Aspiro a noite
Despeja a monção a sua água sobre o eco turvo do silêncio
As velas dos barcos falam do peso das algas sob o casco
Há uma ave nocturna que cintila nos sonhos boquiabertos das paredes
Onde está a noite destinada à voragem das almas?
Onde estão os rumores dos búzios sonolentos?
Que círculos compactos descreve a noite no sono desanimado das trevas?
Escuto a imobilidade da nostalgia impenetrável
As árvores agitam-se na ponta fumegante da luz
Há uma traição em cada dia e um aço estranho aperta-me os pulsos
Descrevo-me como um animal de pálpebras cerradas
Procuro-me como um astro dentro de um caminho estreito
Adivinho-me no silêncio das palmeiras...
Esperando pela voragem de um tempo indeciso
Que se agarra às paredes esbatidas do meu quarto.
Esperando na distância do meu peito
A queda vertiginosa do meu corpo oceânico...
Na treva húmida de uma janela onde me curvo sobre o parapeito
E aspiro a noite que lentamente se agarra à minha voz
Como se fosse a íris de uma noite onde vejo inteiro.