Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

folhasdeluar

Poesia e outras palavras.

folhasdeluar

Poesia e outras palavras.

Deito-me rente ao mar..

85766.jpg

No caminho da memória escolho beber o sono

Entre os dedos o ar corre sôfrego...amor e solidão encontram-se nesta praia deserta

Na boca sente-se a ausência dos olhos cintilantes...o tacto devora o vazio

Afinal...basta-me inventar o teu corpo de cidade submersa

Basta-me beber o teu sono..que não sei onde dorme mas que permanece em mim

Invento também a chuva e a erva verdejante onde bebemos o orvalho das manhãs

Deito-me rente ao mar...como uma folha seca que passa pelas ruínas da solidão

Ouço uivar as rosas...ouso abrir os olhos e encolho os dedos...

Cravo-me...com unhas latejantes

Volto ao início doutra cidade..para te encontrar de novo

E para te dizer...que os fragmentos do que fomos ainda me acompanham...

 

 

Corpo de anjo entrançado numa manhã de sóis...

Dormes..escuto-te o respirar de anjo que se deita na minha primavera

 

Jardim feito de raios flamejantes...

 

Como rios de espadas com cicatrizes que correm num emaranhado de mapas

 

Corpo de anjo entrançado numa manhã de sóis...

 

Que se escapam como fios entre os dedos...

 

Que correm sobre tranças de ouro em direcção a um firmamento intacto...

 

E todas as manhãs penetramos nesse tempo nu...indistinto...

 

Como um astro peneirado por estrelas que dormem numa gota de chuva...

Nasci de um incandescente rio...

Nasci de um incandescente rio...peixe sentado no ventre da Mãe...

 

Gota de escuro...corpo soletrado...sotaque de bosque que devora as sombras

 

Sou a voz que se separa do sangue...como uma gota de areia sentada numa flor seca

 

Visto-me com o tamanho das palavras...como uma viagem sem destino..dor e ventre

 

Enrolados numa enorme alma que tomba sobre os últimos raios de sol...

 

Vejo o sangue correr...escuto o medo a tombar para dentro de mim...como uma folha seca...

 

Lágrima de estrela viúva..alecrim criado num tempo leve e calado...aromático..

 

Cromática sombra de cedro despido...a imitar um viajante sem tecto...

 

Na secura da alma devorada...

 

Ergo-me...ergo-me como um presente desperdiçado...sei que os céus me protegem...

 

E não me importo com o que irá sobrar dos meus magros dias...

 

Sou o voo de pássaro sentado numa réstia de sonho...como um bicho que devora a solidão

 

Levanto os olhos e vejo cinco sóis...todos me esperam...

 

Escoando a sua luz no meu caminho...alumiando as minhas impurezas...

 

Como uma água feita de anjos que nasceram só para mim!

As pedras estão secas

As pedras estão secas das esperas em silêncio
A preguiça enrola-se na garganta
E os joelhos rezam à mentira
Instalada no alto da montanha.
As articulações perderam os ossos
E o nevoeiro cobre os olhares.
Os jovens...
Têm na memória a sensação da eternidade
A eternidade da juventude....
A eternidade entrançada nos dias risonhos.
Eu... desço a escarpa inclinada
Depois de espreitar o ninho da águia
E posso comportar-me como todos os outros
Posso ser mesquinho...dormir no chão cinzento..
Posso execrar segredos...
Posso viver de acordo com o meu humor
Posso gelar pensamentos
Enquanto o sangue corre quente na veias
Posso esconder o frio do olhar
Por detrás de um biombo fantasma.
Posso lavar a cara com areia do deserto do Sinai
Posso viver no Mar Morto
E posso simplesmente...ir correr pela praia...contigo.

Mato a minha fome de tragédia

Mato a minha fome de tragédia
Neste teatro em ruínas
Onde assisto a uma peça sem futuro.
A comicidade dos homens
Mostra que as profundas galerias da alma
Não passam de recantos vazios de si
Desesperadamente tentamos contrariar o destino
Enquanto ele sorridente ferra o canino na nossa jugular.
Então... pacientemente desprovidos de sangue
Etiquetamos o nosso cadáver para o seu prazer
Vestidos bizarramente com as melhores roupas

Insignificantes seguimos até ao desenlace final
Pesadamente descarregados do tempo feito
De relógios parados na nossa última hora.

E porque chegou a hora...

