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folhasdeluar

Poesia e outras palavras.

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Poesia e outras palavras.

A geometria dos silêncios.

As mesmas ruas. Os mesmos passos. Espectros espelhados nas pregas do tempo. O mesmo passado. O mesmo futuro. As mesmas faces. A mesma ignorância. A impressão de um desencontro. A vida. A tarde é um espelho. Os dias são espelhos. A íntima relação do homem com a ardência dos cadafalsos. A subordinação a patológicas saídas. Portas sem entradas. As folhas do sono a pedirem mais paz. Os instantes a pedirem mais luz. E a folhagem das sombras a aumentar em nós. A mostrar a nossa breve alma de funâmbulos . A nossa alteridade. A nossa aceitação. O nosso acumular de acasos. E de ocasos.

 

A geada enreda-se na manhã de domingo. O frio corta o germinar das ervas. O vento quebra a inútil brusquidão dos dias assolapados. E nós...interrogamos o fumo que oscila pela chaminé. Com olhos de amanhã. Com a profundidade de um ângulo raso. Feito com a pálida geometria dos silêncios.

Um dia disse-te que eras um labirinto

Um dia disse-te que eras um labirinto

Onde cabia todo o vento que do meu coração soprava

E que antes de te conhecer eu era assim como uma nudez sem pele nem ossatura

Um dia disse-te para vestires a minha pele de mar e navegares por dentro dos meus dias

Obedeceste...

E os teus olhos brilhavam como duas explosões de sal a rolar pelas minhas falésias

Juntei a mãos e agarrei em todas as coisas impossíveis que a tua saliva desenhava

Vi tantas coisas em ti que me esqueci de colher os pedaços que sobravam dos nossos corpos

Disseste que eu era o Universo a entoar uma melodia de caos e silêncio

E que nas dobras da nossa rotina

Os peixes no aquário falavam das coisas insanas que nos viam fazer

Mas iremos longe... seremos o meteorito que aterra na janela da nossa lua

Seremos os arquitectos de um big bang sem fim nem chegada

As nossas unhas cravar-se-ão nas costas dos desertos

As flores contarão as nossas histórias que imitam a irrealidade dos dias

E também  seremos a matemática das nuvens...

Afogueadas pela maresia que voa pelos nossos cabelos soltos

Andaremos nus...com o corpo feito de um pôr-do-sol explosivo

E voaremos com as asas de um anjo aceso pela claridade dos nossos beijos.

 

As origens da ganância...

O homem quer juntar sem fim e sem medida.” Sólon – 640 a.C – 558 a.C.

 

No início era a troca. Não existia o dinheiro. Quando um povo tinha demasiado e outro tinha falta, transmitia-se mutuamente o supérfluo através da troca. Esta forma de comerciar não tinha em vista o objectivo do lucro. Era uma forma engenhosa dos povos suprirem as suas necessidades.

 

Ora naquele tempo não era cómodo transportar mercadorias em longas distâncias sem se ter a certeza de encontrar os produtos que se desejavam e também sem se saber se os outros tinham necessidade dos produtos que se transportavam. Inventou-se então o dinheiro. Este era mais fácil de transportar e mais manejável. Criaram-se então as moedas em ferro ou em ouro. Concordou-se que cada moeda tinha um valor. Valor que era atribuído pelo seu peso e pelo seu volume. Para não se estar sempre a pesar o dinheiro, este foi marcado com um sinal do seu valor.

 

Inventado a moeda por uma simples necessidade do comércio, com o passar do tempo começou a ser mais complicado, uma vez que o homem começou a perceber que poderia tirar muito mais benefícios do dinheiro. Fazendo-se consistir a riqueza na posse de uma grande quantidade desse metal.

 

A lenda de Midas é um exemplo da ganância que passou a assolar o homem. Midas morreu à fome porque tudo o que tocava se transformava em ouro. Ouro que obviamente ele não podia comer. Parábola dos nossos tempos, em que nunca houve tanto dinheiro e ao mesmo tempo tanta miséria.

 

O dinheiro passou a servir vários objectivos. Um, o de comprar o que é essencial. Outro, o de comprar mercadorias por um preço e vendê-las com lucro. E outro ainda, o de ser emprestado de forma a que o dinheiro se aumente a si próprio. Alienando desta forma o seu primitivo destino, o dinheiro passou a produzir dinheiro, alterando a vida das pessoas através de um objectivo contrário à sua natureza.

