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folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

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A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

Descartes afirmou:" penso logo existo"

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Descartes afirmou:" penso logo existo"...eu não posso concordar com a frase...se eu estiver num deserto onde ninguém me veja... eu penso, mas...existo para quem? A nossa existência é percecionada pelos outros, se apenas uma pessoa habitasse a Terra, possivelmente nunca saberia da sua existência, uma vez que são os outros que nos transmitem sentimentos e é pelos outros... que temos sentimentos ..eu trocava a frase por :"faço logo existo"...

 

Dobra-se dentro de mim o cheiro dos dias

Dobra-se dentro de mim o cheiro dos dias em que dormias silenciosa

Deixaste os teus passos espalhados pelos recantos complexos do meu pensamento

O teu aroma era a vida...e nos olhos do chão...

Estava a cama onde desafogávamos as fragilidades do corpo

Ainda há um odor a vaguear pelas frinchas da casa

Ainda há uma caleira que pinga saudades de um tempo que não espera por nós

Na rua ainda sinto um rumor a falta de ti..como se o ar estivesse empestado pela tua ausência

E na fragilidade do espaço da minha memória...

O teu corpo adormecesse na flor que enfeitava a verdade que não existia

Sei...que em todo o lado estava o teu olhar

Sei...que as mais belas cores vagueavam pela tonalidade lenta das minhas mãos

Sei que estavas onde os meus braços estavam

E agora...visito a tua presença dentro de um caderno feito de espaços

Visito a tua vida nas lacunas brancas de onde nunca saíste

No futuro serei a incoerente memória de uma aventura sem limites

Serei a tese matemática da imperfeição de um tempo insalubre

Como se houvesse um desequilíbrio nas personagens que fomos

E que agora amontoamos ao canto do esquecimento

Como roupa despida por mãos invisíveis..e parcas...

 

Contemplo a intacta extensão da luz

Contemplo a intacta extensão da luz branca do néon

Escorro pela misteriosa porta onde o anoitecer me espera

No fundo de mim mora o segredo das horas vazias

No fundo de mim vive a chuva anestesiada pelo contínuo vaivém das paredes nuas

E há um escuro..um sonho...uma revelação que se ergue do anoitecer

Nuvens de estrelas pejam a madrugada...

Aderem aos corpos exaustos pela fuligem das marés

Buscam no ritmar dos dedos a seda da pele...chove nas saliências das portas de aço

Há um sonho de pessoas espessas a brincar na madrugada

Crianças anoitecem no escuro da avenidas...

A luz branca enche-lhes os dedos com sonhos

Mulheres brilham no embaciado dos olhos...as salas esvaziam-se...lentamente...

E no fundo dos copos...há um rasto de secura...

 

Iria contigo se me pedisses...

Por vezes aconchegam-se a mim

Memórias esculpidas em imagens que segredam outros risos

Memórias suspensas na revelação nocturna dos olhares

Peso e leveza misturam-se num bandeja cristalina

E dentro dessa bandeja habita o zénite ferido do esquecimento

Iria contigo se me pedisses...seria a eterna sombra das cidades onde habitas

Corpo suspenso...escuridão de papel...ferida imobilizada num desenho vivo

Carne incendiada por travessias de catástrofes...ternura muda...

Abandonada na esquina de uma pirâmide artificial

Sei onde guardas as feridas..sei que visões hostis se fixam na tua retina

Contemplo esse acordar para a procura de outro corpo...

De outros ossos fixos noutra pele... onde possas ser nua e terna...

Mas a luz embaciada pela névoa da solidão...levanta-se na penumbra dos umbrais

Ergue-se da mentira das ruas...como segredos intactos de um tempo de avalanches

Que te sustêm na existência sombria dos sentidos...

E que germinam em ti como a ambrósia do divino...

