácio que habitámos...corremos pelo céu...

Não sabíamos que dentro dos nossos olhos havia uma pele arrepiada

Era a noite dos relâmpagos...a língua rugosa da luz a incendiar-nos

Nos nossos extremos havia o peso longínquo das vagas...fluíamos pela noite..éramos

No devaneio florido da imaginação...cobrimos a nossa pele com absurdos...fomos

Fomos carícias e seios e coxas e costas ondulantes...ápices imparáveis

Na realidade do nosso olhar ardia a febre...a barca...a ponte levadiça

E por muito que o coração se reparta..há sempre um sonho a morar nele

Uma álea inteira a desabrochar no desconhecido...um futuro antigo

E mesmo que abramos a mão e nos derramemos em todos os recantos

Mesmo assim...há tesouros dentro de nós...há janelas

Há ventos femininos a arrastar-nos pelo fogo...

Como uma fome estendida sobre o corpo...

Ou como algo delicado que nos percorre

Mas jamais saberemos que dedos nos perseguem

Que linhas de mãos se estendem fora da nossa vidraça...esperando

De boca aberta...como uma miragem sem peso nem vida...

Só para nos dizer...

Que desconhecemos o encanto ensanguentado de um coração desatento

Que vive dentro de uma inseparável auréola azul.

 

Estimular a criatividade

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Há que fazer a distinção entre duas coisas:escola e educação. A escola que temos idealizada por adultos com base na sua forma de viver: canibalismo social, competição, concorrência e castigo, não corresponde ao tipo de educação que os alunos deveriam ter. A educação deveria ser baseada na criatividade, na participação e na liberdade de escolha. Poucos questionam a razão pela qual as crianças odeiam a escola e muito menos pensam no que há a que fazer para a tornar atractiva e praseirosa. A escola onde o aluno apenas “empina” só para o teste ou para passar de ano é inútil e castradora. O aluno deveria estudar apenas o que lhe agradasse. Se o aluno quer ir para química ou biologia(por exemplo), não faz sentido aprender matérias que nada têm a ver com essas disciplinas.A escola impõe porque entende que faz parte da cultura geral e é aí que reside o problema, a cultura geral não pode ser imposta deve ser escolhida pelo aluno e é a ele que se deve dar a possibilidade de escolher o que quer estudar, não deve ser obrigado a estudar coisas que não lhe interessam e que não vai utilizar na vida prática, porque isso conduz ao desinteresse e à obrigação que inibe a criatividade. Para além do caminho que o aluno escolheu para o seu futuro,(matéria sobre a qual deve estudar e só esta matéria deve ser obrigatória), o aluno deve escolher um tema de que goste, construir uma tese e apresentá-la no final do ano, só assim o aluno se torna criativo e participativo.

 

 

 

Devemos levar as crianças a visitar o Jardim Zoológico

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Devemos levar as crianças a visitar o Jardim Zoológico não para que apreciem os animais, mas para que percebam a ignorância dos adultos. O Zoo é o paradigma da sociedade moderna. O Homem Moderno pensa-se feliz vivendo num jardim que é apenas imaginário, tal como pensa que os animais presos no Zoo estão felizes só porque os alimentam todos os dias.

 

Fitas o silêncio

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Junto ao entardecer há um sonho escondido..uma chuva cansada...um lugar

Abres a porta da memória e respiras rotas desconhecidas

Breves partes de uma peça escrita em pedras orvalhadas..vaivém de paixões

As sombras escondidas por debaixo da pele..falam-te de marés...e de rostos

Lembras-te da noite que escorria em todas as tuas direcções?

E da penumbra que te fitava dentro da alma dos Deuses?

Nos escondidos lugares onde aporta a quilha destroçada do teu navio

Há partes da tua pele lenta....panos de linho...flores de tílias

Balouça o teu corpo no crepúsculo do amor...

Falas de ti ao vento...dizes-lhe que cintilas nas páginas abertas do tempo

E que escorregas pela sombra destapada das laranjeiras...aromas...doçuras..

