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Uma coisa é uma explicabilidade inexplicável...Hugo von Hofmannsthal

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Uma coisa é uma explicabilidade inexplicável...Hugo von Hofmannsthal

UMA ESTRELA - O MAIS BELO CONTO DE NATAL #parte 1

Peço licença ao grande poeta Manuel Alegre para transcrever o seu conto de Natal dedicado à sua avó Margarida:

Todos os anos pelo Natal eu ia a Belém. A viagem começava em Dezembro, no princípio das férias. Primeiro pela colheita do musgo, nos recantos mais húmidos do jardim. Cortava-se como um bolo, era bom sentir as grandes fatias despegarem-se da areia, dos muros ou dos troncos das árvores velhas, principalmente da ameixieira. Enchia-se a canastra devagar, enquanto a avó ia montando infra-estruturas junto da parede da sala de jantar que dava para o jardim. Eram caixotes, caixas de chapéus e de sapatos viradas do avesso, tábuas, que pouco a pouco ela ia cobrindo de musgo, ao mesmo tempo que fazia carreiros e caminhos com areia e areão. Mais tarde, os rios e os lagos, com bocados de espelhos antigos, de vidros ou mesmo de travessas cheias de água. Até que todos os caixotes, caixas e tábuas, desapareciam. Ficavam montanhas, planícies, rios, lagos. Eram uma nova criação do mundo. Aqui e ali uma casinha ou um pastor com as suas cabras. E todos os caminhos iam para Belém.

Não era como o presépio da igreja que estava sempre todo pronto, mesmo antes do menino nascer. A cabana, a vaca, o burro, os Três Reis do Oriente. Maria, José, Jesus deitado nas palhinhas. Via-se logo que era a fingir. Não o da avó era mais que um presépio, era uma peregrinação, uma jornada mágica ou, se quiserem, um milagre. Nós estávamos ali e não estávamos ali. De repente era a Judeia, passeávamos nas margens do Tiberíades, andávamos pelo Velho Testamento, João Baptista baptizava nas águas do Jordão e subiram aquele monte onde Moisés sem lá entrar, viu finalmente a terra onde corria o leite e o mel. Mas agora era o Novo Testamento. A avó ia buscar as figuras ao sótão, eram bonecos de barro comprados nas feiras, alguns mais antigos, de porcelana inglesa, como aquele caçador que a avó colocava à frente dizendo: este é o pai. Seguia-se a mãe, de vestido comprido, dir-se-ia que ia para o baile, mas não, saía de cima de uma mesinha da sala de visitas, e agora estava ao lado do pai, olhando levemente para trás onde, entretanto, a avó já tinha colocado figuras mais toscas, eu, a minha irmã, os primos, alguns amigos, todos a caminho de Belém.

(continua)

 

 

Uma rena chamada Rudolfo - o meu conto de natal

Uma  rena chamada Rudolfo

Enfim, tinha chegado a noite de Natal. O menino que todos os anos recebia uma pequena prenda, uma vez que os pais não lhe podiam dar muito e até achavam que o Natal não deve ser um tempo de rendição ao consumismo, queria nesse ano conhecer o Pai Natal, ou São Nicolau, que é afinal o nome dele. Mas o menino sabia que não podia estar à vista quando o Pai Natal descesse pela chaminé. Isso era outro dos mistérios que ele queria desvendar, como é que o Pai Natal cabia na chaminé se ele próprio que era mais pequeno não cabia lá? Tinha que descobrir. Por sorte dele, os pais haviam comprado uma mesa redonda e tinham-na colocado a um canto da cozinha. A mesa estava coberta por uma toalha com motivos de Natal que chegava ao chão. Era aí que o menino planeava esconder-se. Então, nessa noite, depois da Missa do Galo, foram todos para a cama. Mas o menino não adormeceu. Esperou que os pais adormecessem e levantou-se. Como estava frio o menino colocou um gorro vermelho e branco exactamente igual ao do Pai Natal. Esse gorro em tempos tinha tido um pequeno guizo que tocava sempre que o menino corria ou até quando se ria, como se esse guizo participasse na sua alegria. Mas o guizo havia desaparecido. Ah, e para não esfriar levou também uma mantinha com a qual se tapou depois de se esconder debaixo da mesa.

