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folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

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A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

Pássaros

Em todos os dias há uma partida...

A luz...os sons...os pássaros que voam sem saberem que são pássaros

E por isso voam... dentro de nós

Voam contra a impotência da luz

Voam contra a sua mágoa de serem pássaros

E gritam...como se fossem séculos solitários

Há uma terrível imprevisibilidade no voo dos pássaros

Há uma solidez de tempo e medo

Do fundo do seu voo escorrem reinos de beleza e frio

Incógnitos desejos...que queimam a sua leveza de pássaros

Há noite...os pássaros arrumam-se nos ramos das árvores

De manhã ...são os despertadores do silêncio

São como corredores perdidos dos nossos olhos carentes

Os pássaros deslizam por nós como se fossem dúvidas voadoras

Ou choros de crianças em ascensão

Os pássaros são os nossos recantos...de alegria...

E voam...

 

 

A colonização do Limpopo ou o exemplo dos jovens de Cabrum

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 (Cabrum, Viseu - foto tirada da net)

Pior que ouvir falar em desertificação do nosso interior é ver que nada se faz para o voltar a povoar. Em Portugal,(ainda eu não era nascido), procedeu-se à colonização do Limpopo em Moçambique. Este texto não pretende salientar o que foi feito de mal, porque as terras atribuídas aos brancos foram tiradas à força aos nativos negros, mas podemos extrair dessa experiência formas positivas  de voltar a repovoar o nosso interior, ou seja, de  colonizar esse interior tão depauperado de pessoas e bens. Mas o que é que foi feito no Limpopo? Lá foram atribuídas casas e terras gratuitas aos colonos assim como sementes,animais, alfaias agricolas, escolas, médicos, veterinários, etc..enfim tudo o que era preciso para que as pessoas se fixassem. Ora é isto que é preciso ser feito em Portugal para repovoar as aldeias abandonadas, dar todas estas condições a quem quiser fixar-se no interior e viver do campo e no campo.Já temos alguns exemplos em Portugal como o da comunidade de Cabrum, Viseu, que tomou a seu cargo a reconstrução das casas abandonadas e repovoaram esta aldeia ...e sem qualquer tipo de apoio.

 

Nadas

Nada mais possuo..senão o mar e o rugido do meu nascimento

 

Em cada rosto um olhar..uma suave adaga que corta o azul do céu..

 

Um riso distende-se pela sola do mar...assiste ao açoite das ondas...

Funde-se com o címbalo das marés

 

Nuvens negras assomam aos meus passos distraídos

O cair da noite encoraja o abrandar das aves

E o medo tomba na distância incontida do silêncio

 

Doem-me as noites que habitam na distância ilíquida do crepúsculo

Como sombras lisas...tumulares..onde o pensamento se deita...nu.

 

Há dentro de mim um lugar inerte

Onde guardo um fogo que não posso deitar fora

 

 

No arquivo do tempo apenas existe a continuidade transparente dos dias

E os filhos continuam chorar a morte dos pais...como se o mundo nunca tivesse existido

 

Há uma ordem interior que regula os meus passos

Como se caminhasse sobre os meus próprios pensamentos.

 

Os dias desabam na euforia do nada

Como prantos secos que rolam pela palma da minha mão...esvaziada...

 

Espaço

Ocupo o espaço onde as coisas me fogem das mãos

Um espaço interdito...compulsivo...descrente da alma...caindo no nada

Um espaço...um lugar onde as palavras não importam...

E onde resgato a sujidade dos dias

Dias guardados num espelho que conserva em si todas as imagens do mundo

Como se me encontrasse na ausência da minha própria história

Como se estivesse dentro da pungência do vento

Que ecoa na palidez esférica do sol

Como um mar que se abre à claridade que eclode na espuma insatisfeita das marés

E que se suspende numa bola de cristal...

Deserta de brilhos...

 

E nós...

E nós...quente vapor a condensar-se num véu de sonhos impossíveis...

Soerguemos a fronte..envolvemos a vida no cântico suave da noite

E prolongamos o nosso corpo...no tempo fibroso das tempestades

Como um sábado sem idade..

Como uma neblina que descansa no parapeito da nossa janela

Como um desafio de gávea dentro do temporal da memória

Onde interrogamos a seiva obscura da dissidência que vive...em nós...

 

 

O vento dos dias

 

O vento dos dias trás-me o equinócio dos teus passos

Vim porque vieste...suspendi o meu olhar porque as águas cresceram

No fim das distantes galáxias...os olhos da mágoa pestanejam luzes tentaculares

Será sempre assim a despedida..as horas a afastarem-se de nós

Como fosforescências inacabadas da divisão das estrelas

As mãos dissipavam-se pela vegetação rasteira da tarde

A vida desencontrava-se de nós...a distância revelava-se uma enorme voz entumescida

Um frémito percorreu o mar...o teu rosto flutuava numa preciosa fonte de imagens frias

Na sonolência das pedras..o esquecimento era um ocaso calcinado pela tua ausência

Foi no tempo de ouvir o eco dos pássaros..foi no tempo de uma praia indulgente

Que ocultámos os corpos..ocultámos as mãos...os sinos falavam da descida do dia

E na serenidade do teu retrato..eu via...a calcinação de mim...

 

 

 

O que levamos desta vida?

Demasiadas vezes escuto as pessoas a dizer que o que se leva desta vida é o que se come, bebe e diverte. Percebo a ideia por detrás das palavras, mas toda a gente sabe que desta vida não levamos nada, ou por outra, levamos, mas o que levamos não é o que comemos bebemos e por aí fora, o que levamos...é o que deixamos, é o que construímos, o que escrevemos, pintámos..enfim tudo aquilo que criámos, isso é a nossa essência, é a nossa alma, é a nossa criação. É uma parte de tudo aquilo que fomos e que parte connosco, mas fica com os outros, para sempre? Claro que não...não há para sempre, há apenas um lugar em cada momento que se demora algum tempo por cá, até desaparecer na voragem da memória.

 

Na inconsciência de setembro

Na inconsciência de setembro sei que nenhum reflexo de mim se descobrirá

Sei que a sombra transparente da madrugada surgirá em todos os lugares

E enquanto tudo isso acontece....

Há um pássaro que poisa no lugar onde a felicidade se acoita

E que na solidão prateada dos campos há pulverizações de cidades incontidas

Chega até mim o aroma soprado pelo claustro dos pinheiros

A tarde confunde-se com a emoção de saber que a noite trás o passaporte para o silêncio

Eu que não sei nada de silêncios nem de sonhos escondidos na névoa

Eu que amiudadas vezes me conduzo como se fosse uma lenda descolorida

Eu que me expando de espanto em espanto pelas avenidas gastas das emoções

E que nos vãos das escadas arrumo os meus crepúsculos...

Enfastiados de países que desconheço..de pessoas que não visito

De inesperadas formas de sentir...que não estou aqui...