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folhasdeluar

Poesia e outras palavras.

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Poesia e outras palavras.

O sol assalta as searas

O sol assalta as searas

No ar espalha-se o aroma das giestas

As cigarras cantam hinos nessas horas de delícia

Quando o branco caiado das casas adquire os tons claros da aurora

O céu carrega-se de um azul-alentejo

E amaina a perdição dos dias

A vermelhidão do sol incendeia-me

Sou como estrela coberta de poemas

Escuto a campaniça

Na imensidão da planície há sentimento, vozes pacíficas, Cante

Reminiscências árabes

A vida voa baixo com as abetardas

Há um silêncio de cegonhas..um turbilhão luz

Há uma vertigem que ecoa na doce plumagem das vozes

Escuto os seus segredos junto às ribeiras

A luz desce para as águas

Essa luz gigantesca que se senta nas margens..e assombra os juncos

E há em mim um vidrar de garganta

Um emudecer de olhos pasmados pela poalha que cai...

Sobre o dia que finda.

 

 

 

E passam ventos..e transpiram velas...

Abro a gaveta e dentro dela o lenço lavado fala-me de lágrimas

Saio para a rua..e vejo depositados no passeio os anos vergados pelas pedras

E passam ventos..e transpiram velas...e o sal queima a quilha dos barcos

E chegam nevoeiros... e caem indeterminadas chuvas..e as crianças sentem as frieiras

A pouco e pouco aconchega-se às casas o som dos búzios

Passa por elas e é como se fosse uma lenda antiga alumiando a fantasia das marés

E o que fica é apenas uma rua..onde ciciam passos solitários...

Lutos de lumes outrora incandescentes...mensagens exaustas de carregar filhos ao colo

Digo para mim que a chuva é cega...que molha os seios enrugados das ladainhas

Que lava as palavras...mesmo aquelas que saem do vapor da boca

Sento-me..dormito junto a um bando de estorninhos..vergo-me ao momento solene

Aquele em que as avós bordam arabescos no enxoval das netas...

Românticas..velhas...obscuras personagens carregadas de fantasia

Vivendo intermináveis vidas de silêncio..despertas como tochas...

Indispensáveis....

 

Somos remadores a desafiar os rápidos da vida...

Somos remadores a desafiar os rápidos da vida...precisamos de treinar e de aprender a desafiar essas águas turbulentas...corremos riscos..tentamos antecipar os obstáculos...ajustamos o corpo e a alma às coisas que nos vão sucedendo...vamos construindo a nossa história todos os dias ...mas também vamos implodindo com todas as coisas que nos desgostam..temos sorte..temos azar...estamos dependentes de todos os improváveis..temos premonições..por vezes adivinhamos o que nos irá acontecer...mas o que nos torna humanos é a ilusão de que um dia iremos compreender tanto o passado como o futuro..ou mais ainda..talvez a própria vida....

 

Como ondas que chegam à praia

 

Como ondas que chegam à praia os nossos desejos são contínuos, os nossos quereres nunca acabam, é como se procurássemos um tesouro que está escondido algures no fundo da nossa alma...e vivemos na metáfora suprema da procura desse segredo..que está escondido na fonte incógnita do nada...e no entanto sabemos que dentro dos átomos que gravitam dentro de nós temos a resposta....morrer é apenas não ser...

 

 

Disseram-me que vinhas exausta..

 

Disseram-me que vinhas exausta..encolhida numa imobilidade granítica

Tinhas a pelagem dos alucinados...e alimentavas-te com o canto lento dos mares

Na mão trazias uma tempestade...na outra o sonho intocável dos loucos

Disseram-me que ouviram os teus passos a correr dentro de uma febre matinal

Que exalavas o perfume das margaridas...

E que deixavas um rasto transparente nas pedras rubras...

Como mapas de noites corroídas por palavras impossíveis

Disseram-me que o medo passava por ti...que o inverno se sentava ao teu colo

E que não havia sonho nem pérolas...nem mares encostados a ilhotas selvagens

Vinhas à procura de uma pátria tardia..feita de madeiras preciosas e frutos tropicais

Disseram-me que trazias prolongadas noites de consolação

E que do teu naufrágio ainda restava uma réstia... de fantasia...

 

 

Apenas uma pequena minoria de pessoas é útil ao mundo...

Apenas uma pequena minoria de pessoas é útil ao mundo...os restantes são apenas reprodutores que servem para ir aperfeiçoando a espécie, e, de vez em quando, lá dão à luz alguém que se distingue dos demais e vence a lei da morte...posso mesmo afirmar que aqueles que apenas vegetam lamúrias nada cá fazem depois de terminarem o seu papel reprodutivo...vegetar...vegetar...vegetar...quando deviria ser: criar...criar...criar!...cruel? Alienado? Talvez...mas realista...

 

Há em cada um de nós um lugar para onde queremos regressar

 

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Há em cada um de nós um lugar para onde queremos regressar

Há em cada um de nós um lugar inabitável...uma saudade de existir em algum lugar

Um lugar que nunca é o nosso lugar...e que por isso nunca o encontramos

Há em cada um de nós uma ponte...uma ânsia..um querer desvendar a nossa alma

Mas nós..que somos espiritualidade e corpo...perdidos nas cores dos tempos

Vogamos nesse arco-íris tão antigo como nós...

Sem sabermos que somos apenas fantasmas..