Passado algum tempo, quem é que aparece descendo com alguma dificuldade pela chaminé? O Pai Natal. O menino não queria acreditar, sorrateiramente desviou um pouco da toalha de mesa e ficou deslumbrado. O PAI NATAL! Só que o velhinho Pai Natal, que sabe tudo e vê tudo, também sabia que o menino estava ali escondido. Então afastou a toalha de mesa com motivos de Natal e fez uma cara feia. O menino entre envergonhado e temeroso, escondeu a cabeça debaixo da manta, e foi então que ouviu uma gargalhada descomunal. Uma gargalhada que só ele ouviu, porque essa gargalhada era só mesmo para ele, e era o Pai Natal a rir-se com imensa vontade.

    - Então estás aí escondido, olha que eu vejo tudo, a mim ninguém me engana – disse o Pai Natal.

   - Peço desculpa, mas queria tanto conhecê-lo – disse o menino gaguejando.

  - Pois bem, e se viesses comigo distribuir os presentes, queres? – disse por sua vez o Pai Natal.

  - Se quero, é tudo o que eu mais quero, mas como é que vou passar na chaminé? - respondeu o menino – e além disso se os meus pais acordam e não me vêem ficam preocupados.

  - Não te preocupes, queres ver? - e o Pai Natal estalou os dedos e imediatamente estavam os dois em cima do trenó    – e quanto aos teus pais, sossega, pois estarás na tua cama quando acordarem - disse o bom velhinho.

   O menino estava maravilhado, via toda a cidade com as suas luzinhas a acender e a apagar. Via as árvores de Natal em cada casa com as suas iluminações. E até via em alguns telhados uma pontinha de neve.  Mas via também algumas pessoas sem casa que dormiam ao relento,  e compreendeu que o Natal  para alguns não é motivo de alegria. Entretanto com o andamento, um dos guizos da rena Rudolfo começou a fazer um barulho esquisito. O guizo estava a soltar-se. O Pai Natal parou o trenó e tirou o guizo à rena e guardou-o no bolso para que não se perdesse. E lá foram distribuindo os presentes. Ao chegarem perto de uma casa o Pai Natal disse ao menino. - aqui mora um homem mau, mas o filho é bom rapazinho e não tem culpa do pai ser como é, vou dar-lhe um presente. Então o menino percebeu que o Pai Natal tem um coração enorme. Um coração do tamanho do planeta, ou até do tamanho de todos os planetas, quem sabe.

Acabadas de distribuir todas as prendas, o Pai Natal veio trazer o menino a casa.

De manhã, logo cedinho, os pais levantaram-se e foram ao quarto do dele, que dormia profundamente. Pudera, uma noite inteira a distribuir prendas. Mas ele acordou, esfregou os olhos e extremamente feliz disse aos pais que tinha conhecido o Pai Natal e que tinha andado toda a noite com ele a ajudá-lo a distribuir as prendas. Os pais fizeram um sorriso disfarçado porque tinham dado com o filho a dormir debaixo da mesa da cozinha, com o gorro posto, embrulhado numa mantinha e com os pés fora da toalha de mesa. Então o pai tinha pegado nele ao colo e tinha-o levado para a cama sem que ele tivesse acordado.

  O menino levantou-se, e como era a manhã do dia de Natal, foi logo à chaminé buscar a sua prenda ao sapatinho, mas antes, colocou o seu gorro exactamente igual ao do Pai Natal, e que tinha na ponta, sabem o quê? O guizo da rena Rudolfo.

