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folhasdeluar

A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

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A minha poesia, é a minha incompreensão das coisas.

A espuma é o pensamento do mar...

Conversava sobre todas as coisas conversáveis. Falava da irrealidade como se estivesse a empurrar para fora de si a impossibilidade das palavras dizerem o que sentia. Marcava a acentuação das frases com um olhar agudo...atónito...um olhar que falava das coisas que podem não acontecer, como se fosse um oceano a afogar-se a si próprio. Na certeza das mãos os gestos ocupavam todos os lugares disponíveis, eram mãos de tudo e de nada. Mão de fascínio a explanar teorias apocalípticas. Dizia que o tempo só caminhava por dentro dos relógios, que por fora tudo estava parado. Tudo era para ele uma imensa massa de raciocínios desconcertantes. Falava das orelhas do tempo, de como o tempo escuta as pessoas e depois desaparecia por dentro da miragem dos dedos, dizia que era mais um escorrer pelos dedos das pessoas e que os deuses moravam nas gotas de chuva. Gostava de se sentar junto ao rio a imaginar a distância de ali ao nada. Inventava rotas de luz que só paravam dentro dos olhos das crianças e que talvez fosse por causa delas que deus construiu o vento...para lhes afagar os cabelos de seda. E as árvores? Quando falava nas árvores era com se vestisse as folhas outonais,era como se construísse em si o tecto abaulado das emoções que sobravam das gotas do orvalho. Era um sábio que misturava o tempo com a carne e fazia de si um sonho a deslizar pela tela abstrata dos dias. Sonho e luz. Tela e paixão. Cor. Mas não lhe chegava. Um dia achou que tinha um caminho dentro dele. Achou que dentro da sua ânsia havia um trópico de paixão intensa e que a sua obra-prima seria deixar um rasto de esquecimento gravado na pele das pedras. Por vezes gostava de lhe perguntar o que é que ele pensava da espuma, o mais certo seria dizer-me que a espuma é o pensamento do mar e que as algas são neurónios à deriva. Mas e nós? - perguntei – nós somos a tela de deus - disse. Ele fica sentado a observar a sua obra, enquanto as pessoas se desfazem em bichos. Repara- disse-me - os cais são acenos de países distantes, os países distantes são desejos de púrpura pintado no colo dos homens e a poesia são palavras que tombam pela cara dos poetas e caem nos intervalos das paixões. Sabes que quando as pessoas se apaixonam é como se remassem pela candura perigosa dos rápidos é como se lessem um livro sem letras, feito só com pensamentos? Há uma harmonia em todas as coisas erradas, como se as coisas erradas servissem para nos mostrar que as coisas certas são desnecessárias. Para que servem as coisas certas, as palavras certas, os gestos certos? É muito mais interessante a palavra errada ou o gesto errado. Há muito mais utilidade num grão de areia que na soma de todos os espaços vazios. De resto não me lembro de mais nada, a não ser de um espaço que embora inútil,ainda me serve de respiradouro. Um espaço onde me penduro sobre o Tejo, como uma grinalda de cores a agitar o vento, enquanto aliso um sonho e poiso o olhar no infinito.