A menina negra
Espreito o tejo...
Sento-me à sombra de um enorme e belo plátano
Em frente a mim, no ringue de futebol...
Dois miúdos brancos jogam à bola...não têm mais que treze anos...
Estão de férias...chutam o dia sem peocupações...e riem...
Um deles...pontapeia a bola com mais força...sem direcção..
A bola sai do ringue...
Do lado de fora...
Vem a passar uma menina negra
Aparenta a mesma idade dos rapazes
Colado a si...vem o seu tesouro...puxa-o as suas mãos...
É um carrinho de compras..
Daqueles com duas rodas...que as senhoras puxam..
Quando vão fazer compras à praça...
Mas a menina não vem da praça...
A menina passou à pouco...a porta do banco alimentar...
É lá que fica o mercado da família...
Ao ver a bola...a menina negra...
Larga o carrinho de compras...
Vai buscar a bola e entrega-a ao menino branco...
Que agradece...
Que belo gesto...que admirável simplicidade...
A menina negra...pobre de haveres e grande de alma...
Deixa o seu caminho e baixa-se para apanhar a bola...
A bola do menino...
Que não sabe onde fica o banco alimentar...
Ali não houve cor de pele...
Ali não houve riqueza nem pobreza...
Ali estavam duas crianças e uma bola...
Sem subterfúgios nem falsos orgulhos...
Aquela menina negra deu uma lição de riqueza...
Mostrou como é grande a sua alma...
Aquele gesto fez-me acreditar no futuro...
Aquele gesto salvou-me o dia!