A flor
Tudo mudou...as coisas deixaram de ser coisas...tornaram-se ridículas
depois daquele dia em que decidimos que devíamos ser felizes..ou não
as portas abriram-se e os nossos corpos que costumavam suar juntos...partiram
deixámos que a nossa respiração fosse por aí fora...perdida nas ruelas...como um esboço de nós
depois...queríamos espaço...perfeição...
queríamos o absoluto dentro de um silêncio apertado
ainda assim...não tenho pena do dia em que te sorri e tu...
embora fechada em metros de ausência...sorriste
hoje tenho imenso espaço só para mim..o meu peito habituou-se a amar o silêncio..
a fechar-se dentro de uma sala onde preencho a noite com coisas de ontem
eu que só queria fascinar-me com todas as tuas imperfeições...
achava-te perfeita...devo dizer
e acabei sentindo subir até mim o terror de te perder...
ainda vejo o teu vestido...subindo...subindo...
e os olhos...ah os olhos...brilhando...brilhando...
eu que só queria que existisses dentro das minhas mãos...pegava-te..
e de olhos fechados tacteava o caminho até ao quarto...
queria que fosses a minha flor sem rosto
eu...não resistia ao odor da tua pele...
e sentia que era felicidade a mais tocar-te no ponto mais íntimo do desejo
na janela ainda está o vaso onde punhas as flores para as borboletas poisarem
ainda hoje vi uma... enorme ..que te esperava junto ao vidro fosco
de vez em quando vou até lá...espreito e penso...vou deixar de ser como tu...
uma borboleta que espera a flor...que murchou...