E nada acontece
São quatro da tarde...
E nada acontece no lugar onde os crisântemos abriram
Talvez lá mais para a noite
As horas despertem sobre as folhas murchas
E o amor inicie o jogo dos abraços e das utopias
Março embacia os vidros
Os olhos já sentem o local onde corre o mel
Amplos frios desconhecidos assombram a terra
Há muito que a natureza nos fala de esperança
Tanto nos faz agora que o paraíso nos confunda com deuses
E que a brisa sopre sobre o envidraçado dos olhares
Voltamos o rosto para o sol
Sabemos ser gente que se renova com o calor
Não há limites para o cantar dos pintassilgos
Nem para a eternidade fria do silêncio
Sob as fachadas os ombros descaem
Como jogos perdidos de saudade
E as velas enfunam
Como arcos de papel colorido debaixo do céu azul-frio
Na luz desenham-se leis que fazem curvar o corpo
Intactas como lanternas ulcerosas
Esqueçamos o jogo e a boca que sucumbe ao direito de falar
A boca que consente que o estio a cale
Como se fosse a fonte seca das palavras
Sejamos o pródigo alimento da estrada
Os pés descalços da esperança
A folha de palmeira que envolve o corpo em ardores de festa
Sejamos o reflexo das coisas sem reflexo
A distância que se percorre num país sem distâncias
O alimento das coisas que se dissolvem numa maresia dissonante
Mas esta enorme falta de sentir
Que não encontra resposta
Nos limites ensolarados dos dias
É apenas o papagaio de papel
Que procura a grande lonjura das águas
Que se renovam a cada trinado de granito.