Insólito
Insólito o vento arrasta-se nas ruas
E os sons são como censuras ritmadas
E as pessoas
São apenas silêncios indiferentes à natureza tímida
É o desencanto
É a indiferença perante o sinistro jogo
De um teatro censurado
Esquecido Dionísio...
Esquecida a fertilidade da orgia lírica do ditirambo
Um sono acomodado
Honra muitas carapaças falsas
Porque a lisonja aquece os pés
Sob os sinos das igrejas
Que clamam pelos fiéis
Atraindo-os para um Inferno fugidio
Que bebe luz e homens
Que chora sobre corpos transparentes
Que se encantam pela sua timidez de marfim
Ganhamos quando perdemos
O mesmo que perdemos quando ganhamos
Porque tudo é indiferença
No tribunal fantástico das trevas secas
Amamos aquele que bebe o fogo
Amamos aquela que se deita
Naturalmente nua sobre a noite verde
Amamos a profundidade imensa
De um buraco aberto sobre um jardim de violetas
Ai embriaguês de cidades ferozes e malignas
Ai atmosferas estranhas e veladas
Cheias de um amor incontido
Ai o poder imenso dos suspiros
E das tragédias voluptuosas da poesia
Bebamos o ar da noite
Como adoradores de trevas acetinadas
Sejamos muros de pedras...adoradores do verão
Deliremos com as linhas de uma face
Erguida e bela num pedestal sonâmbulo
Que se perdeu nas noites do ópio
E no delírio furioso do amor
Mas nunca a nossa alma
Seja uma servidora amarfanhada e cobarde
Escondida num buraco onde as trevas
Se escondem em prelúdios imensos
De almas sem gente dentro.