Era o primeiro cheiro
Era o primeiro cheiro que me chegava de ti
Um aroma a algas e sal
Fugias da água com um nevoeiro arrepiado sobre o corpo
E um volumoso aborrecimento a cair dos teus seios frágeis
Querias dias agressivos
Para onde pudesses fugir desse espesso dia ofuscante
Gritavas sobre as frágeis dunas que o vento desfolhava
E eu comia as horas
Pousado nas algas escorregadias e sujas pelas águas turvas
Tu enfeitavas os lábios com instantes feitos de areia
Talvez gostasses desse sabor a março
Talvez quisesses brincar às marés
Porque subias e descias sobre mim
Como um cair de vestidos enfeitados por túlipas azuis
Depois era o frio...o choro
Os desejos desmoronados como aves
Eras um opaco espelho que chorava
Sem saber que os instantes são lunares..
Que os momentos são plumas de segredos
Que bebem perfumes afrodisíacos
Depois olhavas o futuro como alguém ausente
Como um coração inflamado sobre a areia
Que se dispersa numa covinha que o mar apaga
Fugias desses recomeços antes de começarem
Como se estivesses enfastiada de tédio
E eu rolava sobre ti...invisível e estridente
Sentindo um sensual prazer em te sujar o corpo
E tudo recomeçava...a noite e o seu marulhar inquieto
As marés sulcadas pelos barcos que levam os sonhos
Como crianças feitas de nevoeiro
E só ficavam os cheiros
Que sozinhos na praia lembravam restos de poemas
Escritos num tempo em que as aves cortavam o ar!