A lua é uma dor que espreita
Nas minhas veias corre o Tejo
Nos meus olhos crescem tatuagens de balas
Vejo vigílias nas vozes empastadas das serpentes
Animais eléctricos...fases da lua
As flores murchas das árvores
Dizem-me o que não posso saber
Perdi-me na sala de espera de uma sombra
Soçobro fora de mim....
Sou apenas o sangue que me toca na pele
Uma esquina onde me esqueço de sorrir
Acredito que a lua executa bailados em cima das fontes
Nas águas nuas
Nas janelas das casas que percorre
A lua é uma dor que espreita
Pelas nádegas de uma ninfa delirante
Lâmina de punhal endoidecido
Bochecha encardida que suporta o sono onde me escondo...
Secretas palavras sobem-me pela goela
Aflito delírio de sangue entornado
Imagens de gladíolos surdos
Peitos frios...sonhos de destruição
Clamor de corpo ao vento
Solta-me a alma...côncava ave negra
Habito territórios onde as palavras se esquecem
Sobre as mesas vazias focam-se filosofias de jovens raparigas
Cadeiras soltas ao vento
Que uiva sobre as noites esquecidas
E eu bailo com os mortos
Desço aos seus covados
Sustento-me de insectos que me queimam as vísceras
Estou repleto de macias ruas
Onde se plantam deuses loucos
Onde se fotografam fantasmas
Permanências de sorrisos delirantes
Deixa-me morrer antes de aprender a sorrir
Quero pisar o ócio...e o ódio
Reorganizar a síntese dos pesadelos
Vomitar...muito...mas em voz alta...
Encontrar-em em todas as coisas que não fazem sentido
Ser o obreiro dos caixotes do lixo
Mas como posso eu saber
Qual a queixa que percorre a noite?
Como me posso abrigar do frio
Que se sobrepõe a uma língua quente?
Como posso saber qual é o rumo que o corpo me traz?
Se eu me esqueci do sentido
Que habita na courela dos pesadelos
Se eu me estrangulo sob uma árvore secreta
Ou me escondo numa cidade rota
Onde a música implora
Por pássaros enfeitados com estrelícias comestíveis
E todas as noites cuspo na vida
Apunhalando-a com a minha boca incandescente...
Porque sou feito de uma ânsia esculpida em nada!