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folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

Animais de estimação

Já poucos buscam

Os caminhos lentos das paisagens

Já poucos procuram

A companhia das pedras

Já poucos se incendeiam por amor

É o vácuo...a noite suja

A vergonha reprimida

A membrana macabra

A dor anedótica

Que enfeita uma ópera negra

 

Já poucos escutam

As flores que dizem poemas à lua

E poucos se banham

No lago onde cintilam estrelas

Surdos...sois surdos e cegos

É o que vos digo

 

Surdos e bandidos de vós mesmos

Sem mercês nem piedade nas mãos

Presos a galhos e a fios negros

Marionetas com as goelas sujas

E alma com escaras...

Quero correr-vos a pontapé

Rir-me das vossas nódoas negras

Fazer do vosso crânio a minha taça

Beber por ele e brindar à razão...

Quero ser a electricidade

Que vos dá choques na carótida

Quero juntar todas as vossas abjecções

Uni-las como num colar de pérolas

E pô-las ao vosso pescoço

Como uma trela abjecta

 

Ai gentes castradas

Vermelhas de infidelidades reprimidas

Zarolhas e esventradas

Pelos punhais das angústias

Que certeiras vos apertam o coração

Libertai-vos disso...já

Tirai esse fato escuro que vos aperta

Dançai nus na rua...olhai os animais

Onde pensam vocês

Que eles escondem as vergonhas?

Onde pensam vocês que eles digerem o amor?

Não! Eles não habitam

As grutas tenebrosas dos homens

Eles são como aqueles pássaros livres

Porque os homens que não são livres

Passeiam-se pelas ruas com uma trela

Segurados pelo seu animal de estimação

E... porque és tu

Quero que grites o meu nome

Que berres...que urres

Quero amar-te contra a parede

Quero que deixes lá

A marca das tuas unhas

Nos sulcos...

Como rios de amor a escorrer

Quero que o teu verniz negro

Lá escreva...prazer

E quero tudo isto

Porque é por ti

Que ponho os olhos nos dias

É por ti que invento palavras

É por ti que eu subo

A esse promontório altivo

E... porque és tu

Que me salvas

De mim!

Voo ilimitado

Uivam os cães...

Perante as vénias carcomidas dos loucos

Gentis pensamentos cortam os ares

E um violino taciturno

Murmura poemas

Que rangem de encontro às portas fechadas

 

Fachadas de silêncio

Expõem o delírio do mundo

Um pássaro voa

Como se tivesse pressa de encantar o céu

Ou de poisar nos prados sublimes das nuvens

Muito para além das terras e das árvores

Que o tempo habita

 

Ah se eu fosse uma criança

Com todo o futuro dentro de si

Usando uns olhos

Profundamente sonhadores

Que corressem pelas montanhas

Onde jazem abismos entorpecidos

Pelo marulhar das águas

 

E nessas montanhas

Onde o cimo é habitado

Pelo silêncio dos ventos

Que numa reclusão de sonho

Eu gostaria de habitar

Que subitamente

Aves negras se elevam

Num voo ilimitado...

Caminhos sem retorno

Silvam em mim palavras sem sentido

Abandonadas aos caminhos sem retorno

Porque nesses caminhos ásperos avistei o mar

E senti o cheiro das cinzas

E bebi das centelhas

Que me incendeiam a alma...

 

Generoso é o tempo que se mistura comigo

Generosas são as borboletas

Que pairando na luz

Com as asas comovidas e adornadas

Num bailado agitado sob um sol amarelo

Me relembram o quimérico encanto do que foi

Quebrado pela delicadeza das memórias encantadas

Mentira

Digo-te hoje a verdade

Mentir-te-ei com toda a luz da minha boca

Digo-te que há entre o pensamento e as mãos

Um mundo de espaços nus

Digo-te que as certezas dos olhares

São frases inventadas

Que os anseios captados pelo coração

São incertezas infinitas

Digo-te ofegante e solícito

Que que te embalo entre o pensamento e a razão

Como se fosses uma irrealidade

Calada perante os meus olhos nublados

E digo-te que se a minha boca

Te procura exaltada

É porque lhe dou licença

Para entoar a ária majestosa

Que fará vibrar em ti

Aquela nota desconhecida...

Não se diga

Não sei se diga

Que o homem é igual a Deus

Não sei se diga

Que o homem é um escândalo de Deus

Não se diga

Que o homem é um louco

Liberto das grilhetas da razão

E que pode caminhar

Às arrecuas do tempo

 

Não sei se diga

Que a alma tem perfume

E que a lama enfeita as mãos

Não sei se diga

E que a memória é carregada de ácidos suaves

E de sorrisos...e de elegâncias

E que tem os olhos fitos na avidez do passado

 

Celeste é o leite

Que temos que beber

Requintado é o sorriso

Que temos que sonhar

Fortificantes são as desilusões

Parecidas com a verdade.

Moribundas...moribundas

São as suaves luzes do Universo

 

Fios de seda

Ligam-nos ao seio materno da Vida

Existimos...fortes...ávidos...magoados

Mas também estendemos mãos

Às recepções calorosas do coração

 

Libertamos odores antigos

E ternura nos gestos

Mas também pintamos

Crédulos templos ao ar livre

Sim! Templos ao ar livre

Não esses templos a cheirar a mofo

Onde se escondem os deuses empoeirados

Desses não precisamos

Queremos deuses puros

Que brinquem connosco

Que riam connosco

Que sejam realmente irreais e tocáveis

Que possam ser bebidos com prazer

 

 

Uma flauta

Uma flauta...um pequeno sonho a jorrar verdades

Jethro Tull... songs from the wood

As notas ondulam...

E eu já me perdi na espessura íntima da vida

Mesmo que alguém me chamasse

Eu diria que me esqueci de acordar

Fechei as persianas...

E o fumo do que sou sufoca-me

Quem sabe que pés tem a solidão

Que se levanta em silêncio

Quando a ponta dos nossos olhos

Se consome nas ruas húmidas das saudades

 

Somos símbolos estagnados de quê?

Pomos nomes às coisas

Só para chamarmos as coisas por nomes

Afinal...Deus não tem nome

Não precisamos de o chamar

 

Um dia acordamos

E somos pássaros perdidos em gaiolas de pedra

E tanto mar...e tanto mistério

E nós já sem querer saber...

A altura do meu sonho

Encostado a estes cedros meço o meu tamanho

Tenho a altíssima aura destes cedros que plantei

Cresci com eles...podeios

E quando a névoa desponta nos seus galhos

E o frio se desprende das manhãs

Eu vejo toda a altura do meu sonho...

 

Se eu consentisse eu saber quem fui no meu passado

Se eu quisesse saber que marés a minha vida vazou

Encontraria uma medida para mim

Saberia a que sítio regressar

Como uma criança a quem trocaram as voltas na noite

Mas acabou por encontrar a falésia branca de onde não caiu...

 

Na transparência de mim...seguro o queixo

Prego os olhos na face de alguém que passa

Não falo...esqueci a mornura das palavras

Volto sempre a este lugar...

Mais feito de respirações do que de gestos

Habito as amarras sólidas do poente...sozinho...

No meu peito

No meu peito crescem já os dias mais frios

Por toda a parte se sente o sono das árvores

Todos os caminhos estão livres

Todos os corações

Se entristecem com a sangria das fontes

Sóis cinzentos despontam nas manhãs

Encerradas estão as margens do rio

Restam os suspiros dos flamingos

As hastes das ervas

E o assobio dos ventos...

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