O riso brando das aves.
Espreito a rua por entre uma nesga de tempo. Descubro na imperfeição melancólica da tarde...uma face nua. Uma minuciosa poeira atravessada pelos raios de uma luz indistinta. Baça. Uma paz de espelho desbotado. E tive a sensação de sentir um rangido de alma. Uma força de estrada esburacada. E senti...que me basta uma linha recta e todo o espanto do mundo. Basta-me uma rua deserta e uma álea de plátanos. Basta-me a força extraordinária das marés. Para que tudo seja a vela. A gávea. A porta de vidro. Por onde eu desapareço vestido como uma nuvem de gás e alma.
Olho a folhagem. Agarro-me a cada árvore como um naufrago. Por cima...uma solitária nuvem. Imóvel... num céu tecido em rendados de laranja e rosa. Mais além a baforada silenciosa de um sol calmo. E o lugar onde estou já é outro. Percorro esse momento vazio com um olhar de velho fascinado. Eu já sou outro. Sou agora a persistência céptica do dia. A aguardar o riso brando das aves.