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folhasdeluar

Poesia e outras palavras.

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Poesia e outras palavras.

Dentro do tempo

E dentro do tempo há um abismo

Dentro das mãos um sol de horas

Intrínseco timbre de flauta apologética

A desprender-se dos estames das miragens

Como confluências de distâncias...sem paragens

Nem tempos de infâncias..nem demoras...

 

Homens-sonho...homens-digitais

De um céu antigo desce a nostalgia dos olhos

Desponto na espessura cálida do nordeste

E vejo homens-estalactites pendurados nas abóbadas lascivas das palavras

E vejo homens assombrados pela beleza escura dos desertos

Homens-sonho...homens-digitais

Homens que procuram berços no canto dos pássaros perdidos

As luzes assombram o delírio das mansardas

Homens-espectro dançam nos recantos dos beirais...

Com olhos líquidos derramando-se pelos glaciares das ruas

E há uma tosse a aliciar as tardes...

Há gotas de água a escorrer pelas costas das árvores

E um homem-teia ondula no silêncio inócuo dos corredores

Como tonitruantes castas de assombro...como húmidos voos de águias

Como despovoados alicerces sem eira nem beira

Assim andam..descalços..pelas paredes das casas

A colher amanhãs...os homens-deuses...

 

 

 

O espanto da luz caminha sem fim

 

O espanto da luz caminha sem fim

Memórias clandestinas acordam dentro do sono

A noite desce pela sombra dos arranha-céus

E na minúscula aurora o cansaço torna-se orvalho

 

O fogo desliza pelas vontades

As mãos seguram dores ignoradas

Há silêncio nas verdades

Há memórias nas claridades

Há pirâmides que nos salvam

Das retilíneas fontes onde cantam as saudades

Das diluídas mortes que nos embalam

Vestindo as dores que por ali passavam

 

A tolerância

Com os anos a vida ajuda-nos a perceber o que é que realmente é importante, e a tolerância é uma delas

A cada dia que passa sinto-me uma pessoa mais tolerante....comigo mesmo!

Agora já tolero não aturar quem não gosto só porque tem que ser, agora pura e simplesmente...não aturo! Agora já tolero não me importar com a opinião dos outros, pura e simplesmente... não quero saber! Agora já tolero chatear-me com pessoas que deitam papéis no chão, normalmente digo-lhes que deixaram cair um papel, que talvez lhes faça falta. Agora já tolero irritar-me com a falta de educação que é entrar num local qualquer, dizer bom-dia e o funcionário não responder. Agora já tolero aborrecer-me com os atrasos de alguém com quem combinei um encontro a determinada hora. Agora não tenho dúvidas, sou uma pessoa que se...tolera a si própria.

 

E o dia vem...

 

E o dia vem...os olhos calam

Rugosas mãos vendem vidas no mistério das pedras

O mundo sabe a intimidade...a chá...a calor

Cúmplices pássaros voam... heliocêntricos

Traçando luzes de mistério e sono

Os pássaros falam do mar que se derrete na areia

Falam de lágrimas esquecidas nos bules chineses

Falam das réstias de domingo

De esponjas subaquáticas...de odores divinos

Dizem que na crueza lenta da respiração...

Vive a suspensão estática do sangue...subindo a colina claustrofóbica da alma

Afogueado sangue...repuxo de pranto...líquido desassossego

E o corpo nú... a veia acesa..a sombra que sangra dentro da luz

Castiçal impuro...flor de apego...à pele..

Ao medo...

 

 

Atravesso o amargo sabor dos séculos

 

Atravesso o amargo sabor dos séculos

Atravesso o tempo como se flutuasse numa seiva gratuita

Agarro o coração..meço a distância...

E salto através das letras que confluem para o meu inóspito medo

Embrenho-me em palavras..e através da contaminação dos ecos

Assombro as línguas estupefactas...copio o sabor acre dos sítios que esqueci

Guardo os sonhos em crateras lunares...

