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folhasdeluar

Uma coisa é uma explicabilidade inexplicável...Hugo von Hofmannsthal

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Uma coisa é uma explicabilidade inexplicável...Hugo von Hofmannsthal

Página rasgada

Corria um vento branco...excessivo

Um vento que derretia todos os sonhos

E eu cansado do teu perfume

Peregrinei pela noite

Apanhei do chão as fluorescências

Que pendiam da tua inóspita alma

Olhei-te de soslaio e não te quis reconhecer

Eras a nuvem que vagueia pelas ruelas

Despedi-me para sempre do amanhecer do teu corpo

Rasguei a tua página ….e adormeci feliz!

Nos braços da madrugada

Olhares embriagados e sórdidos

Espreitam a morte sob a chuva que enche os rios

Vinhos...cartas de jogar fora

Cansaços marítimos de mapas extraviados

As cidades passarão por nós na noite atlântica

E as marés levarão os rios até à foz

Não há cansaço nos ventos

Que giram pelos pontos cardeais dos jardins

Não há sujidade no canto das águas

Que se extraviaram pelas colinas verdejantes

Porque nós caminhamos sempre rente ao mar

Como marinheiros sem estrada

Nascemos numa manhã que nos ignorou

E regressaremos numa noite que não nos recebe

Não precisamos transportar mais cidades pela calada da noite

Agora podemos dormir descansados

Todas as coisas vão pairar sobre as avenidas...

E todos seremos o público que vai morrer

Nos braços evaporados da madrugada!

Possuías uma paisagem serena

Possuías uma paisagem serena

Desenrolando-se sob as tuas pálpebras roxas

Sentias que o teu respirar de chumbo

Segurava o vazio das tuas mãos sem reflexo

Escorregava do ar um sufoco de poeira

Que refulgia no ardor da contraluz

Tinhas as veias pintadas de amarelo

Como uma montra irreconhecível

E amavas as constelações de flores

Que resplandeciam na noite estrelada

O teu interior exalava uma claridade

Que devorava os contornos perfeitos da noite

E a tua boca sufocante rodava lentamente

Em torno da minha pele

Não havia vazio nem corria vento

Era apenas um excesso de sol pintado no olhar

Tu devoravas-me...e eu..fechei os olhos

Como se me esvaziasse num pátio de amores

Onde não havia piedade para os corações

Porque eles ardiam num labirinto de excessos

Eles viam paisagens e astros estremunhados

Eles eram noites de espasmos

E nós...

Peregrinos numa trepidante constelação de estrelícias floridas

Buscávamos mutuamente os nossos lábios alucinados

Como pássaros num bailado impregnado de odores embriagantes

Que a nossa noite cobria com mágicas plumas

De sussurros encantados!

Os Centros de Saúde funcionam em horário de escritório

Nestes últimos tempos temos vindo a deparar com uma crescente vaga de pessoas que têm como último recurso recorrer às urgências hospitalares. Nessas urgências desesperam durante várias horas, chegam a ser 20 horas e mais. Muitas dessas pessoas não sofrem de doenças que tenham como primeiro recurso os hospitais. Mas então como evitar dirigirem-se às urgências hospitalares se os Centros de Saúde não os atendem? Os médicos que trabalham nesses Centros são uma espécie privilegiada. Atendem um pequeno número de doentes por dia, quer dizer por manhã ou tarde, e depois vão à sua vida, que muitas vezes são a continuação da sua actividade nos privados.

 

Posso até dar um exemplo que é o meu. Soube por acaso que tinha mudado de médico de família. Perguntei porquê e eis a resposta: o horário de trabalho dos médicos diminuiu e consequentemente tivémos que diminuir o número de doentes por médico e distribuí-los por outros médicos. Então numa altura de crise, numa altura em que as urgências estão saturadas diminui-se as horas de trabalhos dos médicos que exercem nos Centros de Saúde? Isto é kafkiano.

 

Não deveriam os Centros de Saúde,ser a primeira linha de recurso dos doentes e funcionarem como os hospitais, ou seja, 24 horas por dia e sem limite de atendimento aos utentes? Parece-me que sim.

Num quarto povoado por sonhos

Era como um pássaro enleado em agudos horizontes

Pintava-se numa simulação

De sangue feito de jacintos amarelos

E gostava povoar os dias com nuvens de pó de arroz

No rosto nasciam-lhe orquídeas brancas

Que simulavam avenidas incompreensíveis

Espreguiçava-se indiferente aos dementes entardeceres

Gostava de enfeitar com flores a sua própria sombra

Como se fosse uma máscara latejante

Vestida de um branco imaculado

Das suas mãos saíam cidades feitas de leite

Asfaltos complicados...frescas feridas na alma

Era como uma ave povoada de corpos

Que cresciam sobre geométricas figuras crepusculares

Labirínticas penumbras periféricas adornavam a sua sombra

Onde respiravam paisagens

Feitas de homens esfaqueados pelo entardecer

Simulava...sim!

