Estamos salvos
Amanhece no mar.
Chegam agora à praia as sombras das nuvens
Bocas estranhas procuram a água
Delírio de mãos misteriosas
Inundadas de areia.
Lívidas águas coladas a corpos
Que desfiam bocados de pão..é a fome da noite
Prata de luar voador estendendo-se sobre os sargaços
Suave ondulação de água e corpos
No rio que se move para além dos nossos cabelos
Eclodem sensuais insectos comestíveis
E tudo nos chega
Como se uma colcha de seda vermelha surgisse no horizonte
Chegam erupções do fundo das águas
Gorgolejam canaviais...garças lívidas pescam
Tudo se entrelaça numa brincadeira de algas e lodo cinzento
Água e mais água
Língua de mar maravilhado pelos corpos feitos de sóis penetrantes
Onde iremos amanhã?
Onde despertaremos o sol?
Onde refaremos o nosso dia?
As águas continuam olhar-nos
Não têm indecisões...seguem sempre as gaivotas
Pudesse a frescura dessas águas dormir num quarto sobre o rio
E o nosso corpo seria feito de coral azul
Vermelho nas arredondadas pontas sensíveis
A boca sentada junto às flores
Amanhece como um sol nítido
Escamada carpa saltitante
Agora...é quase noite outra vez
O dia arredonda-se numa nostalgia de febre luminosa
Chega até nós o repouso
Desfazemos o corpo em pequeníssimos ventos
Enviamo-lo pela estreita bruma
Já não o seguimos...estamos salvos!