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folhasdeluar

Uma coisa é uma explicabilidade inexplicável...Hugo von Hofmannsthal

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Uma coisa é uma explicabilidade inexplicável...Hugo von Hofmannsthal

Catedral de espelhos

Nesta cidade onde os passos são ruas e os sonhos são pedras

Coloco cautelosamente a alma sobre insondáveis relógios

Perscruto o tempo em cada espiral feita de instantes indefinidos

 

Não basta implorar à boca anónima do vento

Para que o sono se pareça com o lado impossível da noite.

 

É preciso que a indiferença não cresça na boca desta cidade

É preciso transformar os resto amargos das pessoas em algo soalheiro

E depois...se nos erguermos pedra sobre pedra como numa catedral de espelhos

Veremos o sorriso de um tempo verdadeiro a assomar por cima da nossa pele

Seremos a árvore plantada na beira de cada vida

A sombra aconchegante de um livro sem sentido

Seremos um país erguido numa epiderme sem face nem textura

Uma palavra...um pé...um apócrifo desmando do destino...

Frio...

Quem voa por dentro da sombra lenta de um pássaro

Sabe que o medo é uma ideia de fim sem começo.

 

Aos olhos da vida todas as coisas se reduzem a cinzas

Aos meus olhos todas as coisas reluzem num bailado de estrelas.

 

E se repito muitas vezes este sussurrar de luzes

É porque na minha boca cantam pássaros esfaimados.

 

Há um frio severo em cada flor

Há um eco de mundo a reluzir nas paisagens

E há um caminho percorrível pousado em cada nuvem....

Sibilino...

E aqui estamos...

Como serenos corpos a cavalgar a desenfreada busca dos dias

Ou como facas que buscam a carne imprópria para viver...

 

Oculto os meus olhos nas dobras de um sol de incenso

Nas minhas mãos crescem almas e flores de terra

Nas minha mãos floresce a negação da minha estéril passagem

Porque à geometria da noite me afeiçoei

E no claro sopro do vento me despi

Como um esteta que renega a sibilina face da morte.

 

A falta de tempo...

Olhamos para o tempo não como algo de que podemos usufruir, mas como um “coisa”, assim, perdemos tempo, gastamos tempo, desperdiçamos tempo, ganhamos tempo,no entanto o tempo não existe como coisa palpável, então como é que nos afastámos do verdadeiro tempo? Como é que nos deixámos escravizar pelo tempo? Isso aconteceu porque se criou a ilusão de que temos que trabalhar sempre mais, produzir sempre mais, ter sempre mais, ainda que nos falte o que não custa dinheiro....o tempo.

 

 

 

A poesia

A poesia é um mundo tão grande como os poetas que o habitam. Há tantos mundos dentro da poesia que ela a ser uma lacónica inexpressão da Vida. Ou talvez a Vida seja a lacónica expressão da poesia feita com a inexpressão dos dias...

Instintos...

Cruzámos esquinas como pontes descuidadas

Percebemos que a vida era mesmo ali...

No cimo daquele plátano...encostado àquele céu de cobre.

 

E tudo isto nos cansa...

A petrificação das ruas...a voz rouca das águas

O agitar dos instintos....a fome circunscrita dos dementes

Que gritam com voz de musgo e nada...

 

Levanta-te meu fim e minha sombra

Ergue-te minha paisagem de nevoeiro

Mostra-me a tua ovalada face

Mostra-em a chave da porta que não abre...

 

Diria que para além de mim uma flor azul se levanta

Que uma árvore canta na secreta pele da tarde

Mas só eu a oiço...só eu ...e toda a fantasia do vento.

Peregrino...

Nesta encruzilhada de pedras e chuva

Neste cruzar de braços e rasurar silêncios

Vem o mim o cheiro a terra e sombras

Vem a mim a dança do nevoeiro

Vem a mim a carne do destino

Vem a mim a lama e o lume

Peregrino...

 

 

Nada do que imagino é como imagino

Nada do que calo é como o que não calo

Tudo está no cósmico coração do mundo

E nada é...mais que um reflexo da imaginação

Nada é mais que um tudo...

 

 

Estranha pose de homem pousado no céu

Estranho desespero a decifrar cinzas

A voz dos pássaros ecoa na imaginação

A voz das sombras perfuma os olhos do mistério

E nós?

De dedos floridos...

Cobrimos a nossa nudez com paisagens inventadas...

 

Calado procuro o peso do mar profundo

Charco de sol a queimar as horas

Calado desço aos labirintos perdidos

E agarro nos olhos dos pássaros para ver o mundo...

 

 

 

 

 

 

 

E nós...

Neste tempo de suor pousado na testa das estradas

Neste caminhar suado pelos restos de um céu sem tempo

Vagos mistérios erguem-se nas sombras

O tempo arde numa pira de desesperos

A terra permanece para além dos ouvidos dos astros

A Via-Láctea percorre o nosso corpo encrespado

E nós...a viver como se percorrêssemos as algemas do mundo

Sabendo que a nossa imaginação

É um pingo de cinza no interior das casas

Que um dia o vento levará....

Musgo....

Tirei de mim todas as ruas da cidade

Fitei o vazio do cais e a seguir...

Imaginei-me a esculpir uma trança de estrelas

Com bocados de pássaros azuis...

 

Imagino um destino encostado ao umbral do meu silêncio

Imagino um rasto de noite a enfeitar o vazio dos sonhos

E depois...nada...mais nada...mais nada...

Ah! Mas antes disso...

Carreguei a noite com pétalas de pele arrancada aos espelhos...

 

Eu sei que habito o voo amargo das borboletas

Eu sei que me enfeito com nuvens de pedras acesas

Todas as noites desapareço na fenda das estrelas

Enquanto o luar se esmaga num ritual de garras afiadas

E eu perco o equilíbrio que se agarra ao lajedo da minha alma...

 

Neste longo este escorregar pela febre dos pinheiros

Pairar no sono...brilhar no encanto da noite sem retorno

Cheirar o chão e de súbito...

Despedir-me das folhas amareladas dos castanheiros....

 

Enfeitar as ruas com mundos sem sentido

Ter nas mãos o sangue do destino

Olhar a morte como quem vem ao mundo

Como o eco de uma floresta alheia a quem passa...

E pintar com musgo...o meu olhar...de menino...