Aos vencidos resta-lhes a sombra
Nas minhas mãos carrego o vidro dos dias
No meu olhar tilintam fantásticos mundos
No meu corpo forrado de tule negro
Nascem gestos de rios
E peço aos céus
Que me matem a fome de espaço
Que na minha alma
Adormeçam as memórias dos medos
Oiço o vento...
Oiço o eco dos seus uivos aguçados
E a noite é um ácido
Que me penetra na pele arrepiada
Sinto a sede...
Sinto os murmúrios do deserto
Que se lavam em mim
E quando o frio me sobe pelos ossos
Quando se aloja nos meus sentidos
Lembra-me a impotência
De ser pálpebra aberta ao sonho
E penso nos dentes que rangem
E no sangue que corre... à solta
Como se levasse o medo
A todos os recantos do meu corpo
Como se fustigasse
A chama da vela que acendo ao pranto
Mas ergo-me...intacto...estilete e memória
Sede e cidade a clamarem por mais luz
Porque aos vencidos...resta-lhes a sombra...