Lage fria
Enquanto te mostram a castidade
Exposta numa deslumbrante travessa de prata
Os sinos tocam como crianças que cavam sepulturas
Numa extensão de tempo sem estilo nem piedade...
O dia ainda não saiu das cavernas
E já te aflora a vertigem das coisas tristes
Deslumbras-te com esses dias
Em que não sabes quem és
Desagregado como uma flor
Que não sabe de onde vem
Porque o presente é uma poesia tóxica
Insolúvel enjoo... fétido barco lacrimoso...
Excêntricas sombras
Te protegem desse caldo infame
Dessa cadência pudica
Desse espaço repugnante e açaimado
Devorador de corpos e de fúnebres desejos
Enquanto uma vaga camisa de cambraia
Ondula no segredo de um leito amado
Como uma trémula iluminação do espírito
Ou um espaço onde não cabe mais nada
Cessam as excêntricas mágoas libertadoras
Os aflitos pensamentos
Caem de joelhos na laje fria
Feita de fortes matizes acastanhados
E uma dolorosa pureza desce dos céus
E disseca-te num extremado arrepio
Como se fosse um compasso de música celestial
Ou uma sonata interpretada no maravilhoso corpo nu
De um vazio omnipresente...