Cancioneiro Joco- Marcelino - Marcelo até Almeida

Nos próximos dias vou publicar uma série de poemas de Natália Correia, dedicados a Marcelo Rebelo de Sousa, aquando da sua candidatura à Câmara Municipal de Lisboa e que, no fundo, também é uma caricatura da sua actual Presidência da República:

Marcelo até Almeida

Da cartola ofícios piedosos

tira Marcelo que em humilde mística,

do papagaio os bicos dolorosos

para carregar o lixo, mortifica.

 

Vencendo o asco que ao menino bem

da vil lixeira o tremedal provoca,

vomita, mas a estrela de Belém

para à Câmara o guiar Marcelo invoca.

 

Chorando pérolas amrgas no chiqueiro

num andar aos papéis que não tem fim,

a Santo António de Lisboa milagreiro

Marcelo oferece o derreado rim.

 

E em purgante epopeia camarária

do martírio fazendo nova Eneida,

proclama em santidade proletária:

não me chamem Marcelo, eu sou Almeida.

Gólgata - quinto poema de Natal

Quando em ti penso

criança eterna

imagino-te feliz

naquela caverna

 

és Graça e Luz

és dor e aflição

mas todos quiseram

pegar-te na mão

 

mas tiveste a sorte

de pastores e Reis

os Magos da corte

foram-te fiéis

 

Deram-te presentes

a mirra e o mel

e também o ouro

que veio dos Orientes

 

E então mais tarde

foi este o teu fado

no Monte Gólgata

acabares nu

numa cruz pregado.

 

 

 

Menino de alma - quarto poema de Natal

Neblina de sonho

menino de alma

mostra teu sorriso

mostra tua calma

 

Tu és a esperança

de quem a não tem

a ti a pedem os homens

na noite que aí vem

 

Secreta criança

afago de paz

brilho e lembrança

e luz que te traz

 

Sonhas como eu

com histórias de luz

és filho plebeu

e Rei que seduz

 

Nasceste nas palhas

cresceste no chão

ensinas aos homens

toda a salvação

 

 

 

A noite mais bela - terceiro poema de Natal

Limo de luz

filtro de paz

perdoa os homens

se fores capaz

 

Esquece o fulgor

do ódio que brilha

naqueles que falam

que Deus é amor.

 

Menino pequeno

Extrema aflição

Por seres moreno

Deram-te o chão

 

Molha teus olhos

com sangue de guerra

acalma os escolhos

traz a paz à terra

 

E mesmo que os homens

façam suas guerras

mostra – lhes a esperança

das palhas eternas

 

Porque sabes bem

os caminhos do pó

ajuda quem sofre

e quem está só.

 

Para que ao brilhar

a eterna estrela

nos venha mostrar

a noite mais bela.

Olha mais longe - segundo poema de Natal

Olha mais longe

Vê a alta estrela

Caminho de foz

Corredor de luz

Um tempo perfeito

Um Deus pequenino

O ritmo das ruas

As luzes de lágrimas

Pinheiro de neve

Límpido corredor

As pupilas acesas

Na pureza do céu

Um grito de Homem

Pesado...absurdo

Um grito intranquilo

O Natal é alheio

Ao negro da guerra

No jogo da penumbra

Uma esperança inteira

Num límpido destino

Numa brisa quente

Num calor de lareira

Numa  paz aérea

Que algum dia virá

Tocando-nos a alma

Como uma exacta fonte

Vertendo caminhos

Junto ao coração

Das estreitas ânsias

Das mães em aflição

Onde involuntários rostos

Um dia florescerão

No berço do Menino

Tão breve tão fino

Tão cheio de mar

Tão cheio de força

No acreditar!

 

 

Trança de luz - primeiro poema de Natal

Trança de luz a enfeitar os olhos

Espírito raro...desconhecido interior

A fé na estrela

O caminho a percorrer

O Menino nas palhas

O berço rude

Que espalha o amor

Os homens pedindo

A força do Redentor

A força que trespassa todas as angústias

A paz que acalma algumas dores

A vida que vem...a vida que vai

A viagem que fica

Belém no caminho

De quem acredita

Num Deus melhor.