Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

Reconstrução

Sonho-me e escrevo-me

Sou o papel que se vê livre de mim

O tempo sacudido por batalhas

O lugar onde os segredos falam sozinhos

Afundo-me mesmo antes de acordar

Sou a nocturna luz que se queixa do dia

Diálogo de pés afundados em todos os passados

Em todos os etéreos cemitérios...

E sou eu..afinal sou sou eu

Que abro a porta ao túnel escuro

Sou aquele que é mais antigo que o tempo

E se houvesse tempo para mim

Espreitaria através das pálpebras semicerradas

O soletrar da terra...a pressão do ar

Sacudo-me de todos os pós do caminho

Alivio a minhas costas de todos os antepassados

Sigo a minha marcha...

Numa marcial ausência de leis

Num ditar de segredos para reescrever os sonhos

Fusão de mim...sem hora nem preço

Pedaço de luz a cair na ravina do dia

Diálogo esventrado...sigo os pássaros cegos

Apanho os meus restos...aqueço-me

Como um graveto ao luar

Enfrento os morcegos que navegam no escuro

Calcorreio a direcção que a luz toma ao entardecer

Como se soltasse pedaços de mim

Pedaços que tenho que voltar a empilhar

Para me reconstruir...

 

É o mar que nos espera

Éramos tão felizes se perdêssemos a memória

Se as palavras se apagassem

Se as mãos girassem em redor de um corpo em êxtase

Um corpo vencido pela luz

Como uma música incandescente

Envolvida num profundo incêndio

Seria um queimar de alma

Um esventrar de coxas sedosas

Um grito de uma mulher incendiada

Em vez de ar...seria tempestade

Mar revolto...abismo em chamas

Fronteira que flutua num lago feito de cavalos selvagens

Lago construído gesto por gesto

Como o flutuar redondo de um ar arrepiado

Luto de mão molhada pela chuva

Frente a frente...o choro

As teclas de uma vida tocadas em silêncio

Quem quer chorar nesse rio feito de barro

Nessas margens incapazes de capturar as águas

Onde incêndios convalescem moldados pela nossa mão

Formam montanhas de peitos abertos ao delírio

Profecias rasgadas...olhos ao vento

Pesadelos leves como folhas tempestuosas

Flutuantes como sexo etéreo

Há qualquer coisa num segredo sonhado

Algo que se coloca em nós

Algo que estanca a vontade de enterrar a própria terra

E nos faz sentir a vulcânica temperatura

Terror de chuva afundada na lama negra

Barro feito de braços longos

Incapazes de escavar mais a vida

Chega-se ao fim do pontão

E é o mar que nos espera!

Dança imaginária

Sinais ruídos luzes sombras

Emparedados numa dança de corpos arqueados

Vejo o meu corpo dobrado...nada mais que eu

Apenas uma folha azul....

Tombando no desamparo de uma memória feliz.

 

Escavo a areia...procuro o mar escondido

Quero desvendar a palavra que escuta a minha

A harmonia tamborilando numa dança...

Escuto a montanha

Que trago na desobrigação de ser tempo

De encher páginas...de erguer joelhos

De formar frases em abismos apagados

Como se o peso da angústia

Tombasse para o interior de um violino imaginário

E depois...por magia

Dali saísse amparada em danças pujantes

Esquecidas de tudo...

 

Estamos salvos

Amanhece no mar.

Chegam agora à praia as sombras das nuvens

Bocas estranhas procuram a água

Delírio de mãos misteriosas

Inundadas de areia.

 

Lívidas águas coladas a corpos

Que desfiam bocados de pão..é a fome da noite

Prata de luar voador estendendo-se sobre os sargaços

Suave ondulação de água e corpos

No rio que se move para além dos nossos cabelos

Eclodem sensuais insectos comestíveis

E tudo nos chega

Como se uma colcha de seda vermelha surgisse no horizonte

Chegam erupções do fundo das águas

Gorgolejam canaviais...garças lívidas pescam

Tudo se entrelaça numa brincadeira de algas e lodo cinzento

Água e mais água

Língua de mar maravilhado pelos corpos feitos de sóis penetrantes

Onde iremos amanhã?

Onde despertaremos o sol?

Onde refaremos o nosso dia?

As águas continuam olhar-nos

Não têm indecisões...seguem sempre as gaivotas

Pudesse a frescura dessas águas dormir num quarto sobre o rio

E o nosso corpo seria feito de coral azul

Vermelho nas arredondadas pontas sensíveis

A boca sentada junto às flores

Amanhece como um sol nítido

Escamada carpa saltitante

Agora...é quase noite outra vez

O dia arredonda-se numa nostalgia de febre luminosa

Chega até nós o repouso

Desfazemos o corpo em pequeníssimos ventos

Enviamo-lo pela estreita bruma

Já não o seguimos...estamos salvos!

 

Céu e Terra...em comunhão! 1foto1texto

DSC_0542.JPG

Deixámos de escutar o chão

O ocaso derrama-se pelas árvores em fogo

As mariposas levam nas asas cores assombrosas

Sente-se no ar danças devoradoras

Dias desfeitos

Dias que não cabem dentro de nós

Somos fantasmas tresmalhados

Que rasgam telhados e céus

Numa agonia de estrelas feitas de lata

Mas os homens emergem de um chão em êxtase

Ao lado de garrafas vazias

Vestem roupas de cal branca

Espelhada sobre a manha amena

Invisível manhã que se debruça na erva

Como dança de animal cansado

Esmagado sobre o horizonte nu

No porto lavam-se gaivotas

As laranjeiras antecipam as flores

Não obedecem ao tempo

Apenas se derramam em firmamentos longínquos

E nós vestidos com felpudos trajes de alucinar

Caliça de um tempo desconhecido...magro

Possuído por rumores esvoaçantes

Derramando chagas ornamentadas

Por aves apaixonadas

Voo oblíquo de finos contornos

Fronteira desapossada de horizonte

Céu e Terra...em comunhão!

