Álvaro - Oleiros
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Sou o fraco fogo imerso nos espinhos das vozes
Copio as noites... em versos distendidos...
Vale a pena ser ave? Vale a pena ser muro?
Se no fogacho da pedra se descreve o futuro
E nos taipais do vento...jardins e florestas...
Dormem sonos soltos...beijam-se as arestas...
Florescem as giestas
Vale a pena alcançar os ramos dos pássaros
Descortinar paisagens...alvoroços de prumos...
Neve..flor viçosa..espaços sem rumos
Compridos ventos..taipais de marés...magros sopros lentos
Asas de absinto..andaimes de penas
Desejos de anjos rubros...cavalos de rosas
E o lume...o vento... o perfume das falas
Roubaram-me os medos...esvoaço em balas.
No meu corpo de areia...bailam mil cristais
Basto fumo opaco...gargalhada de hora
Atravesso a rua...escondo a sombra
Guardo o mundo todo...dentro de um poema
Rápida a minha mão se insinua no tédio
Entrega de vida...vertigem de assédio
Pairam beijos virgens..dormem frouxos seios
Eróticas luas...arrastam homens...pelos passeios
Voz de luar louro...voz de linha estreita
Obscuro murmúrio... brincando... no fundo da gaveta
E nos campos ermos..e na campa rasa...
Chegamos enfermos..construímos a casa..
Dissolvem-se os dias na ratoeira dos segredos
Desaparece a alma num incêndio escondido
A solidão é um hálito que os olhos exalam...um farol fundido...
Um balanço de vela no mar revolto
Cheiro a crucial liberdade onde o mundo se esvai...
Desperto na alvura de um regaço..luz de mim...luz de fim ...
Talvez o mundo não nos queira...
Talvez a luz branca seja o ponto onde desaparecemos
Talvez o bando de aves que se fundem num céu oculto...
Não seja mais que o estalido da liberdade.
Sentes o cheiro da solidão? Ardes numa dança de farol? Talvez não saibas de ti...mas...
Na tua alma vive um fim... uma força que baloiça num apetite de mundos encobertos
Ardes como um acordar dentro do sol... cresces e apagas toda a escuridão....
Irritas os pássaros que te apertam o coração...
És o ferro fustigado que se vinga nas ruínas da cidade
Acorda... paira no centro de ti a sede das pedras...
Calcárias sementes de portos desconhecidos
A cinza dissolve o mundo... o ar adensa-se na placidez de uma janela fechada...
Em ti...
E eu... aperto os punhos contra o fundo rugoso do mar... dispo-me como uma máquina...
Sinto a linha do horizonte como se fosse o centro do futuro...
E durmo... como se não houvesse nada maior que eu!
Chegou a madrugada como uma sufocação. Pequenas luzes apagavam-se no tédio dos sonhos. Sentei-me...suspenso...na fragilidade de uma pequena alegria. De uma furtiva verdade. Um galo embalou-me. Disse-me que também esperava a dissecação da noite. E das sombras...ergueu-se uma maciça tela. Um céu brutal subiu por mim. Uma gloriosa dor acenou do espaço. E eu...senti o peso de uma hora de lucidez.
Vivemos num dilema..entre a sinceridade e a caricatura da sinceridade. Iludimo-nos com o nosso estranho prazer de sermos outros. Vários. Hoje somos...amanhã não. Amanhã vestimos a compassiva cegueira do esquecimento. A gloriosa ignomínia do triunfo. Mas não sabemos de qual triunfo. Não sabemos em que é que triunfámos. Porque todo o triunfo é um subterrâneo de subtilezas. Uma arcaica fatigação do momento. Que violentamos com a nossa febre de vencer. Ou com a nossa brutalidade de obscuro renascer. Mas não renascemos. Apenas vestimos o inexorável fato da fantasia. Que nos envolve com a magia de uma noite quente. Onde adormecemos exaustos e cansados...mas felizes. Porque enfim percebemos que acordar é muito pior. E construir um desejo...é uma finalidade!
A Joacine é o tiro que saiu pela culatra ao Livre? Ou é a culatra que o Livre queria fazer de tiro? A Joacine é o próprio tiro que o Livre queria atirar? Ou é o tiro que faz marcha-atrás?
