A beleza do entardecer
Pergunto pela luz
Que sopra sobre terra orvalhada
E pelo ar que se eleva do asfalto
Onde se escondem os recantos da memória
Vejo rostos empilhados
Como sentenças a crepitar nas luzes
Sílfides fantasmagóricas
Ligeiros perfumes que fogem dos sótãos quentes
Na rua as árvores apodrecem
Sorrisos salgados abrasam os rostos
Insectos em pose brincam nas folhas amarelecidas
Nem sei se é possível escutar o vento
Ou conhecer a dor de um pássaro tardio
Tropeço na fantasia de uma esquina sombria
De uma sombra quente...a tua sombra
Escuto o crepitar das marés
Onde o teu corpo se afogou...
Também eu me afoguei
Também eu senti a tua pele no perfume das flores
Soube então de ti...
E também soube que não iria atrás de ti
Que te sumirias como uma folha sem sentido
Sem rota nem música
Uma folha presa na garganta
Embriagada de dor
Recuso fazer qualquer gesto
Recuso sentar-me na beira mar
Quero esquecer as conchas
Apenas quero deslizar
Pela recordação do dia
Em que me sentei contigo na paisagem
E nos fomos absorvendo
Como quem bebe a beleza do entardecer...