A lua dissolve a sua luz sobre o meu rosto
Que implode na vidraça ode miro o silêncio.
É noite neste cais onde volto
Como se fosse uma ave que migra para se sentar no rumor do mar
Árvores de fogo desabam na rebentação
Mas já não escuto a sua dor.
Penso em ti
A tua imagem é agora uma gaveta fechada
Um final de dia que já não oiço
Uma tatuagem que já não ostento
Do lado do mar chegam-me palavras salgadas e dedos invisíveis
Dedos que se agarram às casas e às pessoas
Como se fossem coisa sua.
Há no ar o abandono da fala
Neste holocausto do silêncio impera o vento do sonho
A luz é uma esquina que está disponível para os desencontros
Há ritmo e rumores no ar
Dentro de mim o espelho da água queima a minha imagem
Dissolvo-me lentamente dentro de uma luz humilde
Fecho-me por dentro
E dentro desse meu espaçoso mundo
Revejo palavras pavorosas
Tenho visões de portas fechadas
Céus onde a paisagem sufoca a frescura da luz
Nego-me a esta ilusão... a este sossego
A este lodo que rebenta nos meus poros
Na minha memória ofereço o meu riso aos ninhos dos pássaros
Diluo-me como uma vida
Que principia no desmoronamento das paisagens
É irreal esta madrugada perfumada por bruma e espuma
É como se tivesse deixado cair a infância
Nos canteiros de um jardim onde não regressarei.
E nos meus pulsos crescem as horas
Alargam-se as paredes...há uma saída
Escondida no peso das mãos
Mexo e remexo nos sonhos...ateio o vento...tacteio-o
E já não posso desembarcar nesta imensa rua
Nesta trovoada de janelas em fogo
Porque no longuíssimo corredor da minha voz
As sombras fazem eco
E as coisas pegam-se aos regressos
Como pequenos monstros incapazes de florir
E que se abrem a um tempo que me circula nas veias
Neste desalinho sei que apenas me resta o grito
E a gestação magoada dos néons floridos