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folhasdeluar

Poesia e outras palavras.

folhasdeluar

Poesia e outras palavras.

Já não sei falar!

Por mais que pense em enfeitar a noite

Por mais que queira tocar o nada

Descubro sempre um geométrico vazio

De uma vaga lágrima a fingir de flor.

 

E sinto na pele uma confusão de chamas

E sinto na vertigem um letal equilíbrio

As pedras são feitas de absurda seda

O meu corpo é uma frase..uma ideia...um sonho

Um irreal encontro com um irreal suspiro.

 

Com garras de sol agarrei o dia

Mecânicos desejos a vogar no espaço

Majestoso enigma de fulminante verdade

Já não há crepúsculo

Já não há relógio

Onde possa pendurar o estampido...

Da realidade.

 

Ao longe passa uma densa barca

As luzes acendem-se...os meus olhos calam-se

Escuto o respirar do mar

Escuto a sua indistinta fala

E eu já não falo

Porque eu...

Já não sei falar!

Manhã de ouro

Na manhã de ouro um castiçal de volúpia acorda as horas

Cada raio de sol é um veio sagrado

Cada nascimento é um reino

E a primeira palavra é um grito

Depois...há que percorrer as florestas

Calcar os montes

Não deixar que os olhos apodreçam

Em cada margem há um desejo

Em cada dia um seio dolorido

As rupturas da nossa vida são sequiosas serpentes

São grandes rios de reflecção

São a primeira margem de um novo porto.

 

Podemos precipitar-nos em desejos

Podemos abocanhar os grandes rios

E podemos ser o raio de luz que se despenha no lodo

Tudo é nascimento e feitiço

Tudo são palavras que nada dizem

E todas as coisas são desígnios que nos despedaçam e curvam...

As costas!

Raio de sol...

Procuro o meu raio de sol. Mas não sou eu. É esta minha cavernícola imaginação. No lugar da escuridão...gritei um nome. E não me arrependi. Juntei uma tarde a outra. Acreditei na infame glória. E caiu sobre mim toda a solidão do mundo. Pisei a terra. Abri-me à comoção das coisas. Quando voltei a olhar já não vi princípio...nem o fim. Vi apenas o desaguar progressivo de tudo o que morria em mim. Não é fácil desatar os nós de sangue. Nem descobrir as distâncias de gelo. A ilusão tem as suas dores. O deserto tem os seus desmaios. E um dia somos a caricatura de um deus sem sonhos. Temos o nome gravado em bocas que nos chamam. E também o temos em passados esquecidos. Tudo em nós é um acumular de mundos. Num instante somos discípulos. Noutro somos mestres...de nada. Estéreis são os nossos limites. E damos connosco a revirar os olhos à única verdade que conhecemos. Que o que espera por nós é a dissipação no vazio. Mas temos esperança. Não queremos acreditar que somos a vertigem do espaço. E cavamos os dias como quem carboniza o infinito.

Fingimentos...

Cavamos abismos. Construímos fortificações e carapaças. E às vezes nem sabemos o que guardamos dentro de nós. É longo o nosso túnel. Sabemos que a eternidade queima. E o peso do mar exerce um longo impacto na nossa banalidade. Mas não sabemos em que árvore genealógica nos penduramos. E também não sabemos como acumulamos tantas formas de sentir. Há frases fáceis. É fácil dizer que a profundidade da vida se vê na lucidez da espuma. E que sentimos que levitamos numa transparência de esplendores. É fácil dizer que a nossa força e a nossa beleza residem na busca que fazemos a furtivos sentimentos. Onde até o choro pode ser um desmantelar de sofrimentos ou um farol de prata.

 

Quero acreditar na impossibilidade da grandeza do Homem. Quero acreditar em minúsculas formas de sentir. E até digo que a totalidade de cada um de nós é um retrato que  irá desabar. Nada de nós sobrará...a não ser a nossa vertiginosa ausência. O nosso cansaço é uma imensa lombada de um livro onde todos os títulos cabem. E porque nos atrevemos a não aceitar o nosso intenso e impossível adormecer. Vestimo-nos a rigor...como quem não quer desaparecer. Sabendo ao mesmo tempo que somos o estrondo. A glória. A luz... que desperta para o fingimento de viver.

As cores passam

O sol afoga-se num rio sem nome

As árvores são âncoras e artérias

Pelo ventre da terra escorrem flores de sangue

As estátuas suspendem o olhar

O crime perfeito acontece...

A música rebenta numa noite sem horizonte

As pessoas passam...renascem a cada passada

Rasgam perdões...irrisórios perdões

Aquáticas almas mergulham em pueris liberdades

E eu...ergo-me num quarto forrado a lâminas

Suspenso...febril...afogado numa coalhada penumbra...

 

As cores passam

Agitam-se em floridas longitudes

Iluminam lodos...afogam-se em pessoas sem nome

E as flores...continuam a florir

Inundando as almas...com desprendida beleza...

 

 

 

Atrevimento...

Atrevo-me a desmistificar a verdade. Atrevo-me a quebrar a germinação dos silêncios. Flutuo entre a chama de uma vela e um solitário nevoeiro. Tenho contra mim a minha falta de vontade. A minha falta de paciência é a óbvia resposta à inútil pergunta. Um entrançado de gelo e incenso percorre-me o corpo. Leitosas pontes esperam por mim. Acompanhadas por imensuráveis ressacas de corpos esquecidos. Aprendi a enlouquecer...devagarinho. Como quem procura uma cura para a desistência. Ou... como quem procura a profundidade das coisas. Quero ir sempre mais além. Rasgar os factos. Descalçar os sarcasmos. Terei mesmo que me refugiar numa escuridão? Ou descobrirei a secreta ambição dos mortos? Os momentos fundem-se em perguntas contagiosas. A vergonha crucifica-nos. Abaixo a vergonha. Viva a glória de desobedecer. É tempo de correr e de carregar a chama. É tempo de erguer a aflição...e de carregar as baterias da Vida.

 

Portas fechadas.

Sim! Aquele és tu. De peito aberto e olhar triunfante. A percorrer os caminhos da vida como quem toca todas as escalas de uma harpa. Sim! Aquele és tu. A procurar o mistério das coisas. A enfrentar os desafios do vento como quem sobe uma elástica rampa em direcção a um universal horizonte. Sim! Aquele diagrama és tu. A cair por uma raiva vertical como quem começa o dia. Um incêndio ergue-se em ti. Fechas as mãos. Agarras nas tuas fronteiras. Só para perceber qual a imagem de uns olhos raiados de sangue. Não procures justificação para o nada. Vive...numa inocência esotérica. A tua fragilidade é um aperto de coração nublado. É um medo de viver numa alma fechada. É um pensamento. Um olhar iluminado. E também é a frescura da terra molhada a acumular-se na tua pele irremediavelmente...enrugada!

 

Não esperes que o tempo passe. Não queiras estar no centro do mundo. O fluir do tempo é apenas passado. E as certezas divinas são folhas caídas em ruas sem graça. Promete todos os dias um riso a quem passa. As guerras diárias são bustos nervosos. São silêncios retraçados de ira. São magros agasalhos. E são ridículas portas...fechadas.

 

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