Dor
Dói-me a saudade que ainda não sinto
Dói-me a saudade de um amor puro e lindo
Dói-me o dia incerto e o fugaz momento
Tu ou eu quem ficará
Quem planta a flor?
Quem de noite vem espreitar as constelações
Quem espevita a lareira
Quem se emociona com a vermelhidão do poente
Ou com a luz nocturna das estrelas no mar profundo
Quem escutará o teu riso cristalino
Riso puro de criança com sonhos
Riso puro de adulta simples
E a calma amplidão dos abraços
A quem os poderemos oferecer?
Mas eu sei que um dia lá estaremos
Podando o nosso canteiro de rosas
Colhendo as flores das hortências
Fazendo marmelada com a nossa pequena colheita.
Dói-me a saudade que ainda não sinto
Dói-me a dor que ainda não tenho
Mas sei que sempre te procurarei
Que todas as esquinas da lua não te podem esconder
Que numa solitária praceta do céu
Te esculpirei uma estátua de estrelas
É isso que este gume que me corta me diz
Que quando alguém se transforma em ar
Miríades de flores desabrocham
Em jardins de encanto e paz
Que quando o seu rosto se esvai
Uma lenda de amor cresce no peito de quem fica.
Dói-me este pranto interior que não choro
Dói-me este céu onde não posso chegar
Dói-me o invisível e a serenidade da morte
Dói-me a profundidade da Via Látea
E o espantoso silêncio dos céus
Mas sei que um dia lá entraremos
E como uma brisa ligeira
Correremos ao nosso próprio encontro.