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folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

Barco solitário

No fim...

Tudo voltará a ser como nos primeiros dias

O céu pouca atenção nos prestará

As aves serão apenas passagens

E o verão...

Será como um molhe atado ao nosso corpo

Um barco solitário com tranças de espuma

Na limpidez dos olhares veremos corações

Versos surdos à intempérie

Paralisados pelo asco das migalhas

Que restam na mesa suja onde comemos

Bastava uma palavra

E todas as cicatrizes da memória ficavam curadas

Bastava um abraço...um apertar de lumes

E um cheiro de vida floresceria

E tudo seria água fresca

Escorrendo pela milenar fonte da nossa alma

Mas há a insónia

Esse navegar pela noite

Esse mastro atacado pelo escuro

Nunca cheguei a saber

De quantas letras precisava para chegar a ti

Nem a quantidade de véus opacos que sobrevivem aos sonhos

Mas há ainda o cheiro do quarto esvaziado de nós

Mas há a penumbra onde ainda te vejo...despida

Tão jovens e com tantas coisas dentro

Que até os suspiros

Eram beijos onde as lágrimas pousavam

E perante a incerteza das águas

Desfizemos a ternura em charcos lamacentos

Avançámos...

Deixámos na nossa esteira uma sombra em branco

E os peixes diziam

Que a vida era a espuma que se colava aos nossos pés

E as estradas diziam

Que a vida era o pó que se colava ao nosso corpo

Mas nós...nada dizíamos...apenas olhávamos o ar

Parados...na vida...





Sal e sangue

Era uma pedra preciosa...uma saudade

Um porão deitado num estreito mar

Agarrei-me a ela como se agarrasse o outro lado da rua

Caminhei...senti as primeiras chuvas

E o barro dos corpos ocultos pelas miragens

Avistei ilhas..separei-me do meu corpo

E esperei que a alegria acabasse

Pelas tábuas do soalho

Vi deslizarem cios e cantos de cigarras...noites quentes

Membros entrelaçados na milenar forma de amar

Subi ao esquecimento das águas

Senti a vibração opaca da alma

E foi como se avistasse a luz

Que irrompe do sono mais temido

Sono ou ar? Alma ou falésia?

Trigo ou vagas embebedando-se nos bordos dos navios?

Ácidos deuses esperam por nós

Rubros esquecimentos irão encontrar-nos

Avistaremos as sombras...os mastros...as sílabas..

Mas porque nos desviamos da alegria?

Porque evitamos essa pátria que se nos pega à pele?

Cansaço de mãos...

Sono perscrutando o ventre das espadas...cortantes frios

Nos mapas desconhecidos há ácidos cios..fomes...saudades

E ardendo no sol tactuado com miragens

Vejo espelhos...lumes...cascos...galopes

Vejo todas as coisas que ardem no medo

Vejo as raízes...as sementes...o frio do mundo

E vejo redes que pescam vidas calejadas por nevoeiros

Como muros de pedras desfazendo-se na água fresca

Paralisados em tons de ocre dourado

Como minúsculas certezas...

Como oxidações de almas ruborizadas pela fome

De ser sal...e sangue vivo...