Podemos especular com a eleição de Joacine. Podemos perguntar porque é que Rui Tavares, o rosto mais conhecido do Livre não foi candidato num círculo onde pusesse ser eleito? Cá para mim, o Livre o que quis foi explorar a imagem de alguém que pertence a outra etnia. E que ainda por cima tem uma deficiência na fala. Com os últimos desenvolvimentos parece-me que também tem uma deficiência na atitude. Mas voltando à eleição de Joacine; será que o livre, sabendo que era muito difícil eleger um deputado, não quis explorar a côr da agora deputada? E será que agora que já tem uma deputada, e que já ganhou direito à subvenção, não lhe quer tirar o tapete? São apenas especulações, mas o espectáculo que deputada e assessor têm dado no parlamento não é o mais escorreito. Enfim, questiúnculas de deslumbramento, e de amadorismo.
I
Na cidade a água dança nas ruas...
Uma chuva verde-adocicada veste o êxtase do corpo
Vibram ninfas nos lagos...
Há portas sobrepostas sem tempo nem luz.... abertas... inertes...
E na efígie da imortalidade despedem-se as coisas sem tempo...
É a vastidão de um tempo em fogo... um lento campo de flores lilases...
Bastião carmesim da alma... que suplica perante as cintilantes luzes...
Por frágeis purezas e indistintos desertos...
II
Somos a cinza que gira no ar como um inverno feito por mãos sem geometria...
Existimos simplesmente... como uma perda... ou como um espaço desocupado...
Nem a primavera com a suas diferentes luzes nos acende...
Nem os recifes que se despedem das algas...
Nos chamam com acenos de flores impossíveis
Agarro-me a esses recifes... onde os búzios se despedem dos limos negros
E onde as Nereidas... perdidas... nos esperam... como bocas condenadas....
Todos os dias... aos bocadinhos... vamos construindo um passado
Todos os dias... aos bocadinhos... fazemos em nós amuletos de espaço
Esquecidos dias... rutilantes ais... já nada nos une ao colo dos pais
De vez em quando subimos ao palco
Rasgamos a carne... num bolear de vento
De vez em quando arrancamos pássaros
Bem cá de dentro
De vez em quando flutuamos na palidez
De um passado sem tempo
E é grande a escassez
Da frescura da tarde
Que nos encerra o lamento
Cheiramos flores... na franja das ruas
Bebemos o mundo em catedrais semi-nuas
A dor é a marca...que marca o tempo
A felicidade é o vento
O vento que desmarca a marca do tempo
O tempo que marca a felicidade do vento
Gaivota de seda que no espaço flutua
Inverno na praia... gesto de rua
Como será o país onde a água transborda
A asa se quebra... o sal rói... e o rosto discorda
Piso o chão que os meus pés não sentem
Piso agora os meus pés dormentes
Piso as horas que caem como estrelas cadentes...
Floridos silêncios. Longa germinação de primaveras. No vento...um ermo. No halo das giestas a transfiguração da terra. As memórias caminham em mim. São forcas na madrugada. São interstícios de fogo a dormitar nas horas. Longas horas. Assombros de inquietação. Imitações de clandestinas verdades. Verdades que passaram e já não vivem. São apenas dormências de um tempo aflito. Jogos de palavras. Janelas esburacadas. Cidades inundadas por furtivos planos. Planos. E mais planos. Que se finam em palmos de memória esfomeada. Como se percorresse corredores de choro. E desaguasse na intocável fragilidade da vida.
Atiro o meu grito nesta sufocação de azul. A cidade espera a minha breve passagem. A minha ocasional sombra. Os meus passos desalinhados. Caminho de desencontros. Passagem de sopros e de aromas. Na suspensão das flores...um rasto de paz. Fulminante paz. Que enfeitas o ar com a tua fome. E que procuras o homem que vive na dureza dos dias. Amassado em febre e sal.
I
Às vezes envelhecemos num minuto
Às vezes num segundo somos luz
Às vezes perscrutamos o azul profundo
Às vezes tateamos o absoluto
Às vezes reconhecemos por entre a chuva
Os passos sedentos de asfalto
Há uma noite...uma só...ou talvez nenhuma
Em que as nossas mãos se tocam
Como os corpos sofridos do basalto
E se as lâminas gravam rostos nas ruas empedradas
Se os sonâmbulos dilaceram flores de cobre
E se há uma boca seca nas searas já ceifadas
Também há plantas virgens a crescer na terra do alfobre
E a morte anuncia que a vida se descobre
No couro da memória alforjada.
II
Da janela de trás vejo o jardim e o gato
Vejo a velha figueira e novo cacto
E vejo pendurado no céu...
O meu retrato...