Escavo a forma da cidade..
Escavo a forma da cidade...longe de mim pensar que na sedução da chuva há um festim
Na penumbra dou nomes às coisas que me habituei a olhar
Ano após ano abro a terra...crio mundos onde nada obscurece a visão
Divido a noite em pequenos passos..habituei-me ao fogo dos corpos
E passo pela treva como quem quer pertencer apenas a outro tempo..a outro espaço
Por vezes incendeio as ruas...faço delas argila..levo-as ao lume brando do fascínio
Germina então nas calçadas...um sono de estrelas..um pomar de corações em delírio
Longe de mim tremeluzem os nomes das coisas que invento..
Ninguém sabe que ali estou
Sou o lusco-fusco do lume que afaga as paredes..a sombra subalimentada do vazio
Ludibrio os dias com a insónia de quem sabe o nome de quem passa
Reconheço nas cores da cal..os corações angustiados e a docilidade das trevas
Sei de onde sopram os ventos....abrigo em mim todos os que querem sonhar
Abrigo em mim todos os vazios da cidade..e as cicatrizes das línguas
Anoiteço e a penumbra senta-se comigo nos degraus ensonados da noite
De súbito esqueço-me de tudo..elevo-me até aos confins dos desolados
Relembro os cantares das cigarras...passos ecoam na minha pele...
Sou apenas ar...