A luz violeta.
O mundo ergue-se em manchas de luz e névoa. Cresce nos mares. Nos lagos. Nas danças dos fantasmas. O mundo é a penedia e a transparente calma da tarde. Todas as manhãs há o voluptuoso renascer das paisagens. Aguarelas de luz e brancas casas. O mundo é o desmaio de céu na penumbra rósea do horizonte. É o gigantesco silêncio de uma luz crua. É o oco escuro do impulso que nos faz viver. Mas nada nos responde. Nem as longas estradas. Nem a indecisão que cai dos céus. Nem o manso balido do silêncio. Seguimos nesta barca de fundo chato e olhos molhados. Envolvidos em ferrões de incertezas. Alastramos. Alastramos. Puxamos a nossa rede. Pescando o debater dos dias. Somos nós e os nossos pés descalços. É o vinho e o reflexo enganador da alegria. São os nossos estremecimentos e tudo o que largámos. É o que é e o que tinha que ser. É a poeira transformada em homens. É a palidez da alma e o voo das gaivotas. São os areais. São as faíscas da alma a incendiar as vidas. E é a leveza de um olhar a desvanecer-se na bruma. A alongar-se no pontão do cais. Onde o sonho se consome. E o vento enfuna a vela que nos guia. Até que a nossa cinza se afogue numa luz violeta.