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folhasdeluar

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Tu e eu

Tu e eu..serenos...sentados em breves linhas do espaço

Planando como vozes que não escutam os cânticos naufragados da noite

Na névoa escondemos as mãos

Aquelas mãos que o tempo reduziu a breves silêncios

Aquelas mãos que colheram as pétalas sulfurosas das cidades

E as guardaram em seculares arcas feitas de sombras

 

Tu e eu...que planamos nas asas das gaivotas

Como se bebêssemos as conspirações secretas das tardes

E absorvêssemos no nosso corpo o tumulto raso das águas

E nos fechássemos na espessa muralha do destino

Que nos juntou...

Sonhos

Há um ritmo no vento

Há uma nostalgia escondida em cada espelho

Cabelos longos...trilhos de ternura secular

Dentro de nós...os sonhos transformam-se em estátuas

Crescem como um baixo-relevo do futuro

Erguem-se num pedestal de nadas e de esperança

São o pó e a pedra... a lima que esfrega os dias

E que limpa a corrosão das horas....

Longe do tempo

Nascemos felizes e límpidos como clarões

Depois..alargámos mares...

Bebemos marés... fomos por aí

Escorremos pelas ruas como pautas de músicas estranhas

E não percebemos...

Porque ficámos tão longe do tempo!

 

Somos simples como o luto que nos marca

Pobre corpo a anunciar nostalgias de sede e neve

Ainda agora as nossas mãos tocaram na alegria

E já tudo se desfez em vento e tranças

Já tudo aconteceu...

E nós aqui...a ver!

Aqui estamos

Por acaso sabes que o mar se espraia nos teus olhos?

Que mitológicos navios aproam às memórias de um tempo salgado?

Não sabes...não sabemos...porque somos sublimes...

Porque caminhamos sobre a sublimidade das águas

E nada nos interessa mais que a brandura das palavras

E nada queremos mais que o esquecimento das batalhas

A maré sobe-nos pela pele...e com ela vem o beijo do vento

E isso nos basta...foi para isso que viemos...

E aqui estamos...

Onde estamos?

Onde estamos...nós... os que oscilam no vazio

Nós...os se lavam nas margens opalinas da noite

Como fugazes sóis...como estremecimentos de exílios

Nós...aqueles que já não querem nada

Que já não procuram nada

Porque sabem que de uns lábios vazios nascerá um outro poema

Porque sabem que de cada nuvem descerá uma luz

Que nos lavará do medo e do silêncio

Que nos trará a húmida e cálida felicidade

Nós...animais emboscados em falsas esperanças

Onde estamos?

Sal

Banho de luz...fina seda...austera alegria

Nas paredes vive a sombra das árvores inquietas

Impetuosa luz indefinida

Que dedilha memórias de barcos sem rumo

Um dia acreditámos viver na bolha de um tempo feito de metáforas

Um tempo de palavras e águas livres...

Límpidas como crepúsculos oscilantes

Derrubámos muralhas...não por gosto...por necessidade

Subimos promontórios apenas para ver mais longe

Conhecemos os recônditos cantos do corpo

E quando todo o tempo se ergueu em nós

Fomos como água que se evapora...ficámos...

Sal!

Frágeis varas

Nós...os que crescemos sob todas as dores

Que somos escassos perante o azul vivo do mar

Que queremos ser mais que uma inscrição na pedra

Sabemos desde pequenos

Que somos frágeis varas de salgueiros a acenar ao vento

Sabemos...que por entre os arbustos espreita o gosto da vida

Que o infinito dura mais que o tempo...e que os tronos caem...

Como pétalas...como deuses que se desdenham

Como eufóricos traços desenhados no ar

Por um papagaio feito de papel e sombras.

 

Erguemos a cabeça...somos gentis...

Assomamos às normas da respeitabilidade

Só porque não podemos ser outra coisa...

Ou porque não queremos ser outra coisa

Vamos por declives em direcção a sabe-se lá a quê

Demoramo-nos nas praças onde os pombos revolteiam os ares

Pobres bichos...doentes como nós...esfomeados de liberdade

Não me esqueço que um dia tomei o gosto da vida...

E gostei...e foi bom...não esqueço!

Oráculo

Que vês na mitológica praia onde a noite não é mais que uma solidão

Que sabes das coisas em que não pensas?

Mas será que pensas nas coisas que não sabes?

 

Madrugada...onde mora a altiva idade dos fantasmas

Madrugada...onde mora a insatisfação cansada do exílio dos dias

Madrugada...onde a insatisfação traça no céu uma linha sem imaginário.

 

Passos curtos...longa rota...aurora de ferro

Espero que o horizonte seja mais que uma linha flutuante

Espero uma barca onde possa despir o meu corpo livre

Ou onde a alma presa aos segredos se desfaça em mim.

 

O vento ergue-se por dentro do meu tempo

Basta um minuto para que os olhos se fechem as dunas respirem...e

As estrelas emudeçam...

E sejam como luzes pregadas num céu de hulha.

 

Pego no futuro...é agora...já o tenho...estóico... penso que tenho tudo

Desço por este desvão em direcção a um tempo raso

Mas chove nos candeeiros apagados

Não há luz na retina das ruas

Algo se quebrou...algo se partiu na gruta do oráculo

Foi o tempo e a raiva...foi o escuro e a fala...

Foi o mundo!

 

 

Amanhecer

Imóvel...como pó a desfazer-se numa côr irreal

Fecho-me dentro de um espelho onde vislumbro os segredos das pedras

Não regressarei...mesmo que os grilos acordem a noite

E os morcegos adornem a lua

Fechar-me-ei devagar...como se não houvesse vento

E as flores das camélias fossem rostos em canteiros desanimados

Soprarei...e todos os planetas tremerão com o meu gélido bafo

Todos os silêncios descerão a pique...

E o cimo do mar soçobrará na volúpia suave da luz dos faróis

Será a coreografia da luz...o tempo dos destinos...o mundo

Na noite a vida gira em caleidoscópios de vazio...nada diz...sofre...

Tece hipóteses de futuro com gramáticas impossíveis

A alegria recosta-se nos telhados...assoma pelas janelas...tudo brilha

A alma renasce...o fim acaba...a manhã cresce.