A rotação enigmática dos dias
Aqui e ali uma sombra. Aqui e ali uma descida vertiginosa. Aqui sempre aqui...a rotação enigmática dos dias. No horizonte ergue-se uma pirâmide. A luz traça anéis multicolores. Espantosamente apetece-me dizer basta de mãos e de acenos. Basta de joelhos apoiados em tacos de madeira. De bancos de igreja. De vómitos e de condescendências. Por um instante...apenas por um instante...apetece-me roçar as costas nuas numa parede de cimento vivo. Apetece-me semicerrar as pálpebras e desaguar para dentro de mim. Apetece-me fumar os ressentimentos. Apetece-me cair de borco numa nuvem estelar. E também me apetece sorrir...de mim próprio.
Desejo um dia limpo. Um dia hipnótico. Um dia em que possa inventar mais uma forma de sentir. Um dia excêntrico. Sem o papel químico dos outros dias. Um dia onde os olhos sejam botões em flor. E as palavras sejam silêncios a rodear-me por todos os lados. Gosto dessas palavras silenciosas e também das pessoas silenciosas. Essas pessoas que são apenas nuvens de fumo em que vale a pena tocar. E que se dissolvem na nossa vida...como quem se apaga e renasce no outro.