Como se nós amássemos a nós mesmos

Emerge a tua imagem das páginas brancas

Olhos sentados em ti

Livro escaldante de cor que atravessa o tempo

Cegos rios que te levam

Desfilam por mim todos os idiomas

Quero que os ecos te falem

Que acredites que os espelhos são águas claras

Por onde passam os restos de nós

Do rio emergem estradas

Onde faltam os teus olhos claros

Harmonias de mundos

Que estendem os seus ramos sobre a paisagem

Nascimentos cruzados que levam a estradas infinitas

Como nós mesmos

Que somos donos da suavidade

Que cria todos os martírios

Que nos faz crer que somos pessoas

Emergindo do escuro...amando os outros

Como se nos amássemos a nós mesmos...

Candeiro

Alma em gestação permanente

Nascida da música que se desfaz na noite

Ritual antigo de silêncios mastigados

Teia de aranha murmurando a sua posse

Estendendo as quelíceras

Veneno adocicado pelo pólen do tempo

Doçura de mulher emergindo da chuva

Desfilando pela paisagem inerte

Balançando sobre mim

Como um pêndulo aquático

Ampliado pelo som das pernas

Que criam harmonias de prazer

Que desaguam suavidades

E dentro de mim nascem

Mundos habitados por grandes céus escarlates

Luminescentes por fora...cegos por dentro

Misturas de pó feito de loucuras

Que acreditam nas sombras do tempo

Engelhado...desfigurado

Pelas páginas de uma história que balança enroscada

Nas mãos sem eco...desafinadas

Sem forma de encontrar a luz

Escura maresia que mastigas os corpos

Que refrescas posse desses corpos

Como abelhas acumulando mel

Numa agonia de barco infeliz

Que desfila num chão descolorido

Como se o mundo fosse um esguicho magro

Que dança numa teia sem idioma

Onde o silêncio é um candeeiro

Esquecido sobre si mesmo

Alumiando-nos sofregamente!

Algemas de areia

Empenhamos a nossa própria pele

Medimos os dias...fugimos de nós

Sonhamos numa língua estranha

Como se fosse um rabisco ilegível

Procuramos o mar

Receamos a nossa própria casa

Somos a luz dormente

O fruto caído no chão

O som de metal reluzente

Hálito de mãos cegas

Decalcadas de um tempo escuro

Infatigável sombra

Que nasce sob uma água gorgolejante

Vinho mastigado em silêncio

Acende-se a luz e percebemos que partimos

Que o escuro roda indefinidamente à nossa volta

Como um fruto ossudo

Teia de aranha metálica

Algema de areia

Aninhada no fundo de um fruto amargo

Poisamos os pés num hálito bêbado de sonhos

Berço feito de tela inimaginável

Rabisco de lugares

Envoltos em terras empestadas de ladainhas

Sobreviveremos...

 

 

 

 

 

Ilusão e amor

Vejo barcos carnívoros descendo rios imaginários

Vejo pedras filosofais sem qualquer préstimo

Espreitando os nossos segredos

E os uniformes que a alma veste

São impúdicos cavalos escorrendo baba

E mesmo que as noites não nos abracem

Desceremos a escada do tempo pedregoso

Como sombras vazias ao alcance do horizonte

Sobreviveremos como náufragos em flor

Imortais frutos de um pomar absurdo

Construiremos gigantescas fábricas de sombrios sonos

Desolação abraçada a um reino fantástico

Residindo numa fantasia de crianças

Julgaremos que as palavras cairão das nossas bocas

Escorrendo sobre as paredes das casas

Moldando imagens em panos rotos

Devoraremos vozes e choros

E toda a nossa vida será uma lágrima desfigurada

Um imenso coração que cavalga um mar de espantos

Mas seremos ilusão e amor!

 

Quem nos poderá ler? 1 foto 1 texto

08-06-2014 048.jpg

Escuto as cigarras

O desespero percorre o meu quarto

Largo e profundo mundo de coisas pouco importantes

Exalo tempestades...fujo

Bebo sonhos como quem caminha por atalhos

Luzes abertas no meu espírito cansado

Sou o solo de nada...de coisa nenhuma...de lado nenhum

Arrepio bloqueado no escuro

Se a lua encobrisse todos os tédios

E todos os nomes dos meses

Se a lua encobrisse tudo o que trago pendurado em mim

Que é muito pouco

Um quase nada que me entontece

Um fugir pela madrugada pedregosa

Como um chão empestado de corpos prostrados

A fugir...a fugir...a fugir...

A fugir de uma noite que me amarra a outro dia

Que me atira para lugares espessos

Sonhos espaciais

Fervendo no ventre da terra encoberta pela noite

Risco de silêncio molhado pela cacimba da alma

Braços abertos a lugares infinitos

Nuvens que bebem os meus arrepios

Perguntas infinitas...mães de todas as respostas

Somos livros escritos....descritos...belos

Mas quem nos poderá ler?

Pág. 1/3