Sou a incoerente face do fogo..sou a morada das coisas que não farei

Recito versos...atravesso pontes inacabadas...consolo-me com o que não sei

Experimento palavras que repousam por aí

Palavras de todas as cores...verdes..podres...enfastiadas

E vêm ecos erguendo distâncias...e vêm salvas de irídio branco...

Atómicas salvas flutuando no espaço dos dedos

E vêm flechas...e atónitos pontos cardeais...

E dos confins dos olhos saem versos desmedidos

E o silêncio crepita...a mão ergue o facho...a chuva cresce

As páginas quebram-se de encontro aos palcos das tragédias

E já não há páginas...já não há gaivotas a debicar o tempo

Já não há espaços em branco...

Dentro de mim.

 

Que farei...

 

Vivo como um solstício indestrutível

Como um silêncio aberto nas fendas da vida

Como uma pele cansada que crepita num corpo de noite incauta

Que farei dos meus sonos se um rio se interpuser entre nós

Que farei da oscilação metálica da minha alma...

Se uma corda me atar aos espinhos

Sei que um dia..passarei pela boca lívida dos precipícios

Sei que um dia..subirei a essa cratera onde incubam beijos e pássaros

Respiro..ausento o olhar....penso ...

E se os passeios se esvaziarem de pessoas

E se os risos se esconderem em catacumbas de infinito

E se os leitos dos rios estreitarem na foz aguda das algas

Que farei? que farei?

Que farei quando formos contágios de cabelos e braços entrelaçados

Quando agudas plumas nos enfeitarem as marés

Quando o sisal erótico for tecido por lábios de seda

Que farei...quando os alfanjes cortarem o apocalipse

Quando as palavras se estenderem pelo estrangulamento das esquinas

Quando um voz for um simples acenar

Quando um cansaço for um exótico plural de sentimentos

E quando os astros se despedaçarem em folhas de névoa cristalina

Que farei...quando as flores se fecharem ao calor dos beijos

Quando a terra celebrar a secura das faldas

Quando a alma surgir dentro de uma aurora vitoriosa

Que farei...quando fechar a porta...

E partir...

 

Obrigado Stefan Zweig

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Neste livro Stefan Zweig, faz-nos recordar o orgulho de sermos portugueses. A forma magistral como descreve a viagem de circum-navegação de Magalhães, é um hino à coragem de um português,(ainda que ao serviço de Carlos V de Espanha), porque D. Manuel de Portugal recusou financiar o seu empreendimento . Neste livro Zweig não nos esquece, pelo contrário, enaltece-nos e salienta o enorme orgulho de um pequeno país, que dominou metade do mundo...Portugal. Num tempo em que os idealismos são letra morta, e em que sobreviver é a alma do dia-a-dia, este livro recorda-nos essa lição de força e coragem, que os navegadores portugueses tiveram para descobrir os mares desconhecidos, e que faz parecer as nossas contrariedades diárias, pequenas birras de crianças que ainda não sabem o que é a vida.

Para mim o mais curioso é que nesta biografia Stefan Zweig, nem por um momento me faz recordar os espanhóis,(embora a maior parte da tripulação das 5 naus fosse espanhola),ele salienta sempre o saber dos portugueses. Um livro a não perder...Obrigado(póstumo) a esse enorme escritor austríaco, Stefan Zweig.

 

O Cosmos, a vida e a morte

Só existe uma coisa sem princípio nem fim, que é o Cosmos...no Cosmos não há tempo, nem há nada que nos possa dizer que o tempo anda para a frente ou para trás, o Cosmos é a alma do Universo, é tal qual como na nossa alma onde não há tempo nem espaço, tão depressa recordamos a infância como viajamos até aos mais recônditos cantos do planeta, tão depressa estamos a olhar o céu como somos espectadores atentos de nós, mas há uma coisa que nos é impossível, tal como o Cosmos não vive, apenas está ali...também a nossa morte não vive em nós, mas está ali...assim a morte não faz parte da vida, é apenas parte do fim da vida, a morte é a espectadora de todas as coisas que fazemos, e estamos sempre tão perto dela, que se nos lembrássemos disso, a vida seria de facto um paraíso que segue sempre ao encontro inevitável da... morte.