E porque chegou a hora...o olhar saboreia o grito dos aromas onde adormecemos

 

Talvez as minhas palavras se transformem em erráticos passos

 

E por entre o voo das águias se embriaguem luzes fulgurantes de transpiração

 

Talvez as distâncias se reclinem sobre os teus cabelos orvalhados

 

Talvez eu me transforme numa voz que empurra os barcos

 

Talvez escutes na ressaca do horizonte as palavras oriundas de outras terras

 

Talvez fôssemos mais doces nessas terras...

 

Onde a boca grita aos sóis...e as areias que nos entontecem junto às  gaivotas...

 

Se embrenhem nas ervas onde se  encerram fotos desfocadas

 

E tu ...despontes em mim...como uma ave que se desfaz num clarão de paixão!

O exército do desvario

Marcho no exército do desvario
Sou o paradigma do calvário.
Construí catedrais de efémeras imagens
E com palavras bestiais acovo o fim
Emboscado em máscara de fantoche.
Abomino com horror as assombrações mais esconsas.
Limpo a viscosa substância da miséria
Enojo -me com o vomitado palavroso
E personifico-me de repugnância.
Ergo um palco aos blasfemos e decadentes
Extermino as falsas maneiras cordiais
E apodo a escória de aristocracia.

Insarável pássaro de fogo...

8421325.jpg

A angústia endurece-me a pele ferida..pássaro feito de promessas vidradas

As serpentes atravessam a minha noite que perdeu a dimensão

E...do mais profundo de mim ergue-se um vazio esplendoroso

Língua de ave a devassar o canto eterno do meu corpo

Crina de frágil promessa que os ventos espalharam pela Ásia

Se pudesse...sulcaria as sombras e o entusiasmo da melancolia

Beberia pela tua língua o sossego das cidades

Mas...nada trago nas algibeiras onde se acolhe a faca que me marca os dias

Dos teus cabelos recordo apenas o marulhar das madrugadas...o medo das manhãs

A insónia que nos acordava...como uma língua devassa e provocante

Não tinha nome nem tristeza...bastava-nos a aflição das ilhas e dos veleiros

Bastava-nos a melodia que se espalhava pelas areias onde os gatos se acoitavam

Havia algo a pairar...um prelúdio de ansiedade...um despertar no coro das falésias

O medo amanhecia...o eco recordava-nos...que o assombro era um rio sem ambições

Mas...por muito que as palavras esfriassem..

Havia uma ferida dentro de cada recanto de nós.

Como se fosse um insarável pássaro de fogo...

 

As ideias são a realidade sonhada

As ideias... o destino...a realidade...

 

As ideias são a realidade sonhada

 

O destino é um pigmento aplicado sobre o nosso corpo

 

Pintando-nos de todas as cores...

 

Desde as mais berrantes às mais tristes.

 

O nosso destino é a realidade.

 

As ideias... o destino...a realidade...

 

Formam uma associação de coisas impalpáveis

 

Que se condensam na nossa história,

 

Como algo inanimado...como uma nódoa indelével.

 

Dentro do corpo, vivem as ideias,

 

Dentro das ideias, não há corpo

 

Mas na realidade temos um corpo cheio de irrealidade,

 

Corpo que é independente das ideias e do destino...

 

As ideias... o destino...a realidade...

 

Não têm silhuetas nem formas...

 

É o corpo que lhes dá o sentido...

 

E viverão até que o corpo se canse,

 

Depois...serão como vento absorvido pelo espaço

É doce o veneno que bebemos

É doce o veneno que bebemos num sonho feito de luz exótica

 

Como uma saudade deambulante.... uma luz grávida

 

Quimera de muros orgulhosos...infinito poço sem nome...

 

Profundo como um espasmo de amor...que executa a dança de uma Vida inteira...

 

Nascimento de rio num sonho que se expulsa..dolorido...

 

Impregnado de um perfume feito de giestas em flor...magra consolação...

 

Enrolada em mares feitos de pedras preciosas...cercadas por muralhas espessas...

 

Tornando-se tão pequeno que reservamos o nosso regresso assim que nascemos...

 

Barriga de sol e lua...pessoa elíptica curvada sobre um destino sem nome...

 

Como um quarto escuro aconchegado num Tempo que rivaliza connosco...

 

Que não nos acode...que nos expulsa..como um delírio sobre um caminho sem fim...

 

Jornada sem dono...mundo sem casa...

 

Luz que nasce inteira sobre um caminho condenado...

 

Desembaraço nocturno de dança africana...ancas e corpo num frenesim vazio...

 

Ancestral regresso a um tempo que conhecemos...dolorido e pantanoso..florido e seco...

 

Um tempo vivo...como um ventre de mulher crescendo na noite redonda....

Pág. 1/12