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folhasdeluar

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Perdão

Por dentro da bruma luminosa da manhã

Desci a rua como quem persegue um qualquer destino

Procurei por entre a sombra plumosa das árvores do algodão

A extensão cinzenta de mim próprio

Confundi-me com as folhas

E com as flores que espreitavam nas janelas

Atirei longe o meu olhar

Como quem procura a esperança

Num ponto qualquer do céu

Caminhei pelo sol

Toquei na rudeza das casas ...perdi a idade

Sou agora o cume de qualquer coisa...o pérfido

O que bebe os sons das aves.

 

Arrepio-me...alucino

Hoje é tudo diferente dos outros dias

Há feras à solta...há castigos invernais

Qual será o que me espera?

 

Quem se sujeita a andar na rua...

Sabe que por entre o azul das sombras

Se passeiam laços de amizade

E que a irrealidade espreita pelo canto dos rouxinóis.

 

Por dentro da escassa beleza dos dias

O corpo senta-se nos ressaltos das portas

São degraus e degraus de vazio

As rugas crescem....os frios virão...

É o início dos silêncios...

A aportar ao cruel desfilar do destino

Prometi que um dia correria pelo perfume das ramadas

Que um dia faria companhia a qualquer ave solitária

Tão certo como saber que um dia a geada me cobrirá o sono

E as avencas perdoarão a minha falta de atenção

No fundo...ignoro todas as coisas...

Mas perdoo-me...

 

O nosso caminho

De repente veio aquela força

Lentamente …

Plantou-se em mim como se habitasse um pedestal

Pétalas de sonho despontavam na minha mão

Eu tremia como quando a terra se assusta

E explodi..como se crescesse por dentro de uma trovoada

O choro das ruas chegou à minha mão...ergui-a

Tracei um risco no lusco-fusco da tarde que oscilava na minha alma

E saí para a minha noite

Descalço...como quem não sabe para onde vai

Mas sabe...que vai encontrar um caminho.

 

Chama

Já não me servia aquela chama

Que ressaltava em cada sonho desfeito

Impercetivelmente...

Foram-me caindo as folhas da surpresa

Como se eu viesse de uma lonjura desconhecida

Os dias tornaram-se numa extensão de mim

Quebrei-me como se mergulhasse num ninho desfeito

O mundo era desenhado a carvão

Negro arrepiante

Fundido-se nas plumas esparsas da noite

Até que um dia...chegaram as flores

E os corvos acordaram-me da letargia

E eu recebi nos olhos...em cheio...

A maior luz que conheci

Então...resguardei-me no voo das andorinhas

Construí a minha exaltação

Plantei orvalhos em cada teia de aranha

E liguei-me à terra como se a habitasse

Desde sempre...

Letargia

I

 

A noite tombou na orla das marés

A neblina cresceu...entornou-se sobre a areia

Alguém passou...alguém sorriu...

Quem?

II

 

Na sala...um espantalho espreita quem chega

Na ruas explodem longos risos...cavernais

Comprei o meu espanto numa rua de saldos

O sono banha-me o lado esquerdo...nada posso fazer...

Adormeço?

 

III

Em frente a mim uma vidraça

Espreito-me...

 

IV

Juro que não sei fazer mais nada do que preparar a minha morte

Afinal...a música também se acaba...

 

V

 

Pousei o meu retrato numa prateleira cheia de coisas inúteis

Foi mais uma que lá ficou...

A apanhar pó...

Mais nada!

VI

 

É quando um homem se deita que a alma se levanta

E o sonho...é uma pedrada na letargia da noite...

 

 

O véu da noite

Encerrar as contas

Procurar no tempo a eternidade

Construir breves formas

Adormecer com a carícia das borboletas

É isso que chamo...incendiar as flores

Renascer noutro caminho

Ocupar o meu espaço .

 

Sob um céu de luz

Os grãos de areia luzem nos sorrisos

Sob a mesma espera

Quebra-se o sol de mansinho

E os búzios falam das ondas

Como feiticeiros da extensão plana dos sonhos

Que me ligam ao mar...

 

Corpo a mover-se....

Pluma de pele e ossos a ressaltar nas ruas

Entrelaço a alma em amarras que invento

Despeço-me das feras que se acumulam em mim

E transcendo o impossível véu da noite.

Serás tu?

Acumulas em ti as ervas...as veias...as esperas

És o alimento da luz...a pétala estalada...bela....deslumbrada

Prometeste construir um enredo de silêncios...inteiro...rosáceo...

Mas apenas fizeste com que os astros caíssem na lama

Rasgaste a vida...receaste a plenitude dos barcos...ficaste...

E já não ousas erguer os olhos para a beleza dos malmequeres...

Lembras-te da espuma a desfazer-se?

Serás tu?

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