***Baseado em Aristóteles. 384 a.C. - 322 a.C.

 

Mais tarde vieram os bancos e o dinheiro passou a servir os banqueiros. E a arruinar quem precisa dos bancos.

 

 

Dúvidas

Despertou em sobressalto dentro de uma dúvida. Qual foi o primeiro sentimento? Quem sentiu o primeiro sentimento? Que sentimento doi o primeiro sentimento que alguém sentiu? Alegria? Medo? Tristeza? Balançava-lhe a alma nesse extenso espaço que vai de quem sente a quem não sabe o que se  sentiu. Em volta de si corria uma misteriosa distância. Uma diluição de vozes. Um arfar de saudades inexprimíveis. Qual foi o primeiro sentimento? Que olhos se encherem com o espanto desse sentimento? Mas a memória submergida no tempo era apenas uma corrente de neblina sem limites...

 

Respirou a sua resignação. Profundamente. Suspendeu-se no seu silêncio de séculos. Estremeceu. Para lá de todos os caminhos. Para lá de todos os espectros. Percebeu que era quem era. Percebeu que se tinha moldado a um tempo sem retorno. Percebeu que o seu reflexo no tempo era uma memória sem relevo. Uma solidão de asco. Os seus horizontes estavam plantados na varanda que dava para os céus abertos. E a eterna ribeira continuava...tranquila...a alimentar o choro das estrelas.

 

Inquietava-se com a arquitectura do universo. No ermo da sua solidão erguiam-se pequenas histórias. Inventava. Queria saber qual era o esgotamento da Vida. Partia ...deixando uma marca de si...em cada ausência dos outros.

Vergonhoso...

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(foto tirada da net)

 

Portugal é o terceiro país europeu com mais dinheiro em paraísos fiscais. São 50 mil milhões de euros. Só para termos uma ideia da imensidão disto, se a este dinheiro tivessem sido cobrado impostos, estes chegariam para modernizar todo o nosso SNS.

 

Mas esta notícia, quase de rodapé, não teve qualquer impacto nem em debates, nem em partidos políticos, nem sequer na consciência das pessoas. É a velha máxima do cada um governa-se como pode.

 

Quando se fala em saúde ou em educação, temos sempre tendência a importar os modelos dos países nórdicos. Depois dizemos que eles são desenvolvidos porque são países ricos. Nada de mais errado. Eles são ricos porque lá pagam-se impostos. Porque lá quem foge aos impostos é visto como alguém que está a prejudicar quem paga. É um anti-social. Um pária. Por cá não. Por cá é um um esperto.

 

Outra coisa que não se percebe é qual o papel do regulador,(Banco de Portugal), em toda esta canalhice. Para quando a adopção de regras verdadeiramente restritivas à saída destes rios de dinheiro? Restritivas no sentido em que se devem cobrar os justos impostos, quanto ao lugar onde põem o dinheiro cada um é livre de o fazer. Mas há outra coisa ainda, o dinheiro só pode sair através do sistema bancário, então os bancos não são obrigados a informar a saída destes montantes? Isto está é tudo feito uns com os outros, uma mão lava a outra e....

 

Os bancos, donos e senhores do país, sugam os pequenos depositantes para proteger estas grandes fugas ao fisco. Cobram comissões verdadeiramente chocantes a tudo e mais alguma coisa. O próximo passo é cobrar a quem tem dinheiro a prazo. Apenas aos grandes investidores institucionais, dizem eles. Mas preparemo-nos porque se a lei vier a permitir que se cobrem comissões aos grandes, está dado o passo para começarem a cobrar aos pequenos.

 

Até quando?.....

 

 

Caminhos

I

Nostálgicas memórias de uma primavera escura... flores soltando gritos de guerra...

E do teu peito saía o meu destino em golfadas de luz... cegava-me essa luz...

E a minha alma era um balão de ar quente elevando-se em todas as direcções...

Perdida!

II

Caminho... caminho como um tempo sem lugar... e escrevo asfixias nas vagas...

Restam-me as areias onde a memória se deitou... e a vigília insana onde naveguei...

Sei que a viagem é um caminho sem fundo... uma hora sem sombras... um tecto inclinado

Será possível pernoitar em ti? Escrever-te com sussurros cúmplices?

