Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

folhasdeluar

Uma coisa é uma explicabilidade inexplicável...Hugo von Hofmannsthal

folhasdeluar

Uma coisa é uma explicabilidade inexplicável...Hugo von Hofmannsthal

Aquele que foi e já não é

 

Aquele que foi e já não é

Aquele que se disfarçou de riso e de comédia

Aquele que se acendeu nos olhos das aves

Não passa agora de um braço triste onde desponta um dedo

Que aponta as saliências do futuro.

 

Aquele que num delírio de fogo escreveu poemas

Aquele que se confundiu com as sombras da floresta

Aquele que se extraviou por dentro da febre de ser apenas ele

É hoje uma transparência de perfume e vento

A acenar à neve que se solta das artérias do ar.

 

Aquele que roubou a cores e permaneceu por dentro dos instantes

Aquele que avançou pelos dias com a leveza de um astro insaciado

Aquele que flutuou na etérea fímbria da realidade

Agora só espera que uma aguda noite o transporte

Para dentro de uma folha que voga na brisa leve dos limoeiros.

 

Será delírio ou existe mesmo um lugar onde eu possa renascer?

 

Horas de incerteza...incríveis rios...profundos horizontes

Na profundidade das luzes derrama-se o cálice do mar

Há nos dias cinzentos um enorme delírio de olhos perseguindo a sombra dos ciprestes

Há nesses dias uma profundidade escondida nos minutos que se desdobram pela secura das tardes

Fecho os olhos...vejo incríveis lugares onde repousa a serenidade muda dos prados

E é lá que amanhece...é lá que tu me esperas nesse lugar onde crepita a mansidão do mar

Será delírio ou existe mesmo um lugar onde eu possa renascer?

Será delírio ou existe mesmo esse lugar onde a alma se transforma em ave solta no bravio do céu?

Hoje lembrei-me dos dias em que os teus cabelos se deitavam nas concavidades da areia

Desses dias onde a chuva descansava na tua boca...e na minha...

Dias onde se fundia a nossa vontade de sermos ar e sangue mineral

De nos perpetuarmos na febre que amanhecia junto a nós...

Como um aroma de alfazema que se extraviou e agora se agarra desesperadamente ao nosso corpo

Mas já nada existe...já não sentimos a fome de nós a devassar-nos o corpo

Nem sentimos a sede de um sono a deslizar pelos nossos dias

O luar esvaziou-se de nós...a chuva perdeu-se na profundidade dos mares

Somos agora um mineral...completamente solto a escorrer pelas encostas escarpadas da saudade

Ou um caule partido...que voga no calor de um corpo arrefecido...