Sabes que podias ter sido feliz...mas a melancolia acorda-te...senta-se contigo

E despertas em todos os caminhos por onde nunca andaste

Procuras saber qual a razão da morte...

Olhas as tuas mãos...fitas o silêncio...

E segues caminhando sobre a cinza desamparada de uma treva feliz..

 

 

O photoshop e as redes sociais

Por causa das redes sociais cada vez dou mais razão ás mulheres que tapam o rosto, eu só ainda não fiz porque ao sair de casa tinha logo algum vizinho a postar uma foto minha e é claro que o pessoal ficava logo a saber que era eu. Hoje em dia já nem sabemos bem o que nos pode acontecer, quem nos quiser lixar é só pôr-nos,(graças ao photoshop) em qualquer situação comprometedora, tipo activista do daesh, ou ainda pior ,a espreitar o decote da Lili Caneças, ou até nos podem pôr de cabeleira côr-de-rosa e aí é que um tipo não se safa da fama de normal...que é como eles dizem agora - és normal ou gostas de mulheres?. Outra coisa são as câmaras de filmar nos elevadores, aquilo é um tormento, um tipo nunca sabe bem para onde olhar, eu fico-me por baixar os olhos, tipo gajo tímido, só para disfarçar que não vejo a menina pernalta que está mesmo ao meu lado, quer dizer baixo a vista mas espreito por baixo, é à portuguesa...a malta gosta mesmo é de disfarçar. Mas do que gostava mesmo de apagar aquele filme onde depois de beber uns copos estou a comer esparregado com o focinho no prato...aquilo já vai em não sei quantas mil visualizações, ainda por cima está um gajo atrás de mim a fazer um par de chavelhos..mas do tipo hard -rock..vá lá ao menos isso...

 

Como uma luz outonal e pura.

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(FOTO Leonard Nimoy)

 

Há quantos dias esperas que a mágoa se erga nos teus olhos cerrados

Que janela vez na verdade inacabada de um orgulho ferido?

Deixa que no teu corpo se acumule a fome..a insónia...a vida inteira

Deixa que nos teus olhos se acendam maravilhas

E que da poeira em sangue dos escombros abertos na tua carne

Um sonho te diga que há mais bocas...mais olhos atentos...mais ternura

No entanto..quem sabe se já não te pertences..

Se nas áleas dos bosques dorme a tua imagem...

Na recusa vive a porta entreaberta da mágoa

És tão jovem..pertences ao mundo...

Quem sabe um dia dirás que amaste..

Quem sabe se te calarás perante a neve esbranquiçada das nuvens

Porque há uma febre nas pétalas das rosas...um olhar atento..uma canção

E um dia...soltarás o sonho que guardas...

E como uma ave que se solta no efémero

Ressurgirás...como uma luz outonal e pura.

 

 

De longe....chega o verão...

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 (Foto Leonard Nimoy)

Aqui vivemos na urgência da verdade..buscamos o modo de dizer as coisas

Ardemos no instante em que as palavras nos saem da boca

Somos o silvo equidistante das lágrimas...

No ardor dos nossos dias...encontramos o impensável...a hora tardia...a voz

No canto das aves lembramos o aroma do amanhecer

Somos sossegados dias passeando pelo regaço das ilhas...

Breves velas de barcos acesos ondulam na distância

Onde está o acidulado dos teus lábios?

De onde vem o verão que nos chega da deriva dos tempos?

Como uma música ansiosa descendo da tua cintura..ondulante abelha

Sentes o sabor adocicado da romã? Recordas a delicadeza de um abraço?

Ouço-te esbracejar na teia esquecida ..canto salgado de harpa nua

Adormeces dentro de um pensamento..és o intervalo inclinado do silêncio

Tens a magnifica fadiga de uma ternura etérea

Caminhas impoluta e bela sobre todos os meus desassossegos

Minha incerta flor de aloendro...meu barco desamparado

Esqueço-me que dos teus olhos saem os meus...

E mesmo assim...sento-me na pedra lisa do poente

E vejo-te como um brilho ferido....

De longe....chega o verão...