Um risco de lápis envergonhado
Sento-me na pedra rugosa que assenta na relva que desliza junto ao rio.Granito solitário.Leio. Um insecto pousa numa das páginas.Minúsculo. Afasto-o com um gesto desastrado.Esmago-o sem querer. Deixa uma marca na página. Cinza claro.Como um risco feito por um lápis envergonhado.Leio. Passado algum tempo volto à página onde esmaguei o insecto. A marca perpetuou-se na página. É a vida do insecto que ali está. Tal como este livro perpetua o autor, também a página perpetua o insecto. Risco de lápis envergonhado.Quantos de nós nem um risco de lápis envergonhado cá deixam quando a vida nos esmaga? Leio. Sei que o futuro é amanhã.Sei que o amanhã é passado.
P.S. - o livro é - A Guitarra Azul de John Banville -