A transparência das vagas
Ele vinha todos os dias como quem caminha dentro de si. Transportava uma alegria inocente. Caminhava como um riso aberto às folhagens. Os olhos eram luminosas taças por onde bebia o mundo. Gostava do mundo. Sentia as coisas como se fosse íntimo da vida. Tinha poucos silêncios e não possuía obscuras verdades. Não procurava descobrir os sinónimos das distâncias. Tinha o peito aberto ao mar e à maresia. Era o sopro das leis imutáveis do universo. Era o universo. Era um nome sem nome dormindo na leito do pasmo. Abria os braços e abraçava o vazio como se fosse livre. Era livre. Surfava o vazio. E descobria a força de ser ave. Era a vela engastada no ventre do vento. Construía poemas como se fossem estátuas. Absorvia o tempo em rotas imaginárias. Em cada mão uma nuvem. Em cada lua uma encruzilhada. Era a pura memória dos temporais. Vivia nos temporais. Como quem compreende o azul dos céus. E adormece nas transparência das vagas.