 

 

 

 

Escondi as horas

Escondi as horas dentro de um mundo que desconhecia

Percorri lábios e noites que depois abandonei na estrada carregada de castigos

Segui pelas ruas...caminhei de ponta a ponta pelas palavras que teimavam em calar-me

Mas não percebia que verdades habitavam por dentro das verdades

Que sombras se encolhiam num abraço que abarcava todos os crepúsculos

Que poemas se escondiam nos dias religiosamente passados a vaguear pelos teus lugares secretos

Apenas sei...que me vi... perante o absoluto pasmo dos céus...

 

E não chegaram a dar as mãos...

Tantos dias e tantos frios....aconchegados na lapela branda do cansaço

Tantas palavras ditas por acaso na mesa onde os lábios se perderam

Horas passadas a falar na inutilidade das coisas...a esquecer as coisas

Como se dizer olá fosse uma bofetada na face envergonhada da noite

Sorrir...e depois lentamente esconder-se por dentro dos olhos

Correr toda a tarde e toda a noite por cima das lágrimas que lá estavam...mas não se viam

Depois..era querer tudo como se fosse uma vingança...ou uma prece

Não há nada a fazer..todas as palavras se fecham por dentro dos minutos

Há um ferrolho a antecipar a noite..a dizer quero..a dizer não posso..a calar a alma

Como se fosse um castigo esparramado no chão inútil do desejo

As pessoas passam na nossa vida como se não fizessem ruído

Como se fossem pequenos pregos pontiagudos...alguns deixam uma marca deslavada

Mas entre perceber que havia um e havia outro..e que havia um dentro dos dois

E que os dois só ali estavam para ser um...passou um século..as luzes finaram-se...

E não chegaram a dar as mãos...

 

A filosofia de Hannah Arendt

 

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O Homem é aquilo que se esforça por atingir

 

É o amor e a amizade que tiram o Homem do isolamento do mundo

 

A cobiça não se quer a si própria, quer o mundo, e possuindo-o, quer ser ela própria o mundo.

 

O presente não é mais que o desejo do futuro

 

Como o actor depende do palco, dos outros actores e dos espectadores, todas as coisas vivas dependem de um mundo que aparece como o local da sua própria aparição, de outras criaturas e de espectadores que confirmem e reconheçam a sua existência.

 

Também nós somos aparências, em virtude de chegarmos e partirmos, de aparecermos e desaparecermos; e embora venhamos de parte nenhuma, chegamos para tomar parte no jogo do mundo.

 

Nota: uns pensamentos são inspirados em Hannah Arendt outros são textos retirados de livros seus.

 

Baú de memórias#4

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 Descobri no meu baú esta foto datada de 1950. A história desta fotografia é a de representar um tempo em que não existia a banalização da imagem. Anualmente realizava-se uma feira lá na terra, e nessa feira havia sempre um estúdio( barraca) onde se faziam fotografias, neste caso vemos o cavalinho para o menino que pôs o lacinho para a foto, e por detrás uma espécie de coluna romana desenhada num pano (torta), no chão podemos apreciar o lixo que serve para quebrar a monotonia da foto....

Esquadrinho a penumbra dos meus passos...

Esquadrinho a penumbra dos meus passos...

Vejo as marcas de alguém que pisou o meu passar

E por entre o infinito dos meus dedos...

Foscos xistos dizem-me coisas incapazes de pensar

Porque falam comigo as vozes das arestas?

Porque me fitam as paredes lisas..de cal

Onde está esse jardim da madrugada...

Em que perdi a minha imagem vertical?

À esparsa luz das teias invisíveis...cobrem-se gestos..despem-se máscaras

Os olhos brilham no fundo oculto dos sentidos

Tilintam ambições na voz quebrada dos poetas

Descem suores de sol pela pele dos poetas

E o mundo ri-se das flores...desertas

Que crescem nos atalhos brancos do pensamento

Onde o lápis é o cajado das palavras

Que podem florescer numa jarra de papel

Dentro de um difuso espelho vejo espraiar mares

Que acordam agora a minha voz...

Imolada numa rua de cordel...

 

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