Simulava iluminações de belezas dementes

Como portos sem barcos

Latejando numa tenebrosa noite

Era a flor bordada na toalha de mesa

Que engana a fome fosforescente

Era o dançar de um bailarino esquecido

Que inventa a sua coreografia sem nexo

Até que a cidade lhe atirou flores contra os olhos fechados

E amanheceu ...sem saber como

Num quarto povoado por sonhos

Onde espantados olhavam de soslaio

A folha de papel branca e vazia

Bordada de solidão.

Nada se extingue

Sonhos sublimes

Convencimentos de paisagens pintadas sobre o peito

Divinos sóis que as águas inventam

Gemendo sobre granitos loucos

Sonhos exalados por um imenso clarão

Inscrito na pedra iluminada

Nada se extingue

No ardente aroma de um sonho que se mostra ao Universo.

 

Estrelas fundem-se num canteiro feito de corpos

Brechas abrem-se nas vidas

Que suspiram pelas flores das glicínias

E todas as chuvas se aconchegam numa insónia

Feita de cemitérios cheios de anjos enjoados.

 

Flexível é a melancolia

Que atravessa a quietude de um tempo

Dentro do qual

Um lago gelado conserva pirâmides de mundos magníficos

Mundos onde tudo se resume a fragmentos melancólicos

Que tacteiam um lume lunar

E todas as trevas se escondem na areia

Que flutua na luz das alturas

Até que os meus braços nus se abram

Num abraço feito de espaços floridos.

 

Precisamos de mais sol

Cresce a luz sobre os passos perdidos na noite

Outros sonos cobrem a cidade adormecida

E de repente a chuva incendeia a solidão

Já perdemos tantas fotografias

Já não somos ninguém à janela de vidros espessos

Agora sonhamos com pontes feitas de imóveis pedras de jade

Sonhamos com fontes solares

Fontes que nos acompanhem na sombria travessia dos céus

E também na pureza de um grito encerrado numa noite branca

É preciso que as pessoas se enterneçam

Que deixem os profetas da lama

Sós nos seus delírios

Enfeitados com penas incolores

Que as palavras não descrevem

Enquanto as águas superficiais e frias

Clamam por mais sol!

A longa madrugada

Puro encanto...perfeita imagem

Ilustração de luz...destino de um só

Olhos fechados...caminhos cumpridos

Obra de rostos felizes

Pássaros pousados no silêncio dos beirais

Pôr-do-sol acutilante

Corpos cravejados de amor

Baloiço de mastro...dia completo

Luz repentina....cristal de caminho percorrido

Queda de rosto em rosto

Língua de memória exacta

Solário de almas perfeitas...irmãs

Tempo puro...intacto...imaterial

Amor de vida...amor vivido

Largo céu de tempo parado

Tudo se dispersa...sombras caem

Mas as nossas mãos

Agarram a longa madrugada.

Respiro o teu perdão

Respiro o teu perdão

Ouço ao longe as tuas asas de anjo florido

Qual pomba longínqua esvoaçando impávida e bela

Já não sou o peso da folha murcha que sobe no céu escarlate

Sou eu...repara...elevei-me das noites duvidosas

Ergui-me em frente à multidão

Com todo o peso da minha queda sobre os ombros

Levantei os olhos e lá estava tu na planície oscilante

Onde pontificavas

Como uma aurora que também se erguia do sono

Eras o meu verdadeiro respirar

O lago que absolvia todas as minhas enfermidades

E todos os meus pensamentos

Eras o anjo resplandecente que estendia os seus braços para mim

Eras a minha pomba rósea que me absolvia...e me aconchegava

Como uma montanha sorridente

Que saía da bruma lilás trazida pela alvorada

Lembro-me que o ar era húmido e juntos bebemos a claridade

Como quem não precisa de amanhãs!

O pão do amor

Faça-se silêncio no mundo

Cascatas poisem nos teus ombros

Fúteis são os caminhos a percorrer

O destino é um só

Corpos e braços...vagas sentidas de amor

Paz talhada em corpo nu

Encontro de ramagens...vértice de flor

É assim o nosso destino

É assim a nossa flutuação num lençol de renda

Palavras que não se sabem dizer

Ecos de poesia que se sentem no coração

Mergulhamos em lagos de coisas sentidas

Tu e eu acesos...tu e eu num mundo de naufrágios

Sentinelas de luz pueril a encomendar o sonho

Tanto peito....tanto paraíso...tanto abraço

Somos a esfera rolando por dentro dos beijos

Somos o círculo que nunca se quebra

O musgo que se agarra às pedras

E só há um caminho...um único caminho

Para descobrir o perfeito desejo de estarmos juntos

Para rasgar as avalanches

Que se precipitam na nossa luz

Por fora de nós as tardes amenas

E nunca é tarde para percorrer as sombras dos bosques

Para sermos o centro de dois corpos

Para sermos plenos como um cosmos sem fim

Para sermos apenas duas espigas doiradas

Que se constroem grão a grão

E que são o pão do amor que nos alimenta.

 

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