Não contar as horas?

Para isso é preciso que o teu rosto ressuscite no meu...

Que a tua música me adoce a alma

Que a tua voz se atravesse na minha...

Depois...

Podemos falar das memórias que deixámos enclausuradas no tempo....

 

Arderam as cores..

Arderam as cores... o inverno vem instalar-se entre nós... o luar emudeceu..

Perdeu-se no escuro serpenteante das águas...

Ao acaso... nadam peixes encarnados

Procuram os olhos que a terra atira suavemente ao mar...

 

Soltavas o teu chamamento como uma ave na escarpa dos beirais

Luz invisível que nos ligava atravessando o ar fresco

Profunda sensação invadindo o céu glacial...

Silêncio de campos fechados em si próprios...

Os teus dedos exalavam urgências...

Procuravam nos labirintos das ruas o regresso a um tempo sem corpo

Mas já nada nos ligava... nem os pássaros que fugiam do frio...

Nem o magma verde da esperança... nem o tiro de um céu petrificado.

Vazio

Finas partículas de tempo acumulam-se em nós. Finas partículas de pó acumulam-se nas estantes onde repousam fotografias. Pó e frio. Asséptico hospício das alamedas onde caminham cinzentos deveres. Divino seria o mundo se não desaparecesse na perfeita assincronia dos homens. Se não lhes trouxesse o pavor nem os levasse a mundos onde apodrecem os corpos. E onde as interrogações são ventos de silêncio. A aplacar a ira dos espelhos. Ferozes espelhos que cortam esperanças. Excessivos espelhos que mostram a realidade de um fogo que nos queima. Vale-nos o grito...e a leveza das inquietações. Vale-nos a nossa própria miséria de seres longínquos... e a marítima faina espelhada num mar sideral. Um mar onde inventamos o balanço do corpo...cansado de marear.

 

E o frio. E o súbito murchar das flores. Esse frio acondicionado nas nossa tragédias. E essas flores cujas pétalas enfeitam os espaços em branco da nossa vida. Como se fossem surdas ao nosso marulhar. Porque nos ocultamos por detrás de vidraças onde o medo é um espaço velado. A acenar a um céu liquefeito. Para onde olhamos e negamos a nossa incompreensão de termos o vazio na mão. E não sabermos o que fazer dele.

Simplesmente... homem.

A alma abre-se a uma verdade de milénios. O homem é uma luz física. Um entreposto desdobrável. A sua dimensão é a de uma estátua. O seu céu é o silêncio. E o homem...grave...cobre-se com assimétricos compassos. Ilude-se até ao esgotamento. Como se habitasse um farrapo do Olimpo. E o homem jura ser homem. Jura como quem quer voar. Jura como um ser desprovido de realidade. Ele sabe que o Destino é uma ruína. Que a sua primeira construção é a ignorância de si. Que a sua verdade vive no intervalo dos instantes. O homem condensa-se em absolutos. Inventa ciclos. Respira. E fita o seu embaraço com a incompreensão de quem não existe. Esforça-se. Tem insónias. Reduz-se a um intangível revoltear de sombras. Reduz-se a um princípio sem fim. A um fim sem finalidade. Compreende que não pode saltar o muro das suas imperfeições. Sabe que tem um Destino. Sabe que a sua sabedoria é uma invenção da eternidade....que não é a sua. Sabe que percorre um corredor invencível. Um declive acentuado. Onde a boca se seca. E os olhos se embalam. Falta-lhe perceber a palidez das sombras. E a imparcialidade de um fim nublado. Ele olha-se como quem interroga a chuva que cai. Como quem apaga um esboço. Como quem procura o Reino do intransitório. Como um deus sentado numa praia feita de fadigas. Onde as ondas chegam e o inundam...com todas os brilhos da grandeza...de ser simplesmente...um homem.

Um outro tempo..

I

De olhos semicerrados recordo um outro tempo...

Um verão onde detonavam centenas de odores

E as minhas mãos passeavam pela tua pele... repetidamente... como uma fuga ao tempo

Ou um lugar onde desapareciam todas a minhas angústias...

II

Seguimos na noite austera... como medusas fluindo junto ao mar

Zumbidos brotam na paisagem escurecida... escorregamos pelas dunas... suavemente

Memórias sonoras perdem-se nos nossos labirintos...

Existimos... como brechas no silêncio adejante.