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folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

Feliz Natal para todos

Em cada olhar um resto de cidade

Escura agonia de candeeiro sem luz

As mesas cheias...as sombras...os silêncios

Em cada esquecimento uma agonia

Em cada noite bordada por luzes que acendem e apagam

Alguém resgata de si os últimos sentimentos

Alguém encontra na sua profunda desilusão a noite nua

O frio murmura e vai acompanhando a noite

As mesas vazias...as prendas abertas

Alguém fechado em si absolve as suas amarguras

E bebe a espuma dos desertos

Como quem não tem ninguém

Para partilhar a sua intacta solidão

Contudo...é noite de Natal!

 

Feliz Natal para todos

No ventre do espaço

No ventre do espaço cresceu um vento

Na planície das coisas nasceu um musgo de sonhos

E tudo ficou como se não fosse

E tudo aconteceu como se nada ficasse

E tudo brincou como uma seara de flores aladas

Restou...a fantasia de inventar pássaros de todas as cores.

 

No bordado dos olhos ondulavam os sonhos

Pedras de lume acendiam a solidão

Tudo apodrecia na fragilidade das horas

Os corpos suplicavam pelo halo perfumado do amor

Nós nascíamos na clave do tédio

E, como cegos...espreitávamos pelas frestas do arvoredo

Que nos encobria...

 

Éramos apenas gente ignorada

De nós ninguém sabia

Despidos tecemos medos

Vestidos desnudámos os dias.

Submersão

Chegou...como um grito submerso na boca de um pássaro azul

Chegou...como um pequeno mar que desliza para a finitude da tarde

Trazia consigo um emaranhado de sonhos a corroer-lhe a alma

Trazia refletida em si a luz de um crisântemo

Alumiava-o o perfume das margens suaves do rio

Partiu como um séquito de estrelas a desatar-lhe-lhe a vontade de ser mais além

Pois o tempo...era para ele....uma constelação longínqua...um passo atrás

Pois para ele...não havia tempo...apenas e só...

A submersão nas palavras...

Véu azul

Véu azul...translúcido espaço a quebrar-se de encontro à liberdade das aves

Sonhei que as margens do rio se precipitavam num manto de espuma

Sonhei que do chão se ergueu um arco-íris de anémonas

E que da cegueira absoluta do amor se construiu uma vida

Como quem beija a côncava alma do vazio.

 

Na indecisão das horas decifro os impulsos do tempo

Ergo-me num pranto de esperas e deslumbramento

Sei que me divido em pequenas peças de mim

Sei que me dispersarei pelas colinas da tarde

Como uma brisa que paira sobre o infinito.

 

Não penso na memória dos céus nem no canto dos poemas

Mas penso na espuma da memória que profanou a orla do tempo.

O Espírito de Natal ( conto de Natal)

Era a semana do Natal. Sempre se sentiu assim meio perdido nesta quadra. Não conseguia sentir isso a que todos chamam o Espírito do Natal. O que seria esse mistério que tinha que descobrir. Que aurora seria esse que abriria as portas desse reino. Que verdade se quebraria na ramagem das manhãs. Que país de sonho e imagens antigas de presépios e estrelas estaria por descobrir? Mas ele caminhava esperando encontrar um sinal que lhe despertasse o coração. Ou um sentimento de suave doçura. Olhou o céu que se parecia com flocos de algodão suspensos sobre a tarde feita de um azul-claro. Olhava as pessoas. As ruas enfeitadas. As vitrines a convidarem ao consumo. As crianças a correrem pelos centros comerciais cheios de vitalidade e desejo de coisas belas. Mas ele não. Ele era um astro sem céu. Um branco areal onde o encanto das coisas se quebrava. Era uma margem à margem da margem desse espírito que habitava tanta gente. E pensou naqueles que que não têm Natal. Pensou naqueles que já encheram a sua mesa e já cá não estão. Pensou nas luzes que alumiavam o seu presépio e o seu pinheiro de Natal. E percebeu que o Espírito de Natal são uns leves compassos de coração enternecido com a beleza do mundo. E percebeu que esse espírito era uma verdade que desaparecia sempre que a memória se alongava no tempo. Que era o encanto da chuva a bater na vidraça ou o vento a açoitar as ruas ou até a neve a cair docemente. O espírito de Natal é a Eterna vontade do Homem encontrar dentro de si o calor dos outros homens. E dos outros serem todos países de sol. Solidários e verdadeiros. Leves almas que se desnudam em cânticos suaves. O Espírito de Natal era um céu de silêncio carregado de estrelas. Que muita gente se esquecia de olhar. Mas era também uma calma paisagem que se enredava no seu coração. Como uma breve verdade que teima em se esconder. E só se deixa descobrir pelos que têm um coração puro.

Caminhos

As pombas voavam no silêncio ectásico

Alvas...raras...como vazios...

Ou como sonhos assombrados.

 

No meu deslumbramento decifro o enigma dos espelhos

Na minha vontade percorro as faces secas das ruas.

 

Há magia no esvoaçar seco das folhas que caem

Há uma melodia excitada em cada raio de sol que ilumina o destino

 

Na boca das flores nasce um rasto de sonho

Que segue pela perdida neve... que cai sem finalidade.

 

Mesmo que eu imagine calcorrear todos os caminhos da Terra

A Terra nunca terá tamanho suficiente para a minha imaginação.

 

Neste quadro de quando e de quantos

Quantas pessoas vivem na desolação de não saberem descobrir o quadro?

 

Quando um dia souber em que árvores vivem as almas

Despertarei de um sono feito com a sábia textura da fantasia.

