E logo de manhã vejo a noite..
E logo de manhã vejo a noite..enseadas... recantos..espigas imobilizadas no medo
Do alto descem dádivas..gestos coloridos..colibris alucinados..instantes madrugadores
Ao meu redor dispersam-se sons de harpa...
Será que me esqueci de ouvir o que resta de mim?
Da terra nasce a gravidez...começos de madrugada...ausentes pétalas macias
Onde será que fica a margem extrema?
A margem onde dos vagabundos descansam...o lodo..os peixes..os poetas
Onde será que dormem os peregrinos dos espelhos?
E onde ficam os restos das saudades dos pastores?
O pôr-do-sol banha as pétalas..húmus irreal..descanso de batalhas e obuses
Ainda tenho na lembrança o instante em que colori a cidade com sonhos adolescentes
Ainda me lembro dos néons..das avenidas..
Dos olivais em que divagava junto da fome ...numa azinhaga feita de pedras emudecidas
A cidade era o meu recanto sibilino..o caminho..a noite..as estrelas..espelhadas na rua
Em volta de mim amoras enterneciam-se com o calor do verão
Amadureciam em minhas mãos feitas de água e penedias
As agulhas dos pinheiros eram breves infinitos..esparsas rectas...areias tremeluzentes
Nada fazia crer que do medo nasceriam..
Olhos e unhas e finos fios que nos atavam aos bosques
Hoje tudo mudou..as mãos já não são areias..a noite são circunferências..
O silêncio é uma semente de aqui e ali...