 

Delírio

Sou o cavaleiro extenuado que galopa pelas alamedas suspirantes

Da minha carne transbordam colunas de mármore florido

Enfeitadas com repuxos que esvaziam o meu coração flagelado pelo vento

Ergo então a minha trombeta sobre os vasos de crisântemos brancos

Anunciando suspiros de sol que se espraiam em famigerados ardores felizes

Loucas doçuras lilases enfeitam as pedras que suspiram graciosas e ternas

E nos lagos dos jardins as fontes guardam os ardentes segredos

Trocados por lábios colados que ruborizam os singelos canteiros de dálias

Profundos Outonos reluzem nas ruas estilhaçadas pelos perfumes murchos

E eu inconscientemente incito o meu cavalo

Que se ergue para o céu profundo

De onde escorre uma absurda lágrima

Como se tivesse saído de uma Primavera enevoada

Ou de um suspiro vindo do mais profundo grito das ramarias

Depois...lavo as minhas impurezas no teu olhar róseo

E bebo por uma taça de ouro a delirante embriaguês do teu corpo.

Clarividência

Não procuro nem clarividência nem perfeição

Existo como um venerável acompanhante da vida

Não condeno fantasmas nem berços

Porque cada um vive dentro do seu deslumbrante dia

Exijo às minhas cavernas que desocupem o espaço onde estou a mais

Para que possa aceder ao mundo das sombras solitárias

Onde não imponho o som dos meus passos.

A ruas que os silenciam.

Houve um tempo em que não havia Natal. (Conto de Natal)

Houve um tempo em que não havia Natal. Ainda não tinha nascido um menino numa manjedoura, (muito embora muitos já tivessem nascido em cavernas, que eram sítios um bocado mais frios). Mas, enfim, um dia lá se inventou o Natal. E logo de início se começou a moda do consumismo. É que parece que vieram os Reis Magos e em vez de umas fraldas ,( se calhar não existiam nesse tempo), um cobertorzito, uns sapatinhos de lã para aquecer os pés ao menino, o que trouxerem foi ouro, incenso e mirra. Claro que aquilo não lhe fazia falta mas já se sabe como são os homens quando toca a dar prendas a crianças. Tudo o que não seja um tablet para eles se alienarem e não chatearem, ou qualquer outra bijuteria que as crianças de hoje pegam e largam logo, fartas que estão de brinquedos, os homens não têm jeito nenhum para prendas, ou têm? Lembro-me daqueles que oferecem belas jóias e colares e anéis, só que não é às suas crianças, muitas vezes nem às suas mulheres, é a outras pessoas amigas que eles têm. Mas voltando ao tempo em que não havia natal nem brinquedos. Aquele tempo em que as crianças andavam desde pequenas com uma moca a dar pauladas uns aos outros e a fugir dos dinossauros. Depois lá vieram os Flintstones com os seus carros de rodas de pedra, e fisgas e mocas mais sofisticadas, foi a partir dos Flintstones que se começaram a inventar mais brinquedos que era para as crianças não andarem sempre de cachola partida com as brincadeiras da moca. Nesse tempo também não havia iluminações de Natal, ainda nem sequer se tinha descoberto o fogo. E também não se fazia aquele jogo de ver qual era a árvore de natal mais alta e mais bem iluminada, coisa que também não interessa muito, porque aquilo não é uma árvore, é uma estrutura de ferro disfarçada de árvore, mas aceitemos isso, a nossa imaginação consegue tudo. À noite era uma tristeza, tudo para a cama logo cedinho, nem valia a pena fazer birras, não se via nada, a não ser em noite de lua-cheia, nessas noites era uma alegria tudo a ver se matava os animais nocturnos. Nesses tempos todos os meninos eram Meninos-Jesus, todos eram pobres, andavam vestidos com farrapos de peles, e não haviam ténis Nike. Também ainda não existiam bolas de futebol, assim ninguém ia aos estádios insultar os outros e andar à pancada. Havia de ser giro se agora a malta voltasse ao tempo da moca e fosse ver os jogos de futebol. Felizmente o futuro às vezes é previdente. E pronto, hoje há Natal. As pessoas desejam muita paz aos outros. Oferecem muita inutilidade aos outros.

E comem e bebem com fartura. Também continuam a existir os que ainda vivem na idade da pedra. Aqueles que dormem nas cavernas das cidades. Que comem o que lhes dão. E se escondem em casas feitas de cartão. Eu gosto muito do Natal, mas gostava mais se todos fossem felizes e tivessem casas e comida e assim. Beijinhos e para aqueles que ainda vivem na idade da moca muito cuidado.

Bom Natal

Tempo melancólico

Escuto o choro do mar

Por mim passa a vertigem do mundo

Densas aves colam-se ao horizonte

A vida penetra-me nas veias afogueadas

O céu prolonga-se em mim

Nasci....

Entre a hélice do dia

E a curva transparente da liberdade.

*

Passam por mim antiquíssimos céus

No cimo dos mastros baloiçam as aves

Fora do tempo brilham as asas dos peixes

Os meus olhos confundem-se com a felicidade da espuma

São olhos de salmoura

Saltimbancos de espaços

Que tocam nos extremos felizes dos mares

E sobem... e descem...

São prolongamentos de um tempo melancólico

São fantásticos seres

Que caem verticalmente dos sonhos das flores

Como infinitos que brilham no sono das luzes.

*

E porque por ti passei como um gesto liso

E porque do vasto tempo quebrei as leis

Agora sou a ondulação informe do sonho

Agora sou a infinita onda que canta ao vento

Como se abraçasse um sonoro espaço

Como se nascesse de um secreto bailado

Como se me quebrasse de encontro a um sonho

Que vive na tua voz.

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